A paixão como palavra de ânimo

    O relato da paixão segundo São Mateus(Mt 27,11-54) é um relato apaixonante que vai do anúncio ao cumprimento. Há nele um ponto central. Exatamente quando está sendo preso, Jesus proclama: “Chegou a hora”. A partir daquele momento, aquilo que antes era anúncio começa a se cumprir pouco a pouco.

    A primeira parte é o relato da Última Ceia, momento em que Jesus, ao abençoar o pão e o vinho, refere-se a si mesmo e a sua própria entrega. Estes são e serão para sempre o sinal da Nova Aliança entre Deus e os homens. Uma nova época está a ponto de começar, mas passará, necessariamente, pela morte de Jesus. Neste contexto, entendemos o anúncio da traição de Judas e as negações de São Pedro. Na solidão do Monte das Oliveiras, compartilhamos o medo diante da morte experimentado por Jesus.

    Na segunda parte, tudo se cumpre como se houvesse um roteiro que os atores vão seguindo de maneira fiel àqulo que está escrito. A traição de Judas será consumada por intermédio de um beijo. A inútil valentia de São Pedro, tentando defender o Mestre com uma espada, confirma-se em suas três negações. Quem foi o maior traidor? O canto do galo será para São Pedro uma recordação de sua própria fraqueza. O julgamento marca de maneira definitiva o enfrentamento de Jesus com as autoridades religiosas de Israel. Essa é a autêntica causa de sua morte. Aquele que passou sua vida publica falando de Deus Pai e realizando o bem é condenado como blasfemo. De alguma maneira, a condenação de Jesus é uma aposta diante de Deus. E aqueles que o condenam o fazem também em nome de Deus.

    A narração termina com a morte de Jesus que, para chegar até ali, foi julgado injustamente e torturado pelos servidores do poder, que se aproveitam da situação para abusar dos indefesos. Sempre o poder teve seu serviço lacaios que fizessem o trabalho sujo. Aqueles que condenam e torturam. Que cravam na cruz ou fuzilam, jamais são os mesmos. Apesar de tudo, Jesus morre acreditando na esperança. As últimas palavras que o evangelista põe em sua boca são o início do salmo 22. Trata-se de um texto em que o autor experimenta a dor, o sofrimento e o abandono de Deus nesse sofrimento, mas, no final, proclama sua esperança na força e na graça de Deus, que salva e dá vida aos que nele acreditam.

    A celebração da Semana Santa foi e é para os humilhados pela vida, pela cruz que está sempre presente nela, “uma palavra de alento”. Deus está conosco e em nosso mundo há sempre lugar para a esperança. Ainda que tenhamos celebrado muitas Semanas Santas, continua nos faltando fazer memória de Jesus de Nazaré para não nos desesperarmos diante de um mundo em que a morte, em todas as suas formas, está presente. Por mais que nos custe vê-lo, o Deus da vida triunfa sobre a morte. Esta é a nossa fé.

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