Visita foi gesto concreto da Assembleia do Regional Leste 2
“Ai de mim se não manifestasse essa dor e essa solidariedade a vocês, mesmo não conhecendo a todos, pois na Eucaristia caminhamos juntos e somos todos irmãos e irmãs”, disse o núncio apostólico no Brasil, dom Giovanni D’Aniello, durante missa na Igreja Nossa Senhora do Carmo, na Praça Minas Gerais, em Mariana (MG), na quinta-feira, 9.
A celebração eucarística precedeu visita ao Distrito de Bento Rodrigues, local onde ocorreu o maior desastre ambiental do Brasil.
Ao expressar a solidariedade do papa para com as vítimas do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015 e que deixou 19 mortos, o núncio afirmou que “a Igreja deve estar sempre perto de toda gente e principalmente dos que sofrem”.
Após a missa, o núncio seguiu para o Distrito de Bento Rodrigues, acompanhado dos moradores da região e dos bispos, padres e leigos que participavam da Assembleia do Regional Leste 2 da CNBB. Na ocasião, os bispos ouviram relatos de moradores da região.
“A gente sente alívio, por um lado, porque salvamos muita gente. Agora estou eu aqui mostrando tudo para as pessoas, onde a gente morava, vivia há muito tempo. A gente tinha casa, morava aqui (apontando para o que sobrou de sua casa) e de repente não tinha mais nada. Eu já chorei muito quando vinha aqui. Agora eu parei de chorar um bocado. Mas sinto muita tristeza em ver como tudo ficou. Dá tristeza saber como era e ver como tudo está. Eu tinha toda a história de Bento registrada e guardada na minha casa. O livro de atas das reuniões da Igreja de São Bento ficava comigo. Eu tinha medo que ele sumisse e guardava com carinho. Agora ele deve estar aí, no meio da lama”, contou aos bispos o senhor Filomeno da Silva, de 82 anos, que morava no local.
Prejuízos irreparáveis
O arcebispo de Mariana, dom Geraldo Lyrio Rocha, em entrevista à imprensa, expressou preocupação com os rumos dados pelo poder público e as empresas às decisões a respeito do rompimento da barragem. “A Casa Comum foi fortemente atingida. A Casa Comum foi danificada com a tragédia de proporções incalculáveis e como eu tenho dito, de prejuízos irreparáveis. Há coisas e vidas que não voltarão nunca mais. Neste contexto todo, o que nos causa muita perplexidade é a realização de acordo entre o governo federal, os estados do Espírito Santo e Minas Gerais e as empresas envolvidas na tragédia. Como se faz um acordo sem que os interessados sejam ouvidos. Os atingidos não tiveram parte alguma no estabelecimento dos termos deste acordo. Fizeram um acordo a respeito deles sem que eles fossem interrogados a respeito do que é do bem comum e do interesse de todos”, ressaltou dom Geraldo.
Para o arcebispo, o processo de negociação entre empresa e moradores de Bento Rodrigues e demais localidades conta com pouca participação dos atingidos. “A composição da direção e dos órgãos componentes da fundação criada por este acordo tem uma participação insignificante por parte dos atingidos. Uma participação em um conselho que não tem poder algum. Poderão ser atendidos ou não, dependendo não dos interesses deles, mas dos interesses dos que causaram o prejuízo. Isso é incompreensível. Confesso que me sinto extremamente perplexo de como é que se dá um encaminhamento desta natureza”, explicou indignado, o arcebispo de Mariana.
Justiça
Dom Wladimir Lopes Dias, bispo de Colatina (ESP), região também atingida pela lama gerada pela Barragem, lembrou das vidas humanas perdidas com a tragédia. “Aqui a gente sente uma comoção muito forte. A gente acredita na ressurreição, mas foram vidas e famílias que foram destruídas”, expressou.
Ao recordar a Encíclica do papa Francisco, Laudato Si’, que trata do cuidado com a Casa Comum, dom Wladimir referiu-se à situação como descuido com o planeta e com a pessoa humana. “O homem que é o centro da criação, depois o trabalho e só depois o capital. Mas aqui nós vemos justamente o contrário. O que vale é o capital, sem se preocupar com o homem, com a natureza e com a vida das pessoas. Tudo isso poderia ter sido evitado. Esperamos que haja justiça e que a empresa recupere o que foi destruído e indenize as pessoas com o valor justo e dê todo o acompanhamento”, destacou.
A região de Colatina foi afetada pelos rejeitos onze dias após o rompimento da Barragem do Fundão, em Bento Rodrigues, causando prejuízo para a população ribeirinha e o meio ambiente.
Gesto Concreto
A visita foi parte da programação da Assembleia do Regional Leste 2 da CNBB, que compreende os estados Minas Gerais e Espírito Santo. O evento ocorreu entre os dias 6 e 9 de junho, em Cachoeiro do Campo, distrito de Ouro Preto (MG), e abordou como tema os efeitos da mineração no Brasil.
Conforme explica o presidente do regional, a ida a Bento Rodrigues foi um gesto concreto feito pelos bispos e coordenadores de pastoral das dioceses que participaram da Assembleia.
“A Igreja tem um papel importante que é o de conscientizar as pessoas sobre o que está acontecendo e se isso condiz com a palavra de Deus. Então, aqueles que têm poder na mão, no caso de uma empresa importante como esta (Samarco), têm que estar ao lado do povo e não pensar só em um pequeno grupo. Como disse dom Geraldo (arcebispo de Mariana) é preciso que estas pessoas tenham a capacidade de pensar no humano, pois estas empresas trazem grande progresso, mas são capazes de trazer grande destruição como foi aqui em Mariana”, disse.
Com informações e fotos da arquidiocese de Mariana e regional Leste 2 da CNBB
Fonte: CNBB