Contemplar o Deus misericordioso

    Dentre as sugestões para a vivência das obras de misericórdia, o mês de julho, que estamos iniciando, que nos faz viver o clima da Jornada Mundial da Juventude, escolhemos um tema mais contemplativo. Acredito que a contemplação do Senhor Misericordioso nos faz ter um coração renovado, que deve se traduzir em atitudes misericordiosas.
    A importância da vida de oração nos une cada vez mais ao Senhor das misericórdias para que, acolhendo o dom da graça de Deus em nossas vidas, experimentemos, pela ação do Espírito Santo, a Sua presença.
    Existem muitos enfoques que podemos trilhar para essa contemplação. Procuremos alguns textos bíblicos que nos falam dessa direção.
    A Palavra de Jesus (Mt 5, 38-48) nos convida a amar a todos, sem nenhuma discriminação, pois assim seremos perfeitos como o Pai Celeste é perfeito. O Senhor nos convida a ser santos como Ele é santo! A santidade a que somos chamados consiste em fazer a vontade de Deus nosso Pai, que ama a todos, sem distinção. Diz-nos São Paulo: “Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação” (1Ts 4, 3). Jesus nos convida a viver a caridade para além dos critérios humanos. Neste sentido, em nossa Carta Pastoral “Com Misericórdia Olhou para Ele e o Escolheu” fixamos como obra de Misericórdia para o mês de julho de 2016 “Contemplar o Deus misericordioso”. (Cf. Carta Pastoral “Com Misericórdia Olhou para Ele e o Escolheu”, n. 23.3). Como Moisés, que ao encontrar com o Senhor voltou com o rosto luminoso, assim somos chamados a ter o mesmo “contagio” que nos transfigura ao encontrarmo-nos com o Senhor.
    “Aquele que te fere na face direita, oferece-lhe também a esquerda” (Mt 5, 39). Jesus Cristo estabelece novas bases – o amor, o perdão das ofensas, a superação do orgulho – sobre os quais os homens hão de atender a uma defesa razoável dos seus direitos. Ainda: “Amai os vossos inimigos, rezai por aqueles que vos perseguem e caluniam” (Mt 5, 44). Devemos também viver a caridade com aqueles que nos tratam mal, que nos difamam e roubam a honra, que procuram positivamente prejudicar-nos. O Senhor deu-nos exemplo disso na Cruz, e os discípulos seguiram o mesmo caminho do Mestre. Ele nos ensinou a não ter inimigos pessoais – como o testemunharam heroicamente os santos de todas as épocas – e a considerar o pecado como o único mal verdadeiro.
    Somos chamados a contemplar essa misericórdia! Cristo não pregou essa doutrina somente com a palavra, mas também com o exemplo. Do alto da cruz, depois de crucificado por todos os pecadores, pronuncia aquelas palavras que continuam nos comovendo profundamente: “Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Faz dois mil anos que essas palavras ressoam aos “ouvidos” do Pai que, em atenção a essa súplica do seu Filho, ao qual não fizeram justiça, continua perdoando e nos levando ao Paraíso.
    As consequências dessa contemplação é também aos que nos odeiam e aos que nos maltratam, aos que nos perseguem e aos que falam mal de nós, pois nem excluímos os que difamam a Igreja e os que injuriam os ministros de Deus. Também os insensatos que afirmam disparates contra a fé e os bons costumes, tentando corromper a família, a juventude e as crianças, devem ser objetos do nosso amor que perdoa (mesmo denunciando profeticamente as maldades que fazem). Enfim, todos os que nos consideram inimigos – nós, ao contrário, não somos inimigos de ninguém – se sintam amados e perdoados por nós. O amor de Cristo não conhece fronteiras e nós, seus discípulos, também devemos desconhecê-las.
    Jesus chama atenção para o espírito, a intenção, a motivação com a qual se realiza o preceito: “Ouvistes o que foi dito: olho por olho, dente por dente” – é justo, era a medida da justiça da Lei de Moisés e ainda hoje é a medida de todos os tribunais do mundo. Este preceito não é de vingança, é de justiça: um olho por um olho, um dente por um dente! “Eu, porém, vos digo: não só justiça, mas misericórdia, generosidade, porque vosso Deus é assim”! “Ouvistes o que foi dito: amarás a quem te ama, não tens obrigação para com teus inimigos. Eu, porém, vos digo: amai a todos, amai sem esperar recompensa, porque o coração do vosso Pai no céu é assim”! Abri-vos, pois, irmãos meus, abri-vos para Deus, aquele Deus que vos deu tudo quando vos deu o Filho Único, o Amado, até a morte e morte de cruz.
    Peçamos a Deus na nossa oração pessoal que nos dilate o coração; que nos ajude a oferecer sinceramente a nossa amizade a um círculo cada vez mais vasto de pessoas; que nos anime a ampliar constantemente o campo do nosso apostolado, ainda que num caso ou noutro não sejamos correspondidos, ainda que seja necessário ceder nalgum ponto de vista ou nalgum gosto pessoal. 
    O Senhor sempre nos perdoa! Ele tem uma paciência infinita com a nossa mesquinhez e com os nossos erros. Por isso nos pede – e assim nos ensinou expressamente no Pai Nosso – que tenhamos paciência em face de certas situações e circunstâncias que dificultam que os nossos amigos ou conhecidos se aproximem de Deus.  

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