AMAR A IGREJA

     + João Bosco Óliver de Faria

    Arcebispo Emérito de Diamantina

     

    Vejo, com profunda tristeza, surgirem, aqui e ali, nas redes sociais, palavras pesadas, injúrias, calúnias, habilmente forjadas, contra a Igreja Católica e contra a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB.

     

    Tais fatos brotam ou de inimigos da Igreja de Jesus Cristo ou de pessoas católicas, menos avisadas, que acolhem, inocentemente, informações deturpadas – fake News – e que se deixam impressionar e se influenciar por aqueles que, profissionalmente, são hábeis na mentira e inimigos da Igreja.

    Quanto aos primeiros, deles não se pode esperar flores ou aplausos. Aliás a Igreja não precisa disso nem pode se interessar por isso. Ela tem uma missão a cumprir, recebida do  próprio Jesus. Aquelas pessoas fazem o que sabem fazer.

    Quanto aos católicos, que participam assiduamente dos sacramentos e da vida da Igreja, e que conservam,  no coração, o amor à Igreja que aprenderam de seus pais, esses, penso, sofrem na sua carne tais ofensas, calúnias e ficam a se questionar quanto à verdade das mesmas.

    Há ainda os católicos que, sem culpa e por circunstâncias diversas, não tiveram a oportunidade de conhecer melhor a Palavra de Deus na Bíblia, nem de conhecer a Igreja, seus ensinamentos e participar com frequência de suas celebrações. Esses se deixam levar mais facilmente por tais notícias e até se permitem agredir a Igreja que os acolheu e pela qual nunca fizeram o menor sacrifício, nem com Ela se comprometeram. O bom filho não fala mal de sua Mãe, mesmo quando imagina estar ela equivocada.

    Há, ainda, felizmente, os católicos que amam, de fato, a Igreja e que percebem possíveis falhas em alguns de seus dirigentes. Assim como os sinais do semáforo não perdem seu valor pelos defeitos do poste que os sustenta, também o sacerdote não perde o dom de ser portador da graça de Deus por causa de suas fraquezas.

    A natureza humana do sacerdote pode estar prejudicada naquilo que ele deveria ser como sacerdote de Jesus Cristo, mas o sacerdócio de Jesus Cristo, que está presente nele, continua exercendo a sua força de santificação.

    Quando isso vem a acontecer, o caminho para o cristão seria o de procurar o seu sacerdote e, com humildade, caridade e serenidade, apresentar-lhe o que não está correto, mostrando-lhe uma sugestão de melhoria. Se, por acaso, ele não o escutar, deve procurar outro sacerdote que possa ajudar aquele irmão Padre em suas dificuldades. Se necessário, depois, deve, então, procurar um contato com seu Bispo Diocesano, que sempre deve estar pronto a ajudar o seu sacerdote. É o que Jesus nos ensina em Mateus 18, 15 a respeito da correção fraterna.

    Dirijo minhas palavras a todos os bons filhos de Deus. Quero ajudá-los, tranquilizá-los e conservá-los no amor afetuoso à única Igreja de Jesus Cristo, a Igreja Católica.

     

    Georges Bernanos, em sua obra premiada pela Academia Francesa de Letras – “Diário de um Pároco de Aldeia” –, referindo-se aos padres diocesanos, coloca nos lábios do Pároco de Torcy estas palavras: “[…] multidão venerável de sacerdotes zelosos, irrepreensíveis, que consagram suas forças às esmagadoras tarefas do ministério”[1].  Disse-me o Cardeal Dario Castrillon, então Prefeito da Congregação para o Clero: “Os padres são o grande e maravilhoso exército que carrega a Igreja nas costas!” Cada sacerdote  age segundo seus dons e segundo a missão que recebeu.

    Não faltam, sem dúvida, em nossas paróquias, leigos comprometidos e empenhados e que dão, com generosidade, sacrifício e perseverança, o melhor de si para a catequese, para as pastorais e para os diversos ministérios que sustentam a vida paroquial. Sob a orientação de seu Bispo e em união com ele, o Padre é, contudo, o coração, a cabeça e a alma da Paróquia! Ele se santifica e santifica seu povo. Ele anima os fracos, consola e alivia os que sofrem, alegra os tristes, incentiva os lentos, equilibra os apressados, orienta os duvidosos e inseguros, anunciando a todos Jesus Cristo, Caminho, Verdade e Vida (Jo 14,6).

