Uma certeza pessoal

    Nenhuma pessoa de fé poderá prová-la concretamente a outra pessoa. Nem mesmo os grandes santos foram capazes de registrar esse feito. Até Jesus, que tentado pelo demônio a demonstrar sua fé transformando pedras em pães, se negou a tão ridícula atitude. Tudo porque a fé é uma experiência estritamente pessoal, não se prova, não se ostenta, não se exibe… Simplesmente se vive, se atesta com a vida.

    Convidados que foram a provar sua fé, miríades de mártires cristãos tombaram e ainda tombam, sulcando a terra com seu sangue, dando a vida como única prova possível e passível de refutação. Quem acredita, dá a vida. “Quem crê em mim, ainda que esteja morto, viverá!” – prometeu Jesus. Tal certeza é o segredo maior da fé cristã, cujos ensinamentos só ganham significado quando encarnado numa experiência pessoal, você e Deus, corpo a corpo, cara a cara. Mesmo assim, Deus respeita a pessoa e sua liberdade de ação, de escolha, pois nunca agirá sem um consentimento pessoal. Além de descoberta muito particular, a fé é dádiva, prêmio ao alcance de todos. Basta desejá-la ou formular um propósito sempre salutar: “Eu creio, Senhor, mas aumentai a minha fé!”. Além do desejo, exige prática, exercício. Pede-nos esvaziamento das certezas pessoais e tolerância com as incertezas. Seria um tiro no escuro?

    Ora, só quem vive ou experimenta um afago de amor, mesmo sem conseguir descrevê-lo com palavras, pode transmiti-lo num olhar, num sorriso, num gesto correspondente. Quem ama, irradia. Se, pois, a descoberta do amor divino dá forças e alegrias, renova esperanças e refaz uma existência, o que se dirá da força interior que emana dos “transformados” pelo amor de Deus?  Nada mais apropriadas para descrever essa verdade do que palavras de Paulo aos Hebreus: “A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê” (11,1). Exatamente nessa esperança é que reside a força e a alegria da nossa fé.

    Se, pois, o mundo nos desafia a provar nossa fé dentro dos quadrantes da racionalidade humana, da lógica, do materialismo, do plausível, não reaja. Sorria apenas. Ou, no máximo, sem exibicionismo ou ostentação, mostre ao mundo sua fé com obras. Não aquelas que contam pontos na sua biografia, como presidente de certa associação, secretário de outra, arrecadador de certo grupo filantrópico, membro de determinada congregação, animador de certos movimentos ou sócio-contribuinte de entidade benemérita… Nem sequer aquela situação constrangedora, que lhe obrigou a estender a mão a um necessitado em via pública ou a caridade forçada por circunstâncias ocasionais, ou aquela mão estendida dando um mínimo na esperança dum voto, um reconhecimento público. Nem mesmo sua fidelidade ao dízimo ou generosidade com as ofertas terão valor sem o fundamento de uma fé pura, cristalina. A fé da caridade, da compreensão, da tolerância, do respeito… das obras.

    “Estamos a descoberto aos olhos de Deus e, espero que o estejamos também ante as vossas consciências” (II Cor 5,11). Parece-nos que o desafio da fé cristã exige apenas o pressuposto de uma convicção pessoal. Quem acredita, vive uma experiência de Deus. “Nós aniquilamos todo raciocínio e todo orgulho que se levanta contra o conhecimento de Deus, e cativamos todo pensamento e o reduzimos à obediência a Cristo” (II Cor 10,5). Essa apologia mais que pessoal do apóstolo que demonstrou sua fé com a vida é tudo que necessitamos para justificar nossa fé. Nossa consciência nos prova a ação de Deus e nosso raciocínio nos faz agir conforme seus desejos. Isso nos basta. Pois do resto Deus cuidará.

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