De Lagartas e Crisãlidas

    A menina corria solta pela relva ainda úmida da neblina noturna. O dia e com ele as borboletas multicores aureolavam a pequena, numa dança extasiante a saudar a vida. Quem não imagina ou nunca tenha contemplado tão paradisíaca cena? A menina e as borboletas! A dança da vida!
    Até que, de repente, a menina se depara com uma asquerosa lagarta a cruzar seu caminho. Tomada de pânico, interrompe sua idílica dança matinal, junto às borboletas e corre para os braços da mãe. Uma lagarta! O bicho, de fato, causa nojo e medo. Não há como negar tais evidências. Mesmo ensinando à menina que aquele bicho repelente era apenas uma futura borboleta, o ciclo intermediário no processo da metamorfose da lagarta à crisálida. Sem a transformação do feio não existiria o belo. Sem o processo da crisálida – um período ninfal na produção da seda – aquele inseto nunca iria borboletear na vida, oscular as flores, ziguezaguear sobre a figura da menina feliz…
    Maravilhas da natureza! Segredos que o mistério da vida transporta para nosso cotidiano e para os quais muitas vezes não olhamos com a atenção e o respeito que merecem. Sem o feio não existiria o belo. Sem uma transformação profunda, constante, consciente, nossa vida não conheceria a preciosidade de muitas sedas, a maciez, a resistência, a coloração, as mil e umas utilidades dessas em nossas vidas; não teríamos borboletas no paraíso que Deus nos deu. Enfim, sem o parto da nossa insignificância – o nada que éramos transformado em tudo o que hoje somos – a crisálida de nossa transformação interior seria apenas um invólucro descartável, tão asqueroso quanto! É isso o que denominamos evolução, crescimento, maturidade. Nossa alma – a princípio uma simples lagarta coberta pela negritude do pecado original – há de metamorfosear-se nesse processo de crescimento que a vida nos oferece, para um dia voar em liberdade ao redor da plenitude da Vida, essa que é a menina dos olhos daqueles que acreditam. É isso. Esse é o processo da fé.
    Porque se acreditamos ser a vida uma oportunidade de transformação, eis que o verme do passado uma dia criará asas. Não sem antes produzir sua seda, suas obras que possibilitarão maravilhas no mundo. Esse é o processo que conduz nossa existência e dá sentido a ela. Pela fé realizamos maravilhas. Pela fé nos metamorfoseamos, transformamos nossa existência. Pela fé abandonamos o pecado, nos debatemos no casulo de nossas vidas terrenas, mas a vencemos manhã a manhã, diuturnamente, se aceitamos em nossa realidade o processo das mudanças que Deus opera em nós. Só assim nossa existência contribuirá para um renascimento de júbilo, uma vida nova em Cristo. Para isso precisamos romper nosso casulo, dar asas aos sonhos de vida plena. Esta só Cristo oferece. “Se alguém está em Cristo, é nova criatura. As coisas antigas passaram; eis que uma realidade nova apareceu” (1 Cor 5,17).

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