Benedetta Capelli – Vatican News
“Não há palavras, não há lágrimas”. O Cardeal Konrad Krajewski, o Esmoleiro do Papa enviado pela quarta vez à Ucrânia, coloca nesta expressão o sentido de um dia difícil que deixa o coração pesado pela dor e que só a oração pode aliviar e reanimar. Da cidade de Kharkhiv, onde chegou à noite, ele fala sobre a manhã passada com Dom Pavlo Honcharuk, bispo da diocese de Kharkiv-Zaporizhia, em Izyum, uma localidade “recém abandonada pelos russos” e onde foram encontrados os restos mortais de cerca de 500 pessoas.
“Ali assistimos a uma ‘celebração’ – podemos dizer – onde 50 homens jovens, na maioria policiais, bombeiros, soldados vestidos de macacão branco estavam cavando e retirando das valas, muitas vezes comuns, os corpos dos pobres ucranianos mortos, cerca de 3-4 meses atrás, alguns enterrados ali há pouco tempo”. Fica-se chocado com tanto horror. “Eu sei… há a guerra”, explica o Cardeal Krajewski, “e a guerra não conhece piedade, há também os mortos. Certamente ver tantos em uma só área é algo difícil de contar, de explicar”.
Transportar os corpos em silêncio, em uma participação comovente e tocante. Krajewski pensa e vê nas pessoas chamadas para essa dolorosa tarefa a piedade de cada homem. “Aconteceu uma coisa que me tocou tanto: estes jovens ucranianos estavam tirando os corpos tão delicadamente, tão silenciosamente, em completo silêncio. Parecia uma celebração, ninguém falava, e ali tinha muitas pessoas, policiais, soldados… Pelo menos 200 pessoas. Todos em silêncio, com uma incrível estima pelo mistério da morte. Realmente tinha muita coisa para aprender com esses jovens”.
![Voluntários ucranianos ajudando a retirar os corpos das valas comuns](https://www.vaticannews.va/content/dam/vaticannews/multimedia/2022/09/19/WhatsApp-Image-2022-09-19-at-19.32.51.jpeg/_jcr_content/renditions/cq5dam.thumbnail.cropped.750.422.jpeg)
“Foi um momento tocante ver a maneira como eles carregavam os corpos. Eles pareciam estar fazendo isso por suas próprias famílias, por seus pais, filhos, irmãos. O bispo e eu caminhávamos entre eles, eu rezava o Terço da Misericórdia em continuação, ficamos ali pelo menos três horas. Eu não podia fazer outra coisa”. Foi – salientou o cardeal – “uma celebração da misericórdia”, um gesto totalmente gratuito.
“Isto ficou comigo agora que estou de volta a Karkhiv, estou na capela e penso nestes jovens”. Foi um dia difícil, também marcado por uma visita a uma delegacia de polícia, que foi transformada em uma câmara de tortura.
“Eu sabia que encontraria muitos mortos, mas encontrei homens que mostraram a beleza que às vezes está escondida em nossos corações. Eles mostraram uma beleza humana em um lugar”, continua o Cardeal Krajewski, comovido, “onde só poderia haver vingança. Mas ao invés, não. Recordei-me das palavras da Sagrada Escritura que diz que “o mal deve ser sempre vencido com o bem”. Uma certeza que é bálsamo sobre as feridas desta guerra.
![Voluntários ucranianos ajudando a retirar os corpos das valas comuns](https://www.vaticannews.va/content/dam/vaticannews/multimedia/2022/09/19/WhatsApp-Image-2022-09-19-at-19.32.39.jpeg/_jcr_content/renditions/cq5dam.thumbnail.cropped.750.422.jpeg)
Há dois dias, o cardeal polonês foi baleado, saiu ileso, enquanto entregava ajudas em Zaporizhia junto com dois outros bispos, um católico e um protestante, e acompanhado por um soldado ucraniano. “Pela primeira vez na minha vida”, disse ele ao Vatican News, “eu não sabia para onde correr … porque não basta correr, você tem que saber para onde”. No final tudo correu bem, ninguém ficou ferido e a ajuda foi entregue até o final, também os terços abençoados pelo Papa e aqueles que os recebiam imediatamente os colocavam no pescoço.