Pe. Lombardi: Os meus 25 anos na Rádio Vaticano

O Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Pe. Federico Lombardi, depois de 25 anos de serviço deixa a Rádio Vaticano. O jesuíta chegou à emissora, em 1990, como diretor dos programas. Em 2005, foi nomeado diretor-geral. Os superiores, em 2001, confiaram-lhe o Centro Televisivo Vaticano (CTV) e, desde 2006, a direção da Sala de Imprensa da Santa Sé, cargo que ainda exerce.

Entrevistado pela nossa emissora, Pe. Lombardi repercorre os seus 25 anos passados na Rádio Vaticano.

Pe. Lombardi: “Quando vim à Rádio Vaticano não conhecia diretamente o mundo vaticano, mas antes de ser provincial dos jesuítas italianos fiquei mais de dez anos na revista Civiltà Cattolica e como para outros jesuítas antes de mim, penso em particular nos diretores Padres Martegani e Tucci, esta foi uma ótima escola preparatória para enfrentar as questões da informação e comunicação em sintonia com o serviço do Papa e da Santa Sé. Além de acompanhar com  continuidade e de perto as atividades do Papa como eu nunca tinha feito, para mim as novidades mais fascinantes foram o horizonte mundial da atividade de informação da Rádio e a grande internacionalidade da comunidade de trabalho, com pessoas de 60 nacionalidades, com culturas, línguas e alfabetos muito diferentes. Além disso, tive de me acostumar a um gênero de expressão diferente: não mais longos artigos muito documentados, mas trechos breves a serem ditos em um ou dois minutos. Uma expressão mais sintética e mais clara possível. Nisto acredito que a minha formação matemática tenha me ajudado um pouco. Nos primeiros 15 anos, de 1991 a 2005, fui diretor dos programas, e o aspecto prevalente foi a atenção aos conteúdos de informação e a grande proximidade à vida das redações e às muitas pessoas que as constituem. Relações humanas muito intensas e profundas, sobretudo com os redatores, mas também com os técnicos com os quais me relacionava frequentemente não obstante eles não dependessem diretamente de mim. Digo que este foi o período mais feliz em que pude me dedicar plenamente à missão da Rádio Vaticano, desde de manhã até à noite, praticamente todos os dias, quase sem interrupção.”

A seguir, o senhor teve também outras tarefas…

Pe. Lombardi: “É verdade. Desde 2001, os superiores por várias circunstâncias me confiaram também o CTV e em 2006, se acrescentou também a Sala de Imprensa da Santa Sé. Mas desde 2005, com a partida de Pe. Borgomeo, fui nomeado Diretor Geral, e esta em relação a antes era uma tarefa mais administrativa, que exigia menos proximidade contínua às pessoas, e num certo sentido também mais compatível às outras tarefas que tinham sido confiadas a mim e que naturalmente exigiam grande parte do meu tempo. Num dia normal, eu me dividia mais ou menos assim: de manhã cedo e à tarde na Rádio Vaticano, na metade da manhã ia à Sala de Imprensa e no final da manhã ao CTV. Tinha muita coisa para fazer, mas nunca pensei em pedir para deixar a Rádio Vaticano. É a missão para a qual os meus superiores religiosos me enviaram para servir o Vaticano. Sempre a considerei primeira e fundamental, e sempre me senti comprometido com a fidelidade ao serviço às pessoas que por primeiro tinham sido confiadas a mim. Naturalmente, procurei realizar com todo compromisso possível também as outras tarefas, muito importantes, mas a minha casa no Vaticano sempre foi a Rádio.”

Nesses anos não faltaram as dificuldades…

Pe. Lombardi: “As dificuldades nunca faltaram. O tempo mais agitado, em relação à Rádio, foi o das discussões e acusações relativas à poluição eletrônica, por causa da atividade do Centro de Transmissão de Santa Maria de Galeria. A questão explodiu no final do Grande Jubileu, em janeiro de 2001, e ficou tensa durante vários meses, até o verão, depois continuou ainda por um longo tempo, mas com intensidade reduzida. Naturalmente, era difícil ser acusados, de maneira certamente injusta, de fazer mal, até mesmo de matar crianças; mas tínhamos a consciência tranquila e acredito que por isso, fomos capazes de viver a provação com responsabilidade, paciência, seriedade moral e competência científica.”

Quais são os fatos que lhe deram mais alegria ou mais desgosto nesses anos?

