Apólogo da Amazônia

    Vivemos dias esfumaçados e nublados. Não vamos discutir quem botou fogo em Roma, mas quem vergou o bíblico cedro do Líbano, sim. Já nos tempos do poderoso Nabucodonosor discutia-se o domínio de seu reino como uma ramagem vistosa e luxuriante a estender-se sobre todas as demais nações, qual gigantesco cedro dominando sobre as demais árvores. Então um pequenino profeta, Ezequiel, formulou e proclamou o famoso apólogo sobre o cedro, a partir de uma pergunta: “A quem te assemelhas, em tua grandeza?”. Está lá, para você conferir: Ezequiel 31, 1-18.

    A analogia com nossa gigante Amazônia não se estende somente à sua grandeza territorial, mas também e principalmente ao seu valor global. O que seria do nosso planeta sem seu pulmão verde? “Eis que o Brasil, com sua gigantesca floresta, de magníficas ramagens, cujas águas fizeram-na crescer, dominando sobre todas as árvores, dando cria a todos os animais, descanso a toda espécie de gente, bela por sua grandeza, nenhum país do jardim de Deus rivaliza com ele”, diria eu adaptando parte desse apólogo bíblico.

    O que, no entanto, altera nossa soberania? A consciência da grandeza ou o medo de não a dominar? A realidade das queimadas ou a impotência dos nossos descuidos? A ambição da posse ou a ganância do poder? Como vemos, são muitas as razões para nos preocuparmos com a preciosidade que temos e a responsabilidade de bem geri-la aos olhos do mundo. Sobre o cedro da Assíria o profeta já dizia: “Entreguei-o nas mãos de um poderoso das nações, que o tratará como merece a sua malignidade e o destruirá” (31,11).

    Não se trata de simples gerência patrimonial de um bem que nos foi confiado. Sua abrangência sobre os demais seres vivos é bem maior que o pobre cedro abatido, cujos galhos “juncam todas as torrentes da terra; todas as gentes da terra deixaram a sua sombra e o abandonaram” (31,12), denunciava Ezequiel ao prever a queda do Faraó de plantão naquela época. Não é o nosso caso, mas poderia ser, pois muitos pseudo-faraós testam suas vozes de comando. Muitos dos nossos poderosos estão com a barba de molho. Os embates verbais, acusações e desculpas, declarações conspiratórias e embargos comerciais, estão aí, a nos provar o quão precioso é o ar que respiramos de graça e que pode nos custar desgraças…

    Diria o profeta: “Tudo isso, a fim de que nenhuma árvore que cresce à borda das águas tire o orgulho de sua altura, e não eleve o cimo até às nuvens, é que nenhuma árvore bem regada pelas águas confie em sua estatura” (31-14). Prudência e cautela o mundo nos pede. Nada de entreveros da soberba sobre posses ou domínios meramente territoriais. Somos soberanos, uma nação livre, preciosa aos olhos do mundo, mas sobretudo, uma nação temente a Deus e consciente de suas fraquezas, especialmente na triste política daqueles que pensam nos governar. Quem nos governa é o Senhor, com sua justiça e misericórdia. No dia em que destruirmos nossa natureza, também destruiremos nossa alegria de viver ou, talvez, a própria vida. Como vemos, o fogo destruidor, intencional ou não, queima não só uma floresta, mas igualmente toda e qualquer aspiração de poder e glória longe dos domínios da fé.

    Porque no dia em que nossa negligência com a obra de Deus for maior que ela própria, estaremos apartados de sua graça e beleza. Seremos destruídos com o mesmo fogo, aquele que arde eternamente. Nesse dia, Deus ordenará o grande luto, como já o fez no passado. “Por causa dele fechei o abismo (das águas), parei os regatos e as grandes águas foram imobilizadas…, por causa dele todas as árvores do campo murcharam e secaram… abalei as nações, quando o precipitei na região dos mortos, com aqueles que descem à fossa” (Ez 31, 15-16). Brasil, salve tua pele, ops, tua mata!

    DEIXE UMA RESPOSTA

    Please enter your comment!
    Please enter your name here