A sabedoria e o homem

    “Curta é a nossa vida, e cheia de tristezas, para a morte não há nenhum remédio. Não há notícia de ninguém que tenha voltado da região dos mortos” (Sab 2,1). Esse é o pensamento dos ímpios e insensatos. Triste sina, que leva a muitos ao gozo e aos prazeres da vida sem freios ou regras de comportamento. Sem esperanças, sem Deus.
    De Paulo Autran – ator brasileiro de renome, que faleceu em 12 de outubro de 2007 – um dia ouvimos: “Acho que a morte é que faz a vida ser tão boa. Já imaginou que horror viver eternamente? Para sempre? Não poder morrer, não poder acabar? E é por isso que viver é tão bom, é tão impressionante, é tão prazeroso”. Não conheci a fé desse ator, mas essa não nos interessa agora. Sei de sua vida, de sua paixão pela arte teatral, com princípio, meio e fim. Esse é o roteiro perfeito. Isso é tudo, pois no palco da vida deveríamos ansiar por um fim apoteótico, que mereça ao menos os aplausos da platéia que nos acompanha. Isso é o existir perfeito.
    “Um belo dia nascemos – diz a Sabedoria – e depois disso, seremos como jamais tivéssemos sido!” (2,2).  Aqui é possível encontrar o sentido de nossas existências. Uma finalidade, um roteiro a seguir. Nisto reside nosso estar nessa vida. Não um mero existir, uma presença estática, decorativa apenas, nesse cenário exuberante e em constante evolução. Papéis figurativos cabem às coisas inertes, aos seres sem alma, que enfeitam nosso palco. Ao ser humano está reservado o papel principal, como personagem dinâmico de uma história de amor. Apesar dos muitos que atuam como coadjuvantes; vilões dessa história!
    “Extinta ela, nosso corpo se tornará pó” (2,3). Essa verdade assusta. Céticos quanto ao enredo que os envolvem, muitos acabam alimentando a própria inutilidade, ao concluírem “o nosso espírito se dissipará como um vapor inconsistente! É fumaça a respiração de nossos narizes, e nosso pensamento, uma centelha”. Ah, se fosse apenas isso! Qual razão os move, a ponto de reduzirem drasticamente o espetáculo da vida? Para esses, mais que comédia, seu viver é uma tragédia. Tragicomédia. “Com o tempo nosso nome cairá no esquecimento e ninguém se lembrará de nossas obras” (2,4). Uma verdade, enfim. Para os ímpios está reservado o ostracismo, a ignorância de seus feitos, ações ou omissões. Esse já é um princípio de condenação, pois nada há de mais triste que sermos lembrados somente pela inutilidade de nossa existência. Quando muito!
    “E nenhum reinício é possível uma vez chegado o fim” (2,5). Essa é a lógica dos que assomam ao palco da vida com uma existência consciente, serena, feliz pelo privilégio de uma atuação concreta. Ela deve almejar um final feliz. Que mereça os aplausos dos anjos dos céus – a platéia fiel e serena que nos assiste neste mundo.
    Os insensatos são capazes de ironizar: “Vinde, portanto! Aproveitemo-nos das boas coisas que existem, vivamente gozemos das criaturas durante nossa juventude!” (2,6). Inversão de valores, dos papéis pré-estabelecidos pelo autor da vida. Não é esse o roteiro. Não é essa a sensatez que buscamos, tirocínio senão lógico, ao menos natural na essência da criatura humana. Bom-senso é o que lhes falta. “Porque de nada valerá ao homem ganhar o mundo todo, se vier a perder a sua alma” – disse Jesus. Eis a lógica cruel e triste para os que pontificam suas existências à luz dos anos que se findam, dos dias, das horas e minutos que lhes restam. “Aproveitemos ao máximo!” – dizem. Levam para o túmulo uma biografia manchada por contradições.
    “Mas as almas dos justos estão na mão de Deus, e nenhum tormento os tocará” (3,1). Divina promessa. Aquele único vivente “que voltou da região dos mortos” também intercedeu por nós: “Pai, quero que, onde eu estou, estejam comigo aqueles que me deste, para que vejam a minha glória” (Jo 17,24). Que um dia nos encontremos lá, no resto do resto que nos resta, a Eternidade…

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