A Igreja não é uma ONG, recorda Papa Francisco em novo livro-entrevista

O Papa Francisco afirmou que a Igreja não é uma “ONG”, embora em sua missão haja um forte componente social, mas também não é uma “associação espiritual”, porque o Espírito Santo está presente nela.

O Santo Padre fez essas declarações em um livro-entrevista intitulado “Sem Ele não podemos fazer nada”, que inclui uma conversa do Pontífice com o jornalista Gianni Valente, da qual a agência vaticana Fides publicou alguns fragmentos na segunda-feira, 4 de novembro .

Na entrevista, o Papa afirmou que, se a Igreja não se coloca “em saída”, torna-se “uma associação espiritual. Uma multinacional para lançar iniciativas e mensagens de conteúdo ético-religioso. Nada de mal, mas não é a Igreja. Este é um risco de qualquer organização estática dentro da Igreja. Termina-se por domesticar Cristo. Não se dá mais testemunho da ação de Cristo, mas fala-se de uma certa ideia de Cristo”.

“Uma ideia possuída e domesticada por você mesmo. Você organiza as coisas, torna-se um pequeno empresário da vida eclesial, onde tudo acontece segundo o programa pré-estabelecido, isto, é, seguindo apenas as instruções. Mas o encontro com Cristo não se repete mais. Não se repete o encontro que tinha tocado seu coração no início”.

Nesse sentido, destacou que “é Cristo que faz a Igreja sair de si mesma. Na missão de anunciar o Evangelho, você se move porque o Espírito Santo empurra você e o leva. E quando você chega, dá-se conta de que Ele chegou antes e está esperando você. O Espírito do Senhor chegou antes. Ele se adianta, também para preparar o seu caminho e já está em ação”.

O Pontífice também enfatizou na entrevista a centralidade do Espírito Santo na missão da Igreja. “Sem o Espírito, a missão torna-se outra coisa. Torna-se, diria, um projeto de conquista, pretensão de uma conquista feita por nós. Uma conquista religiosa, ou talvez ideológica, talvez feita com boas intenções. Mas é outra coisa”.

Além disso, explicou o significado da frase, citada pelo Papa Bento XVI e repetida várias vezes por Francisco, de que a Igreja cresce por atração. Recordou que essa expressão é do próprio Jesus e que aparece no Evangelho de João, onde diz que, “quando eu for levantado da terra, atrairei todos a mim”. E também: “Ninguém vem a mim se não for atraído pelo Pai que me mandou”.

“A Igreja sempre reconheceu que esta é a forma de todo o lema que aproxima a Jesus e ao Evangelho. Não uma convicção, um raciocínio, uma tomada de consciência. Não uma pressão, ou uma constrição. Trata-se sempre de uma atração”, assegurou o Pontífice.

“Se é Cristo que atrai você, se você se move e faz as coisas é porque é atraído por Cristo, as pessoas então irão se dar conta disso sem esforço. Não há necessidade de demonstrá-lo, e muito menos ostentá-lo. Ao contrário, quem pensa em ser protagonista ou empresário da missão, com todos os seus bons propósitos e as suas declarações de intenção muitas vezes termina por não atrair ninguém”.

Em seguida, o Papa Francisco indicou que “a missão não é um projeto empresarial bem organizado. Nem mesmo um espetáculo organizado para saber quantas pessoas participam graças às nossas propagandas. O Espírito Santo age como quer, quando e onde quer”.

“O cume da liberdade repousa justamente neste deixar-se levar pelo Espírito, renunciando a calcular e controlar tudo”, insistiu.

Na entrevista, o Papa explicou outra expressão à qual recorre com frequência: “A Igreja não cresce por proselitismo”.

“O problema do proselitismo – afirmou o Pontífice – não é apenas o fato que contradiz o caminho ecumênico e o diálogo inter-religioso. Há proselitismo em todos os lugares, há a ideia de fazer com que a Igreja cresça deixando de lado a atração de Cristo e da obra do Espírito”.

Advertiu que “o proselitismo é sempre violento pela sua natureza, mesmo quando é dissimulado ou feito com luvas de pelica. Não suporta a liberdade e a gratuidade com a qual a fé pode se transmitir, pela graça, de pessoa a pessoa. Por isso, o proselitismo não é apenas o do passado, dos tempos do antigo colonialismo, ou das conversões forçadas ou compradas com a promessa de vantagens materiais. Hoje também pode haver proselitismo, nas paróquias, nas comunidades, nos movimentos, nas congregações religiosas”.

Pelo contrário, “o anúncio do Evangelho quer dizer entregar com palavras sóbrias e claras o próprio testemunho de Cristo como fizeram os apóstolos. Mas não é necessário discursos persuasivos. O anúncio do Evangelho pode ser também sussurrado, mas passa sempre pela força arrebatadora do escândalo da cruz”.

Do mesmo modo, afirmou que a característica distintiva dos missionários cristãos é “ser facilitadores e não controladores da fé. Facilitar, tornar fácil, não pôr obstáculos ao desejo de Jesus de abraçar todos, de curar todos, de salvar todos. Não fazer seleções, não criar ‘triagens pastorais’. Não fazer parte dos que se colocam à porta para controlar se todos têm requisitos para entrar”.

Sobre a natureza da missão da Igreja, o Papa lembrou que “a Igreja não é uma ONG, a Igreja é outra coisa. Mas a Igreja é também um hospital de campo, onde se acolhe todos, assim como são, cuidando das feridas de todos. E isso faz parte da sua missão. Tudo depende do amor que move o coração dos que atuam”.

O Papa também respondeu a uma pergunta sobre a inculturação do cristianismo e afirmou que “o cristianismo não dispõe de um único modelo cultural”.

“É verdade que algumas culturas foram estreitamente ligadas à pregação do Evangelho e ao desenvolvimento de um pensamento cristão. Mas nos nossos dias, torna-se ainda mais urgente considerar que a mensagem revelada não se identifica com nenhuma cultura. E no encontro com novas culturas ou com culturas que não acolheram a pregação cristã, não se deve tentar impor uma determinada forma cultural junto com a proposta evangélica”.

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