Domingo da Divina Misericórdia – Cartas do Padre Jesus Priante

Com este título, o Papa João Paulo II consagrou este Domingo completando o sentido salvífico da Páscoa. A ressurreição não é só a vitória ou libertação da morte, mas também do pecado. No cemitério deixaremos nossos restos mortais e os vírus (veneno) de nossos pecados. Se tivéssemos de sair deste mundo, carregando o peso de nossas culpas, melhor seria ficarmos para sempre no cemitério, pois a vida eterna seria um verdadeiro inferno, como nos revela o relato de Caim após ter matado seu irmão Abel. Andou errante sem descanso desejando ser engolido pela terra.

Todos nós temos assimilado o conceito da ressurreição como vitória contra nosso ” último inimigo a ser vencido, que é a morte” (1Cor, 15,26). Dificilmente atribuímos, com o mesmo realismo, à ressurreição a vitória ou libertação de nossos pecados. A celebração deste Domingo visa fazer-nos conscientes de que em Cristo, morto e ressuscitado, fomos inteiramente salvos, do pecado e da morte; fato que só podemos entender à luz do Mistério da Encarnação: o próprio Deus se incorporou à nossa condição humana para sermos divinizados.

O Natal dispensaria a Páscoa, mas sem este acontecimento não conheceríamos humanamente que em Jesus de Nazaré fomos unidos a Deus na nossa condição de mortais e pecadores. Em Cristo, não mais nascemos homens, mas filhos de Deus à maneira humana por toda eternidade. A salvação não é propriamente uma graça ou dom externo de Deus, como quando se dá uma esmola para socorrer um necessitado. Na pessoa de Cristo, mais do que por Ele, recebemos a vida de Deus. Ele não é mediador senão meio divino de nossa salvação. Sua Páscoa, passagem à vida eterna e feliz, é nossa páscoa. Frente a este grande mistério de nossa salvação, a última palavra de nossas palavras é o silêncio, e a primeira palavra do nosso silêncio se faz adoração.

A RESSURREIÇÃO NOS FAZ SANTOS EM CRISTO

“Sereis santos porque eu sou santo” (Num.11,14) Jesus alude a esta profecia no Sermão da Montanha: “Sejam santos como Deus é Santo” (Mt.5,48). Se essas palavras tivessem um sentido moral, além de serem impossíveis de cumprir, negariam a verdade da fé que proclamamos no belo hino do Glória: “Só Tu és Santo, só Tu, Senhor”. Saímos do Deus, santo e bom, mordidos pela nada do pecado e da morte para “Ele ter misericórdia conosco”(Rm.11, 32).”

O Pecado Original

Nenhum mortal está na graça de Deus pelo cumprimento da Lei” (Rm.3,20)”. Se alguém disser estar sem pecado, é um mentiroso” (1Jo, 1,8). O pecado é nosso existencial ou maneira de existir na condição de criaturas, separadas temporalmente de Deus. Nisto consiste o que chamamos “pecado original”, no qual nascemos e vivemos até o dia de nossa ressurreição, e do qual derivam todos os pecados e males do mundo.

O pecado original não foi um acidente ou ato histórico de Adão e Eva. Ele é constitutivo de nosso ser criatural. Não há uma leitura arqueológica, que nos reporte a Adão e Eva. A teoria da Evolução, mais do que mera hipótese, desmente essa leitura. O ser humano nunca esteve num idílico Paraíso, livre do pecado e da morte. Estes são o limite da nossa natureza humana e cósmica que postula e exige a escatológica genética da ressurreição de Cristo. “Nele não temos mais o pecado” (1Jo. 3,5). Em Cristo a historicidade do homem não se esgota nos seus atos de pecado e de morte, próprios da nossa condição de criaturas até nossa comunhão gloriosa com Deus.

Já fomos salvos, mas ainda persiste a tendência pecaminosa de nos separarmos de Deus, que se faz manifesta na pluralidade ingente dos pecados do mundo. Também deles seremos libertados, pois “nada nos pode separar do amor misericordioso de Deus que temos em Cristo”(Rm.8).

No céu, diz São Jerônimo, não podemos pecar mesmo querendo, mas neste mundo não podemos não pecar, porque o “pecado habita em nós”.