Pe. Lombardi: “Os que me deram mais alegria foram os testemunhos de ouvintes que viviam situações difíceis e conseguiam nos enviar mensagens de gratidão pelo nosso serviço. Lembro-me de uma enfermeira voluntária leiga na Somália, sozinha num mundo de maioria muçulmana, que nos ouvia regularmente. Recordo-me as 40 mil cartas de gratidão que chegaram da Ucrânia no primeiro ano depois da queda do regime soviético. Os exemplos são muitos. Por outro lado, o maior desgosto que ainda carrego comigo foi o de não conseguir realizar um programa em língua hauça. Era muito pedido pelos bispos do norte da Nigéria, uma região que como sabemos hoje é palco de violência e tensões, onde age Boko Haram. Eu já tinha organizado, praticamente com custo zero, contando com colaborações voluntárias dos religiosos nigerianos em Roma e contribuições realizadas num estúdio de rádio católica na Nigéria. Poderia ter sido ouvido bem e o único custo teria sido o da energia elétrica para a transmissão, não mais de 10 mil euros por ano, menos de 30 euros por dia. Já tínhamos feito a primeira transmissão e foi-me pedido para suspendê-lo, acredito por causa da preocupação de que a rádio não se alargasse. Para os nigerianos foi uma desilusão muito grande. Para mim foi uma decisão errada, contrária à compreensão de uma verdadeira necessidade humana e eclesial à qual se poderia dar uma resposta pequena, mas significativa, de atenção e apoio às populações pobres e que passam provações.”

Não obstante este insucesso, a Rádio Vaticano fez muito nesse sentido em sua história…

Pe. Lombardi: “Sim, este foi um caso típico de serviços que poderiam e podem ainda ser feitos com as ondas curtas e somente com elas. Este é o motivo  pelo qual nós, também eu pessoalmente, defendi insistentemente o uso até hoje e sou imensamente grato aos colegas do Centro de Santa Maria de Galeria que desempenharam sua tarefa com grande competência e dedicação, conservando a operacionalidade de seu Centro, em seu gênero um verdadeiro tesouro, com uma economia rigorosa. Naturalmente, para mim está claro que as tecnologias da comunicação abriram espaços novos muito importantes, e hoje vitais e preponderantes, aos quais é preciso absolutamente reorientar muitos recursos. Mas no DNA da Rádio Vaticano e de sua missão desde as origens e depois em particular no tempo da Igreja oprimida por totalitarismos, sobretudo comunistas, houve sempre o serviço dos cristãos oprimidos, dos pobres, das minorias em dificuldade, mais do que a sujeição absoluta ao imperativo da maximização da audiência. Naturalmente, a medida da audiência deve ter a consideração adequada, mas não é tudo. Espero que isto não seja esquecido no futuro no discernimento sobre os desenvolvimentos da comunicação vaticana. É um grande desafio: como manter realmente os pobres presentes e como combater a cultura do descarte no mundo novo da nova comunicação”.

O senhor concorda que uma reforma da comunicação vaticana era e é necessária, e que isto fará mudar profundamente a Rádio Vaticano na qual o senhor viveu?

Pe. Lombardi: “Certamente, a grande evolução na comunicação se impôs também para os meios de comunicação vaticanos e é por isso que a reforma era necessária e deve ser realizada com coragem, com consciência e apreço pela nova cultura e novas tecnologias que a caracterizam. Por isso, sobretudo nos anos noventa, fizemos na Rádio um grande esforço para entrar no mundo da comunicação digital e da multimídia, não pensamos somente na produção de programas de áudio, mas desenvolvemos um grande site multilinguista e a presença na rede em várias formas, incluindo, enfim, o uso intenso dos meios de comunicação sociais, passando da comunicação unidirecional para a interação. Tanto que quando festejamos o 75° aniversário da RV, em 2006, eu fiz passar o discurso que nós nos chamávamos ainda Rádio Vaticano, mas na realidade não éramos mais uma rádio no sentido estreito do termo, pois nos tornamos um centro importante de produção de informações e aprofundamentos multilinguista e multicultural que difundia o seu serviço com as tecnologias e as formas apropriadas para alcançar o público em várias partes do mundo. Como tinha feito Pio XI com Marconi, usando as tecnologias mais inovadoras do tempo, assim nós fazemos hoje. Na realidade eu amei o nome Rádio Vaticano que expressa uma grande história, mas nos tempos recentes senti este nome como uma armadilha, uma fonte de equívoco, porque deixava pensar que nós fossemos destinados a produzir somente programas de áudio para a difusão radiofônica tradicional e isto reforçava naturalmente as objeções dos críticos, que nos acusavam de gastar muito por uma atividade limitada e tradicional. Isto não era de fato verdade. Basta olhar o nosso site para entender. Em todo caso, acredito que seja hora de ir além do nome Rádio Vaticano para nos libertar do peso deste equívoco. Na reforma em andamento isto acontecerá naturalmente.”

O senhor vê bem a reforma em andamento?
Pe. Lombardi: “A reforma é certamente bem-vinda. Todas as vezes que me diziam que era preciso fazer análises e mudanças na Rádio Vaticano, por exemplo, nas famosas reuniões do ‘Conselho dos 15 cardeais para o estudo da situação econômica’, eu respondia que certamente eram sempre necessárias, mas que isso teria de acontecer no contexto de um exame e uma reforma global dos meios de comunicação vaticanos, porque eles vinham de uma história em que tinham nascido, sucessivamente e separadamente, como meios específicos, enquanto agora entramos no mundo da multimídia e da convergência digital. Portanto, estou perfeitamente de acordo que se proceda e me parece que a abordagem global adotada seja correta. É também justo que tenham a responsabilidade pessoas mais jovens que nós, mais abertas e mais convencidas da possibilidade do novo”.

Fonte: Rádio Vaticano

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