Segunda Queda da Bastilha

    Desde 1789, 14 de Julho sempre foi lembrado pelos franceses como o dia do poder do povo nas ruas. É a grande celebração do início da Revolução Francesa, o maior evento da democracia da liberdade, igualdade e fraternidade, a grande bandeira que uma revolta popular hasteou sobre o mundo. Recorda a tomada de uma fortaleza medieval, onde os poderes da nobreza e burguesia guardavam armas e munições e mantinham prisioneiros os revoltosos do povo. Quase uma centena de populares deu a vida neste conflito. Tombaram sob a mira de canhões que os poderes de então julgaram por bem acionar contra aquela multidão de rebeldes. O povo conquistou a velha fortaleza. E venceu.
    A partir de 2016, 14 de Julho será lembrada como início de outra revolução, a segunda fortaleza medieval que cai. Desta feita, atropelados pelo fator surpresa, os populares que celebravam aquela gloriosa insurreição contra a tirania, não tombaram em vão. Sua também quase centena de mortos, além de outro tanto de feridos, dá início a uma nova revolução. Agora, a indignação mundial contra a intolerância religiosa já não é uma bandeira de guerra, mas de paz; de busca imediata dessa paz que só um sentimento verdadeiramente religioso pode oferecer ao mundo. Iniciou-se a revolução da liberdade contra a prisão medieval da fé bitolada, da igualdade contra o desumano desnível do torpe radicalismo religioso, da fraternidade contra qualquer princípio de egoísmo cego. Está em curso a maior revolta humana contra a mais torpe das fortalezas, aquela que ainda estoca as munições da ignorância e distorção religiosa.
    Para nós cristãos chegou a hora da verdade. O que se levanta contra nossa fé não é um ato isolado de ameaça à nossa integridade física, mas uma guerra surda, porém previsível, do Mal contra o Bem. Chegou a hora da batalha. O crucial momento de nos municiarmos com os escudos da fé e derrubarmos as fortalezas da intolerância e da incompreensão de muitos. Mais do que nunca, nossa resistência é imprescindível. Mais do que nunca, precisamos buscar as coisas do alto, aquilo que nos fortalece espiritualmente, para vencer as ameaças do fanatismo, do radicalismo. “Pensem nas coisas do alto, e não nas coisas da terra” (Col 3, 2). Vingança e ódio não são armas cristãs. “Façam morrer aquilo que em vocês pertence à terra… Outrora, também vocês eram assim, quando viviam entre eles. Agora, porém, abandonem tudo isso: ira, raiva, maldade, maledicência e palavras obscenas, que saem da boca de vocês” (Col 3, 5…8) Ou seja, não nos igualemos à baixeza do Inimigo, mas recorramos à arma da fé plena, aquela que nos aponta outra realidade, outro mundo. Este, sim, mais afeito à bandeira que defendemos, aquela cujo estandarte exibe uma cruz, um sinal de morte, mas também de vitória, ressurreição.
    A queda da Bastilha deixou de ser uma conquista francesa. Agora é um desafio cristão. Vencer o terrorismo que nos afronta, mais que questão de fé, é também princípio de sobrevivência. Está em jogo um futuro. Ser este de paz ou guerra vai das armas que usarmos, da munição que nos sobra. Como cristãos – primeiros alvos desse conflito – nos sobra o desafio da contradição, ou seja, não revidar. Nem compactuar. “O momento certo ainda não chegou par mim. Para vocês, qualquer momento é bom. O mundo não tem motivo para odiar vocês. Mas o mundo me odeia, porque eu dou testemunho de que suas ações são más” (Jo 7, 6-7). Chegou a hora da verdade. Esse momento ainda há de ser bom, visto a oportunidade de uma segunda Bastilha. Estamos iniciando a Revolução de Cristo.

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