A salvação que temos já em Cristo, não pode ser entendida sem distinguir o “pecado original” ou de natureza, nossa condição existencial, dos pecados no sentido moral. Estes seriam como os furúnculos do sangue envenenado de nosso “corpo de pecado”, como chama São Paulo ao pecado original. Deste “pecado” radical é que já fomos salvos em Cristo, ainda que continuemos a pecar. Por isso, podemos afirmar:
O pecado não tem futuro. Da mesma maneira que continuaremos a sofrer doenças, carências e todo tipo de males, derivados da nossa condição mortal, também seremos pecadores até sermos transformados pela ressurreição em Cristo. Oscar Cullmann expressava esta aparente contradição do mistério da nossa salvação que já temos em Cristo, dizendo: “Já, mas ainda não”. Enquanto estamos no tempo, vivemos, na condição de criaturas, no pecadoras e mortais, mas santos e imortais no Corpo de Cristo ressuscitado. Ainda que quisermos ser demônios ou autodestruir-nos não mais poderíamos, pois já fomos salvos e pertencemos a Deus.

A VERDADE DA SALVAÇÃO É HISTORICIZADA

À medida em que vamos incorporando em nós a ressurreição de Cristo, entendemos melhor nossa existência e a do mundo que habitamos. Experimentamos a vida de maneira perturbadora, criando dentro de nós um dualismo existencial de otimismo e pessimismo, de vida e de morte. Este dilema encontra resposta só em Cristo, sentido
último de nossa liberdade sequiosa de uma vida feliz.

Sartre, idólatra da sua própria liberdade, chegou à conclusão de que só podemos ser livres se formos capazes de criar-nos a nós mesmos. Aspiração impossível de realizar. Por isso, dizia ele, resta nos refugiarmos na angústia, no crônico desespero do pecado e na tumba da morte. E quem não viver assim, acrescenta Sartre, “está de má fé”. Não é autêntico ou ele mesmo.

Cristo continua a desafiar toda prepotência humana dizendo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo. 14). “Sem mim nada podeis fazer”. (Jo.15) “Se eu vos libertar, verdadeiramente livres serão” (Jo.8,36). Precisamos historicizar a
ressurreição salvífica de Cristo, isto é, torná-la presente em todos os acontecimentos, nas alegrias e tristezas da vida presente. São Paulo o expresava dizendo: “Revesti-vos de Cristo” (Rm.13,14) da sua morte e da sua ressurreição. Só podemos ser plenamente humanos de maneira mística, em comunhão com o eterno e divino. Teilhard de Chardin, o homem mais enamorado da criação, tinha esse sentimento: “O sol acaba de iluminar ao longe na região extrema do oriente. Uma vez mais, sob as movediças cataratas dos seus raios, desperta-se viva a terra. Levarei a tua presença, meu Deus, minha alma aberta para ti em todo instante. O pão do meu trabalho e esforço caduca. O vinho das minhas alegrias e tristezas dissolve-se no meu nada. Na imensidão desta massa infinita do universo, sinto um desejo irresistível que me faz gritar: “Eu sou e vivo em Ti”. Seu entusiasmo místico o levou a ver “santa” a própria matéria.

Se as moléculas de nosso corpo são parte do cosmos, também este participará da nossa glorificação em Cristo. (Rm.8)

“PELAS MÃOS DOS APÓSTOLOS FAZIAM-SE INÚMEROS MILAGRES… DAS CIDADES VIZINHAS DE JERUSALÉM, TRAZIAM DOENTES E ATORMENTADOS DE ESPÍRITOS IMPUROS E TODOS ERAM CURADOS. ” (At.5,12- 16)

A misericórdia é expressada na Biblia com dois termos hebraicos: “Rahamim”que faz relação às entranhas maternas a gerar a vida, atributo exclusivo de Deus; e “Hésed”, afim ao sentimento de compaixão e piedade, constitutivo do ser humano. Jesus mostrou sua misericórdia em ambos sentidos. Como homem teve compaixão dos que sofriam curando numerosos doentes. Como Deus criava uma nova vida perdoando os pecados. Perdão em latim significa dar de novo a vida, poder exclusivo de Deus ( Mc.2). Na sua ressurreição, se faz presente a misericórdia divina, ao mesmo tempo, materna e compassiva. Somos curados dos males que nos levam fatalmente à morte, e dos pecados que nos separam de Deus. Enquanto vivemos a Páscoa, no tempo, de maneira historizada, Jesus continuará sendo compassivo e misericordioso, embora só os que creem nele, o percebam, inclusive, como os apóstolos, a tornam presente através das suas mãos humanas.

