A Sagrada Família é modelo às nossas famílias

    Dentro da Oitava de Natal, neste ano no dia 30 de dezembro, celebramos a Festa da Sagrada Família de Nazaré: Jesus, Maria e José.  A celebração pode passar um tanto despercebida, pois se localiza entre as alegrias do Natal e do Ano Novo, porém recomendamos uma atenção especial, pois em nossa Arquidiocese incluímos, junto com o Ano Mariano, também o Ano da Família, fazendo eco ao documento do Papa sobre a família. Isso especialmente em nossos dias, nos quais o Papa Francisco tem, na linha de seus predecessores, afirmado que há uma guerra declarada contra a família.
    Em tempos de controvérsias, especificamente no que toca à composição da família, ao valor da vida e também com relação à educação dos filhos, de retomar a voz do Papa, o sucessor de Pedro, em sua orientação sábia e segura nos caminhos do Evangelho da vida e da família, de acordo com a Amoris Laetitia (A Alegria do amor).
    Não é novidade a quem se atenta aos documentos da Igreja que o Papa Francisco seguiu as grandes linhas da Familiaris Consortio, de São João Paulo II neste ponto, acrescentando, evidentemente, sua oportuna contribuição à luz do que recebeu dos Padres Sinodais no Sínodo Extraordinário de 2014 e no Ordinário de 2015.
    O Papa, de modo muito ponderado, começa dizendo que aos pais cabe a presença junto a seus filhos, demonstrando vivo interesse por eles e especialmente observando, mas sem obsessão, se não frequentam ambientes de agressões ou de consumo de drogas.
    São suas palavras: “Se um progenitor está obcecado com saber onde está o seu filho e controlar todos os seus movimentos, procurará apenas dominar o seu espaço. Mas, desta forma, não o educará, não o reforçará, não o preparará para enfrentar os desafios. O que interessa acima de tudo é gerar no filho, com muito amor, processos de amadurecimento da sua liberdade, de preparação, de crescimento integral, de cultivo da autêntica autonomia. Só assim este filho terá em si mesmo os elementos de que precisa para saber defender-se e agir com inteligência e cautela em circunstâncias difíceis. Assim, a grande questão não é onde está fisicamente o filho, com quem está neste momento, mas onde se encontra em sentido existencial, onde está posicionado do ponto de vista das suas convicções, dos seus objetivos, dos seus desejos, do seu projeto de vida. Por isso, eis as perguntas que faço aos pais: ‘Procuramos compreender ‘onde’ os filhos verdadeiramente estão no seu caminho? Sabemos onde está realmente a sua alma? E, sobretudo, queremos sabê-lo’”? (n. 261)
    Afinal, a liberdade é um dom imenso de Deus dado a cada ser humano, também aos filhos pequenos, dentro de suas possibilidades, mas os pais têm o dever fundamental de formá-los a fim de que a usem bem. Sem formação ética não pode haver uma real sociedade humana, cuja raiz está na família. Mesmo quando é preciso corrigir, se os pais fazem essa tarefa com amor, agem muito melhor do que aqueles que deixam haver uma má ação e, depois, tentam consertá-la. É preciso existir uma educação da tendência para o bem por meio do exemplo e do diálogo entre pais e filhos, de modo que esses mesmos filhos descubram a importância dos verdadeiros valores em suas vidas.
    Importa, nesse contexto, que o próprio filho descubra “o que ele lucrará com isso”, no sentido de entender a razão de se escolher o bem e não o mal. Segundo o Papa, essa descoberta começa com coisas simples, em casa quando os adultos, sadiamente, insistem em ensiná-los “a dizer ‘por favor’, ‘com licença’, ‘obrigado’, a tal boa disposição interior não se traduzirá facilmente nestas expressões. O fortalecimento da vontade e a repetição de determinadas ações constroem a conduta moral, mas, sem a repetição consciente, livre e elogiada de determinados comportamentos bons nunca se chega a educar tal conduta. As motivações ou a atração que sentimos por um determinado valor não se tornam uma virtude sem estes atos adequadamente motivados”. (n. 266)
    Também a correção ou sanção maternal ou paternal sem ira e brutalidade, evidentemente, mas visando à educação da criança, é de grande valor e só pode ter consequências positivas na vida dos filhos e filhas, o que, sem dúvida, resulta em grande bem-estar a toda a família. Não se deve recear de orientar com firmeza as crianças – de acordo com suas capacidades de entendimento –, a fim de que peçam perdão e reparem o mal cometido. Isso não lhe podará a liberdade pessoal, mas as guiará para levá-las sempre mais além.
    Poderá parecer árduo no momento, mas, com o passar dos tempos, a pessoa corrigida agradecerá. Caso contrário, recriminará os pais pela sua falta de orientação educacional e de amor para com ela. Isso nos leva a perguntar: o que estou fazendo para o bem dos meus filhos ou daqueles que foram por Deus, como um dom, confiados aos meus cuidados?
    Evite-se dar aos filhos grandes fardos, mas, ao contrário, ensine-os como se estivesse ensinando-os a andar, passo a passo e com segurança, sem autoritarismo ou modelos falsos. Mostre-lhes exemplos verdadeiros de pessoas virtuosas, embora lhes dando a entender também, em contrapartida, que todos temos falhas e somos imperfeitos. Só Deus é perfeito ou a Perfeição por excelência. Também em alguns casos – hoje não parecem poucos – importa ajudar nossos adolescentes e jovens a se curarem de feridas interiores que tantos males lhes causam e a quem com eles convivem.
