VOLTANDO PRO ACONCHEGO

                Depois do susto sempre vem o alívio. Uma semana entre a vida e a morte, transferido de um hospital a outro, passando por várias UTIs, é sempre algo temeroso e assustador, para quem ainda se acha no direito de viver. Mas quem estabelece esse direito, senão aquele que nos traçou metas e destino, planos e obrigações, deveres a cumprir? “Não se perturbe nem se intimide o vosso coração” (Jo 14, 27) – era esse o diagnóstico que contrariava a tecnologia dos gráficos radiológicos e me devolvia a esperança de voltar pros braços dos meus entes queridos. Então voltei.

                Mais uma vez renovado nos propósitos de continuar nessa missão, eis que a fragilidade e fugacidade dessa vida ganha nova dimensão. Não me importa o tempo que me resta, mas o quanto ainda me é possível realizar em vida. Não há limites para aqueles que se deixam guiar pelas palavras e promessas que hoje ecoam em nossos corações conturbados, feridos pela nossa prepotência e limitações físicas, com insuficiências que as lesões do tempo possam lhes ocasionar. “Não se perturbe o vosso coração”. Eis o segredo da saúde que nos falta. Saúde do corpo e da alma, que supera tudo, que esquece as próprias limitações, acreditando apenas nas promessas de um amor ilimitado: “Quem me ama guardará a minha Palavra e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada”.

                De quando em vez é bom confrontarmos nossas próprias limitações. Nenhum poder, status, posição privilegiada ou condição econômica nos diferencia quando o assunto é ameaça de morte. Dessa ninguém escapará, dia mais, dia menos. A pendenga maior é ignorarmos essa realidade e acharmos que esta só virá quando nos cansarmos dos prazeres, das volúpias, dos confortos e benesses que aqui pensamos possuir. Pura e ingênua falácia daqueles que ainda não compreenderam o sentido da própria existência. Nosso corpo quer conforto, prazeres, mas nossa alma anseia apenas pela Paz, plenitude do espírito. Aqui ficarão os sentidos que nos prendem à vida terrena, mas além desta encontraremos a plenitude da Paz, aquela da qual nos fala Jesus: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo” (Jo 14, 27). Isso nos basta e nos dá forças para encarar os desafios de nossas limitações físicas. Essa é a saúde que interessa ao cristão. O resto é resto…

                Seria ingrato se não me referisse aqui às inúmeras manifestações de carinho e solidariedade recebidas nesta semana. Provas de que a fraternidade e unidade cristã ainda são forças propulsoras do bem que nos une. Citar nomes é desnecessário. Mas citar a atualidade da Palavra, sim, pois esta é o mais precioso lenitivo nas nossas tribulações. Tudo o que o Filho diz vem do Pai e o Defensor, o Paráclito, o Consolador, nosso Conselheiro, Advogado e Mestre continua sua ação entre nós “na alegria e na dor”, na vida e na morte. Não tem porque desvalorizar o aconchego desse nosso lar terreno, mas também não podemos ignorar as alegrias perenes da casa do Pai. “Ouvistes que eu vos disse: ‘Vou, mas voltarei a vós’. Se me amásseis, ficaríeis alegres porque vou para o Pai, pois o Pai é maior do que eu.” (Jo 14,28). Se realmente acreditamos nisso tudo, valorizamos o mistério da nossa Fé, em especial aqueles que saltam aos olhos dos ensinamentos da Páscoa do Senhor, pois é através da cruz (paixão e morte), que o Espírito Consolador nos dá forças para vencer essas pequenas adversidades da vida terrena. Assim, mais uma vez, estou de volta.

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