Em cada gesto de amor compassivo que nós temos para quem sofre, Cristo se faz presente, assim como em nosso desejo de perdoar, sacramentalizamos sua divina misericórdia, que nos faz filhos de Deus. A doença e a dor são um obstáculo da vida e nos fazem ser menos. Afetam nosso corpo e mente. Rompem nossa relação com nós mesmos, com os outros e com Deus. Mas também tem um efeito salvífico, na medida em que nos fazem esperar a cura plena da ressurreição. O mesmo efeito salvífico podemos ver em nossos pecados. São Francisco de Salles (séc. XVII) os comparava ao adubo nas plantas que lhes dá mais vida. Se na doença e na dor resta-nos esperar por Deus, no pecado, nosso abismo existencial, não podemos subsistir a não ser clamando pela sua misericórdia (Sl 130).

Este horizonte de salvação que temos em Cristo, se torna mais fácil de trilhar se experimentamos a compaixão e a misericórdia de Deus “pelas mãos dos apóstolos”, dos que sentem sua vida vinda de Deus em missão e tornam presente sua misericórdia compassiva e divina. Nenhum humanismo ou filantropia pode nos brindar a vida na terra, menos ainda a vida eterna. A compaixão e a misericórdia de Deus atua reflexamente em nós como a lua recebe a luz do sol iluminando a noite. Pertence a todos nós não só receber a misericórdia de Deus como também fazê-la visível através de nossos gestos de amor misericordioso, “para que vendo vossas obras, glorifiquem a Deus” (Mt.5,16).

A Cura pela Misericórdia

Que diferente e sublime seria a cura através de um médico se ele percebesse em suas mãos a compaixão e a misericórdia de Deus. Pelas nossas mãos, Cristo prolonga Sua compaixão e a Sua misericórdia até sermos salvos plenamente com sua ressurreição, milagre dos milagres. A grande revelação do Concílio Vaticano II a respeito da nossa identidade eclesial foi: “A Igreja não substitui a Cristo…” “Ela é sinal e instrumento de salvação” em favor do mundo.

Cristo opera Sua salvação em nós, os que cremos, em favor de todos. “Cristo conta contigo para amar”.

O Evangelho do Ressucitado

“EU, JOÃO, ENCONTRAVA-ME NA ILHA DE PATMOS (TURQUIA) NO DIA DO SENHOR (DOMINGO) E OUVI UMA VOZ FORTE ORDENANDO-ME:”ESCREVE O QUE VÊS”. VI NO MEIO DE SETE CANDELABROS UM FILHO DO HOMEM, VESTIDO COM TÚNICA LONGA, CINGIDA COM UM CINTO DE OURO. PONDO SUA MÃO SOBRE MIM, DISSE: “NÃO TEMAS!” EU SOU O PRIMEIRO E O ÚLTIMO, O VIVENTE, E TENHO AS CHAVES DA MORTE E DO HADES.” (Ap.1,9-19)

O livro do Apocalipse que Cristo ordenou escrever a João, é chamado Evangelho de Jesus ressuscitado. Por isso, só pode ser expressado através de imagens ou símbolos estranhos ao nosso pensar humano, pois referem-se a uma realidade meta-histórica, impossível de ser representada com nossas categorias mentais. No entanto, como indica seu título, é uma grande revelação da história da salvação a ser concluída no fim dos tempos, fruto do amor misericordioso de Deus.

O texto revela-nos vários aspectos da nossa Fé, pela qual vemos o invisível e possuímos o que esperamos (Hb.,11,1):
O DOMINGO é o Dia do Senhor, no qual se faz presente a ressurreição de Cristo através da Eucaristia, historicizando assim a Páscoa. Por isso São João vê Jesus, “Filho de Homem”, vestido sacerdotalmente com longa túnica e também com cinto de ouro, símbolo da sua realeza, dizendo a todos: “não temam!” Eu sou o PRIMEIRO E O ÚLTIMO, o ” vivente”, que tem as chaves da morte e do Hades.

Em Cristo ressuscitado culmina a História. Nele os tempos rompem a fronteira da eternidade, a prisão da morte abre-se para a Vida e o Inferno (Hades) de nossos pecados é fechado para sempre.