    O Santo Padre demonstra, à luz de estudos atuais, que com doses homeopáticas se chega à meta almejada e toca, ao mesmo tempo, em um exemplo espinhoso de nossos dias, as drogas: “A psicologia e as ciências da educação, com suas valiosas contribuições, mostram que é necessário um processo gradual para se conseguir mudanças de comportamento, e também que a liberdade precisa ser orientada e estimulada, porque, abandonando-a a si mesma, não se garante a sua maturação. A liberdade efetiva, real é limitada e condicionada. Não é uma pura capacidade de escolher o bem, com total espontaneidade. Nem sempre se faz uma distinção adequada entre ato ‘voluntário’ e ato ‘livre’. Uma pessoa pode querer algo de mal com uma grande força de vontade, mas por causa de uma paixão irresistível ou de uma educação deficiente. Neste caso, a sua decisão é fortemente voluntária, não contradiz a inclinação da sua vontade, mas não é livre, porque lhe resulta quase impossível não escolher aquele mal. É o que acontece com um dependente compulsivo da droga: quando a quer, a quer com todas as suas forças, mas está tão condicionado que, na hora, não é capaz de tomar outra decisão. Portanto, a sua decisão é voluntária, mas não livre. Não tem sentido ‘deixá-lo escolher livremente’, porque, de fato, não pode escolher, e expô-lo à droga só aumenta a dependência. Precisa da ajuda dos outros e de um percurso educativo” (n. 273). Muito mais que condenação, é preciso ajuda efetiva ao viciado.
    Todos esses passos sempre se dão dentro de uma família estruturada e capaz de impregnar o íntimo da criança ou do adolescente, favorecendo-lhes a liberdade e não a coação no agir, a fim de que futuramente não venham eles a dizer: “me ensinaram assim”, “sempre agi assim”, nem se pode deixá-los expostos a certos meios de comunicação que possam fazer-lhes mal ou satisfazê-los dentro da velocidade cibernética de nossos tempos. Eles se tornarão prepotentes, a querer tudo “na hora” e a achar que o centro do mundo são eles. Precisam aprender a se controlar para dominar-se, respeitar-se e respeitar os outros, bem como ao meio ambiente, a casa comum na qual vivem. (Cf. n. 276).
    É certo que a família há de ser ajudada pela escola – e a escola confessional católica tem grande peso nisso – bem como pela catequese paroquial ou familiar. Deve a escola católica ensinar junto às disciplinas curriculares seus alunos a olharem o mundo com o olhar de Cristo Jesus e, ao viver e transformar esta realidade, terem os olhos postos na eternidade. Caso qualquer instituição educacional propuser conteúdos contrários aos valores da vida, da religião e da família, cabe o direito à objeção de consciência, ou seja, resistir, dentro da lei e da ordem, a cumprir aquela norma educativa. (Cf. n. 279).
    Tem importante relevância a formação religiosa dos filhos: os pais, quando os levam às águas do Santo Batismo, os fazem renascer para uma vida nova em Cristo, depois os educam por meio da oração em família ou na comunidade maior e ensinam-nos a viverem o Evangelho de modo aberto – e não fechado em si mesmo – ao mundo, inclusive aos pecadores, como Jesus fez. Daí conclui o Papa: “é bonito quando as mães ensinam os filhos pequenos a enviar um beijo a Jesus ou a Nossa Senhora. Quanta ternura há nisto! Naquele momento, o coração das crianças transforma-se em lugar de oração” (n. 287). Por que não reavivar esse gesto em nosso dia a dia?
    Também a educação sexual deve ser tratada dentro de uma escala de valores humanos e cristãos, de acordo com a idade e a maturidade de cada um dos formandos, e não apenas a título de informação biológica. É preciso ensiná-los à doação mútua, seja a uma pessoa em especial ou a muitas, como é o caso do amor da pessoa consagrada ou celibatária ao Reino no sacerdócio ministerial. Isso, por si só, já rechaça o banalismo, que prega um “sexo seguro” fazendo o(a) outro(a) de objeto de seus caprichos e fechando o ato sexual à vida. Ato a ser realizado dentro do Sacramento do Matrimônio, no qual a entrega total do casal pode gerar vidas novas a serem educadas pelo amor materno e paterno.
    Em um tempo no qual muito se propaga a ideologia de gênero, vejamos o que o Documento ensina em seu número 285: “A educação sexual deveria incluir também o respeito e a valorização da diferença, que mostra a cada um a possibilidade de superar o confinamento nos próprios limites para se abrir à aceitação do outro. Para além de compreensíveis dificuldades que cada um possa viver, é preciso ajudar a aceitar o seu corpo como foi criado, porque ‘uma lógica de domínio sobre o próprio corpo transforma-se numa lógica, por vezes sutil, de domínio sobre a criação. (…) Também é necessário ter apreço pelo próprio corpo na sua feminilidade ou masculinidade, para se poder reconhecer a si mesmo no encontro com o outro que é diferente. Assim, é possível aceitar com alegria o dom específico do outro ou da outra, obra de Deus criador, e enriquecer-se mutuamente’. Só perdendo o medo à diferença é que uma pessoa pode chegar a libertar-se da imanência do próprio ser e do êxtase por si mesmo. A educação sexual deve ajudar a aceitar o próprio corpo, de modo que a pessoa não pretenda ‘cancelar a diferença sexual, porque já não sabe confrontar-se com ela’”.
    Ao celebrarmos, dentro da Oitava do Natal, a Festa da Sagrada Família é tempo de aprofundar ainda mais a beleza do matrimônio e, assim, elevar a Deus uma prece de ação de graças pelo dom desse Sacramento e por todos os que vivem, com edificante exemplo, a santificante vida matrimonial como autêntica Igreja Doméstica.
    Auguro que os ensinamentos do Santo Padre na Amoris Laetitia calem fundo em nossos corações. Que a Família de Nazaré, Jesus, Maria e José, seja nosso modelo de vida e de fé, hoje e sempre. Amém!

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