Caça fantasmas

    A tecnologia enriquece a humanidade. Mas às vezes também empobrece e a torna mais ridícula do que realmente é.  Dias desses, passou por mim uma jovem toda faceira, gesticulando, sorrindo, conversando. Seria comigo? Logo me dei conta de que ela falava ao celular, sem interromper seus passos e seu objetivo de chegar o quanto antes. Imaginem essa cena a quinze, vinte anos atrás. Lá se ia mais uma débil mental a conversar consigo mesma.
    Mas ridículo do ridículo presenciei esta semana. Um bando de jovens (alguns adultos) parou repentinamente numa praça da cidade. Desceram de seus carros às pressas e, munidos de seus respectivos celulares, corriam de um lado a outro, gritando, apontando, registrando. “Aqui, ali, mais outro naquele banco”! Vim a saber serem eles caçadores de “Pokemons”, o mais novo jogo interativo criado pela tecnologia virtual. Não conheço detalhes desse jogo, mas, em rápidas pinceladas, meu neto me explicou, finalizando: “É o maior barato”! Enquanto tais brinquedos se limitarem a essa caça de fantasmas virtuais, vá lá… Mas seria apenas isso o espírito desse joguinho sem grandes pretensões?
    Alguns já falam em instrumento de quebra de individualidade, espionagem, criação de mais dados sobre hábitos e costumes da população, etc. Talvez haja um pouco de exagero, mas sempre é bom alguns critérios e cuidados, já que a “nuvem de dados” do indivíduo na era cibernética é hoje maior que o velho histórico da nossa vida em mãos de São Pedro – esse que nos receberá ou não às portas do Paraíso. O fato mais cômico (ou trágico) é que está surgindo uma geração de caçadores de ilusões. Nada mais que isso. E, o pior: com sua ingenuidade e impulsividade, vai por certo alimentar a fortuna de mais um desses gênios da cibernética.
    Enquanto isso, aqui no Brasil a euforia olímpica toma conta. Não do povo, mas de uma pequena elite, pois somente aos mais ricos será dada a possibilidade de acesso aos faraônicos monumentos das competições, e os pobres mortais da plebe –se quiserem – poderão aumentar a audiência da emissora que monopoliza os direitos de transmissão. É sempre assim. Enquanto milhões se debatem às portas dos hospitais sem verbas, sem médicos (alguns foram evacuados para dar prioridade aos visitantes), enquanto o trajeto habitual de cariocas é fechado para dar maior vazão e segurança ao ir e vir dos atletas, enquanto tapumes com desculpa de acessórios de ornamentação impedem a visão de nossas favelas – nossa realidade, enquanto tantas outras carências e prioridades, tantas vozes abafadas de uma nação espoliada e ridicularizada mundialmente, enquanto muitos se esforçam para acertar seus passos com um trabalho digno e honesto, muitos riem de nossa inocência.
    Mas a fé do povo é maior. Estamos vivendo um período de caça “às bruxas e bruxos” de carne e osso. Muitos já não nos assombram mais. Saem do campo virtual e se tornam conhecidos de todos, réus confessos, que aos poucos dão testemunho dos crimes presenciados e praticados à sombra do poder. “Portanto, estamos rodeados dessa grande nuvem de testemunho. Deixemos de lado tudo o que nos atrapalha e o pecado que se agarra em nós. Corramos com perseverança na corrida, mantendo os olhos fixos em Jesus, autor e consumador da fé” (Heb 12, 1-2). Assim chegaremos ao pódio, o grande pedestal dos vitoriosos, aqueles que distinguem bem um fantasma midiático, virtual, da realidade que nos cerca. Separam o ridículo da ação de muitos da postura sempre paciente dos que não caçam ilusões passageiras, mas a Verdade, o único troféu capaz de coroar nossa vida, nossa esperança.

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