No Domingo Cristo nos salva do mítico deus devorador do tempo (Cronos). Dele, Jesus diz com toda verdade o que disse a respeito do Sábado: “O Domingo é para o Homem” e não o
homem para o Domingo, como o temos feito, incluindo-o no mundano “fim de semana”. Não é mais Dia do Senhor, vencedor do pecado e da morte, mas do futebol, do churrasco ou de qualquer outra coisa.

Assim como São Paulo nos diz que temos de viver de Páscoa em Páscoa, também temos de dizer: vivemos de Domingo em Domingo, “o primeiro dia da semana” no qual tudo começa, sem a velhice do pecado e da morte. “Este é o dia que o Senhor fez. Seja nossa alegria e nossos gozo”,repetimos no Tempo Pascal. Interessante que, mesmo contra a mentalidade secular que nos configura atualmente, ainda, nos nossos calendários, destacamos o domingo com outra cor e estampamos sua leitura numérica ordinal à esquerda, como primeiro dia da semana. Até nesse detalhe, Deus nos mostra Sua salvação em Cristo ressuscitado. Também, o Domingo é chamado de “oitavo dia”, esse dia que não existe no tempo semanal, porque a ressurreição que, celebramos no domingo, nos introduz na eternidade. O detalhe de Jesus aparecer nesta visão apocalíptica de João na ilha de Patmos no dia de Domingo no meio de sete candelabros nos revela o acontecimento Pascal da Eucaristia, por isso, é celebrada pondo sobre a mesa do altar dois ou mais candelabros.

Os símbolos são a linguagem da alma a nos revelar o invisível e eterno. Dois detalhes aparentemente corriqueiros: o primeiro dia da semana nos nossos calendários ou as velas sobre o altar nas nossas Eucaristias, são verdadeiros sacramentos (sinais) da nossa salvação que só podem ver com os olhos os que acreditam.

A TARDE DE DOMINGO, ESTANDO FECHADAS AS PORTAS, JESUS ENTROU NO LUGAR ONDE ESTAVAM SEUS DISCÍPULOS REUNIDOS E LHES DISSE: “A PAZ ESTEJA CONVOSCO! COMO O PAI ME ENVIOU, TAMBÉM EU VOS ENVIO. E SOPRANDO SOBRE SUAS CABEÇAS LHES DISSE: “RECEBEI O ESPÍRITO SANTO. AQUELES A QUEM PERDOARDES, OS PECADOS SER-LHES-ÃO PERDOADOS.” (Jo. 20, 19-31)

Novamente, os textos deste dia remetem-nos ao sacramento do Domingo, dia em que Jesus venceu a morte e
são perdoados nossos pecados. Os cristãos são as únicas pessoas que celebram a vida na fatal caducidade do tempo. Outros povos têm também seu dia semanal de descanso (os judeus, sábado, os muçulmanos, sexta ) mas não como dia da vida. É mais trágico “descansar”, ficar sentado, do que trabalhar. É o que muitos aposentados muitas vezes manifestam. “A vida é movimento” (Aristóteles) e só pode existir se de fato
ressuscitamos. Prodígio que celebramos em Cristo cada Domingo. Não nos consta, afirma K Rahner, contra os que esperam viver no céu contemplando “estaticamente a Deus, que a vida eterna seja assim. O movimento da vida será tão veloz que, o espaço e o tempo que o determinam (V=ExT) precisam ser infinitos e eternos. No Domingo substraímos as coordenadas espaço-temporais para sermos imortais e plenos de vida.

O tradicional “descanse em paz” com o qual seremos despedidos desta vida, teria maior sentido pascal se, como costumamos, disséssemos: “Vai com Deus”.

A Aparição de Jesus Cristo

A narrativa da aparição de Cristo ressuscitado na tarde do mesmo dia, Domingo, em que Jesus ressuscitou, mostra-nos outros aspectos do acontecimento da ressurreição. Jesus “entrou estando as portas fechadas”. Ele não estava mais condicionado à lei física da impenetrabilidade. Seu corpo (pessoa) glorioso pertence ao outro “reino” ou eón. Por isso, nas suas “aparições” precisou se dar a conhecer. Não era um fantasma, mas também não era realidade deste mundo.

