Cuba e as religiões

    Por esta, nem  Fidel Castro, nem Frei Betto, poderiam sequer ter imaginado: ver Cuba como sede do histórico encontro entre o Papa Francisco e o Patriarca  Kirill, da Igreja Ortodoxa Russa.
    Frei Betto se notabilizou com o livro publicado por ele, décadas atrás, quando ainda eram muito tensas as relações entre o governo cubano e a Igreja Católica. 
    Com seu título chamativo – “Fidel e a Religião”, o livro de Frei Betto se tornou um “Best-seller”, e despertou enorme curiosidade. Mas sobretudo foi pavimentando o caminho para o desenho de outra imagem de Fidel Castro, e das surpreendentes coincidências entre as preocupações da revolução cubana  e as motivações da religião.
    A argúcia do entrevistador foi despertando as reações do famoso entrevistado. Mas Frei Betto soube muito bem colocar sua arte de escritor a serviço de uma causa na época muito arriscada: superar os preconceitos contra um personagem de inegável peso histórico, e ao mesmo tempo mostrar as possibilidades de interação positiva entre fé e política, entre Igreja e Estado, entre governo e religiões.
    O surpreendente encontro em Cuba, entre o chefe da Igreja Católica, o Papa Francisco, e o chefe da Igreja Ortodoxa Russa, o Patriarca Kirill, de Moscou, vem consolidar o processo de abertura do regime cubano, e a progressiva aproximação dos outros países,  que vão normalizando suas relações com este país latino americano que carrega uma inegável contribuição política, e conta com um personagem extraordinário, que ainda está vivo, e que desmente pessoalmente as reiteradas versões de que ele iria  permanecer no comando do governo cubano até sua morte.  Ao contrário, ele teve a coragem política de renunciar ao cargo de Comandante, deixando sólidas esperanças de que a sucessão política em Cuba encontre sua maneira adequada de acontecer e de se normalizar.
    Quando João Paulo II realizou a primeira visita de um Papa a Cuba, ele lançou o desafio que parece ter captado bem o alcance da experiência cubana. Propôs que “Cuba se abra ao mundo, e o mundo se abra a Cuba”.  Para sugerir que a experiência cubana ainda precisava ser consolidada, e ao mesmo tempo precisava ser valorizada, num mundo que tem tanta necessidade de superar preconceitos que perturbam a convivência pacífica entre regimes políticos de diferentes visões de vida.
    Em termos de relações entre países, o fato mais significativo foi, sem dúvida, o restabelecimento das relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba, já formalizado oficialmente.
    Agora, para consolidar este novo relacionamento, o Presidente Barak Obama já anunciou que visitará Cuba dentre de poucas semanas.
    Com 50 anos de embargo econômico, tramado pelos Estados Unidos, não é de estranhar que exista agora um longo e penoso caminho de vivência política e de abertura econômica, que exige tempo para ser implementado.
    Mas o fato de Cuba ter sediado o surpreendente e inesperado encontro religioso, entre o Papa e o Patriarca russo, confere a este país um peso simbólico muito importante. Cuba pode se apresentar ao Presidente Obama como o anfitrião privilegiado para hospedar os interlocutores da convivência pacífica entre mundos diferentes, e o diálogo construtivo para a superação de preconceitos históricos.
    Em meio ao horizonte sombrio que tolda as esperanças de uma paz verdadeira, existem sinais positivos, que precisam ser valorizados. Desta vez estes sinais foram protagonizados pela religião. Sob inegável patrocínio da experiência cubana.

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