    O que sustenta o coração de um sacerdote, o que dá o brilho de alegria a seus olhos no exercício do seu ministério é seu amor a Cristo e à Igreja. O sacerdote não corre, nem pode correr atrás de aplausos.

     

    Amar a Igreja

     

    Perguntei, certa vez, a uma pessoa: “o que significa amar a Igreja?”

    Ela me respondeu:

    Amo a Igreja porque, na Igreja, recebo o Batismo, que é a fonte de minha vida espiritual. Tenho, também, na Igreja, os demais sacramentos que são alimento dessa vida: na Igreja, encontro o perdão de meus pecados; a grande força da Eucaristia que me sustenta nas dificuldades e desafios da vida; pelo sacramento da Crisma, recebo da Igreja os dons do Divino Espírito Santo; pela Igreja, o meu amor matrimonial, que é humano, é transformado, é vivificado e fortalecido pelo Amor Divino; e, pelo sacramento da Unção dos Enfermos, encontro a força espiritual e o remédio na doença.

    Amo também a Igreja, porque, na catequese, na pregação dos sacerdotes, nos ensinamentos dos Bispos e dos Papas, tenho a segurança de estar recebendo com autenticidade os ensinamentos de Jesus.

    Amo ainda a Igreja pelo manancial de temas de espiritualidade e de doutrina, acumulados na sua história, desde os primeiros séculos do cristianismo, quer nos livros dos Santos Padres, quer nos escritos de tantos santos que nos ajudam no aperfeiçoamento de nossa vida cristã.

    A Igreja oferece, também, o testemunho desses santos, que viveram as dificuldades de sua época e que foram fiéis aos ensinamentos de Jesus. Eles são como um espelho em que encontro as forças para dar, hoje, o meu testemunho de vida cristã.

     

    Eu fiquei pensando: a resposta é bonita, mas isso não é AMAR A IGREJA!

    Tudo o que a pessoa respondeu é verdade, mas devo fazer aqui uma consideração importante: essa pessoa não ama a Igreja, ela gosta da Igreja; ela busca a Igreja para levar suas vantagens – vantagens boas e, até santas, mas vantagens!…

    Gostar é possuir, é querer ter as coisas em proveito próprio. “Gostar” é uma palavra que, corretamente, só pode ser aplicada às coisas, às plantas, aos animais. As crianças gostam do sorvete, do picolé, do chocolate. E, porque gostam, os destroem em benefício próprio. Os adultos gostam do churrasco, da cerveja, do vinho e, porque gostam, os destroem.

    Posso, também, gostar de uma roupa que me dá conforto, de um carro ou de uma casa. Posso, ainda, gostar de uma cidade enquanto desfruto em meu benefício o que ela pode oferecer para a minha realização pessoal, para o meu conforto, para o meu deleite ou prazer, ou para o bem de minha família.

    Assim, também, poderia até gostar da Igreja ou da Paróquia, pelos benefícios ou vantagens que delas posso receber. Poderia, também, erroneamente, gostar de uma pessoa pelas vantagens que sua amizade me ofereceria.

    Mas, de fato, não posso gostar de uma pessoa. Ela é filha de Deus e, enquanto tal, não pode ser possuída nem instrumentalizada em favor de outrem. Eu não posso usá-la e, pior ainda, destruí-la em meu proveito. Não posso, também, gostar de uma realidade ou de um ser espiritual-divino, pois não posso colocar tal entidade espiritual-divina a meu serviço ou a serviço de meus interesses e prazeres. A Igreja é uma realidade transcendente, espiritual, divina. A Igreja só pode ser amada por quem se sente seu filho. Outras pessoas, que não são seus filhos (de outras religiões), podem até gostar dela[2].

    Como católico, não posso nem devo dizer que “gosto da Igreja”!

     

    djbosco@terra.com.br

    [1] Diário de um Pároco de Aldeia, Realizações Editora, São Paulo, 2011 pag. 67

    [2] Durante o Regime de Exceção iniciado em 1964, a Igreja Católica foi uma das poucas vozes que se levantaram neste País em defesa dos presos políticos e dos direitos humanos. Nesta época, muitos, que não eram católicos, gostaram da Igreja e de sua atuação destemida.

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