A única relíquia física que temos da pessoa de Jesus é o Santo Sudário de Turim a desafiar os olhos da ciência. Nele aparece seu rosto e corpo, com vestígios de sangue e sinais reais das suas feridas. Inclusive, ultimamente, foram descobertos neste sublime lençol, microscópicas partículas de pólen diferentes,
pertencentes aos três lugares nos quais foi resguardado: Palestina, Edessa (Turquia) e, dali, levado pelos monges Templários a Lirey (França) no ano 1354 para, finalmente, no ano 1535, ficar em Turim onde está até hoje, passando ileso no seu périplo por várias catástrofes e dois incêndios. O Corpo de Jesus aparece em tres dimensões, impossível de ser reproduzido mesmo com os meios químicos e tecnológicos de nosso tempo, assim como não podemos explicar a consistência do seu tecido, como acontece também com a gravura da Virgem de Guadalupe. Os discípulos “viram” Jesus com menor realismo histórico do que podemos ver no Santo Sudário de Turim. Em ambos casos, Cristo ressuscitado será até o fim dos tempos objeto da nossa Fé. Aquele que “decide” crer experimenta já neste mundo a vitória da sua morte e o perdão dos seus pecados. E quem não crer, embora também será salvo, passará tragicamente esta vida, escravizado pelo medo da morte e do diabo (pecado) (Hb.2,15). Há quem, como Tomé, exige uma prova mais sensível “tocar” Cristo ressuscitado, impossível, é claro, mas até nisto a misericórdia divina condescende para nos salvar.

Na Eucaristia, o vemos, tocamos e comemos, mas Deus não nos dispensa a Fé. “Felizes os que não viram e creram”. Para ver é preciso previamente crer. “Venham e verão”, foi assim que Jesus chamou aos seus primeiros discípulos. Por isto, os cientistas, mesmo não podendo refutar o fato real do corpo de Cristo estampado no Santo Sudário de Turim, não conseguem vê-lo, como não vemos Deus presente na “fornalha” do sol, verdadeira Sarça ardente de Moisés que não se consome.

A grande espiritualidade que deixou Santo Inácio de Loyola para seus discípulos, os jesuítas, foi “ver Deus em todas as coisas”. Milagre, em latim, significa
admirar. A fé torna nossa existência permanentemente milagrosa a ser consumada com o milagre dos milagres que é a ressurreição.

“E SOPRANDO SOBRE ELES” lhe comunicou o dom do Espírito Santo, o dom da vida e também o perdão dos pecados.

O gesto de Jesus ressuscitado remete-nos ao sopro vital de Deus no boneco de barro inerte de Adão (Gn.2). A ressurreição inaugura a era da vida eterna e gloriosa. “O mesmo Espírito que ressuscitou Jesus de entre os mortos, dará também vida aos vossos corpos mortais” (Rm.8,11) e o perdão dos pecados. Este Pentecostes ou colheita da Ressurreição foi empobrecido interpretando o dom de vida e perdão dos pecados como “poder”, inclusive “transferindo” este poder aos apóstolos e os que lhe sucederam no seu ministério evangelizador. Na teologia se diz que o sacerdote perdoa os pecados na pessoa de Cristo. De fato, quem perdoa é Cristo. Mas, a maneira como é celebrado, este perdão ou misericórdia divina ficam empobrecidos. Além de limitar este dom de Deus à autoridade de certas pessoas consagradas, nem sempre disponíveis, o transforma em tribunal de justiça no qual o pecador recebe “absolvição” com certas condições e devida indenização. O texto grego usa o termo “kratein”, que significa controlar, dominar, no lugar de perdoar, e mal no lugar de pecado.

O Espírito Santo, que faz presente a Jesus ressuscitado até o fim do mundo, é a própria misericórdia de Deus que nos faz nascer como filhos de Deus.

O mal, o pecado e a morte são controlados, dominados e vencidos pela energia da ressurreição que se torna espírito de vida e de santidade.”

A morte não mais nos roubará a vida” (K.Rahner). Os que professam a Fé cristã, tornam “sensível” este mistério através dos sacramentos do Batismo e do Perdão dos Pecados (a Penitência) em favor de todos, assim como celebramos a vitória sobre o pecado e a morte na Eucaristia com a mesma dimensão universal.

Nosso pecado será maior, do que os nossos outros próprios pecados, se nos omitirmos em celebrá-lo sacramentalmente ou com gestos de perdão e de misericórdia para com os outros, pois “reteremos” a misericórdia e a salvação de Deus destinada ao mundo inteiro.

Nos, os que cremos, “somos sinal e instrumentos da salvação de Cristo” para todos. Evangelizar consiste em fazer todos os povos conscientes desta salvação.

Padre Jesus Priante
Espanha.
Edição e intertítulos por Malcolm Forest. São Paulo.
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