A plena participação dos fiéis

    Nos dias de hoje, vivemos em uma era digital em constante evolução. As redes sociais se tornaram um ambiente em que as pessoas interagem, compartilham experiências e cultivam relacionamentos como nunca. No entanto, ao mesmo tempo em que os avanços tecnológicos nos permitem essa interação, também precisamos redescobrir a importância do encontro humano genuíno, especialmente diante da influência crescente da inteligência artificial na comunicação. Estamos neste tempo de reflexão sobre a importância da presencialidade diante de passos importantes que foram dados como solução durante a pandemia, que foram as reuniões virtuais. Hoje ainda temos um certo descompasso com a participação do nosso povo presencialmente.

    Por isso, o Dicastério para a Comunicação, da Santa Sé, publicou o documento “Rumo à presença plena. Uma reflexão pastoral sobre a participação nas redes sociais”, que aborda a importância da plena participação dos fiéis na vida da Igreja. Sua importância é a promoção de um maior envolvimento e engajamento dos católicos em suas comunidades.

    A Igreja tem abordado a realidade digital, reconhecendo que as redes sociais não são apenas instrumentos, mas espaços onde a Boa Nova pode ser proclamada. Desde as mensagens anuais para o Dia Mundial das Comunicações Sociais até os pronunciamentos dos papas Bento XVI e Francisco, a Igreja tem buscado refletir sobre o uso das mídias digitais e a importância dos relacionamentos autênticos nesses ambientes.

    Existem muitos exemplos de participação fiel e criativa nas redes sociais por parte de comunidades e indivíduos que testemunham sua fé de maneira abrangente. A pandemia da covid-19 destacou ainda mais o poder da mídia digital como um instrumento de ministério. Um exemplo marcante foi a oração e a mensagem do Papa Francisco transmitidas ao vivo para o mundo inteiro, unindo pessoas em um momento de unidade e comunhão, apesar da distância física imposta pelo confinamento.

    No entanto, ao mesmo tempo em que reconhecemos o potencial positivo das redes sociais, também precisamos estar cientes das ciladas que podem surgir nesse ambiente. A desigualdade digital e a desigualdade nas redes sociais são questões urgentes que precisam ser enfrentadas. Nem todos têm acesso igual às tecnologias de comunicação e informação, o que resulta em exclusão e marginalização. Além disso, as redes sociais muitas vezes são dominadas por interesses comerciais, transformando os usuários em consumidores e produtos ao mesmo tempo.

    Nesse contexto, é necessário refletir sobre como os cristãos devem participar das redes sociais. Devemos buscar relacionamentos pacíficos, significativos e atenciosos, evitando as ciladas que podem minar nossa experiência digital. A parábola do Bom Samaritano nos lembra da importância de enxergar o próximo em todas as situações, inclusive no mundo digital. Devemos redescobrir uma “terra prometida” digital, onde valores como transparência, confiança e compartilhamento de informações possam prevalecer.

    O discípulo que encontrou o olhar misericordioso de Cristo experimentou algo mais. Ele sabe que a boa comunicação começa com a escuta e a consciência de que há uma pessoa diante de mim. Ouvir dessa maneira é essencial para envolver os outros e é o primeiro passo para uma comunicação genuína.

    O Evangelho de Lucas não apresenta diálogo entre os dois homens, mas podemos imaginar que o samaritano tenha perguntado ao homem o que havia acontecido. Mesmo sem palavras, o encontro começou com um gesto de abertura e hospitalidade. A capacidade de ouvir e de estar aberto para receber a história do outro impediu que o homem ferido fosse abandonado à morte.

    Essa interação entre os dois homens nos inspira a dar o primeiro passo no mundo digital. Somos convidados a valorizar a dignidade daqueles com quem temos diferenças e a olhar além de nossas bolhas e filtros de segurança. Para nos aproximarmos verdadeiramente nas redes sociais, precisamos ser intencionais e começar ouvindo bem, permitindo que a realidade do outro nos toque.

    Diante do excesso de estímulos das redes sociais, o silêncio se torna um bem precioso, pois permite a concentração e o discernimento. O silêncio nos ajuda a escapar da cultura digital e a nos comprometermos mais profundamente com Deus e com os outros. A escuta emerge do silêncio e é fundamental para cuidar dos outros. Quando realmente escutamos, acolhemos a pessoa, oferecemos hospitalidade e mostramos respeito. A escuta requer humildade, pois reconhecemos a verdade e o valor além de nosso próprio ponto de vista limitado.

    Nas escrituras, como nas cartas dos Apóstolos, há uma tensão entre a presença mediada e o desejo de um encontro pessoal. Embora o contato face a face seja valorizado, a presença por meio de palavras escritas também pode ser significativa na formação e interligação das comunidades. As relações estabelecidas nas redes sociais podem fortalecer as paróquias e comunidades locais, e vice-versa. É necessário lembrar que do outro lado da tela existem pessoas reais, com histórias, sonhos, expectativas e sofrimentos.

    As redes sociais também podem ser vistas como um “caminho para Jericó”, onde encontramos pessoas em situações de vulnerabilidade e podemos agir como o Bom Samaritano, cuidando delas e buscando curar as divisões existentes. Ser simplesmente “cristão” nas redes sociais não é suficiente. Muitos perfis ou contas proclamam conteúdo religioso, mas não praticam dinâmicas relacionais fiéis. O uso hostil das redes sociais, com palavras violentas e ofensivas, contradiz o próprio Evangelho. Ser um Bom Samaritano nas redes sociais significa agir com compaixão, cuidando das feridas das pessoas e trabalhando pela cura e reconciliação, mesmo em meio a conflitos e divisões.

    O Papa Francisco enfatiza que a comunicação vai além de estratégias e técnicas, é uma expressão do próprio ser, envolvendo a alma, corpo, mente, coração e mãos. O verdadeiro comunicador dá o máximo de si, compartilhando o amor e vivenciando um estilo de partilha. O estilo distintivo do comunicador cristão reflete as características de Deus: proximidade, compaixão e ternura. Jesus estabeleceu o amor como sinal distintivo de seus discípulos, e é por meio do amor que a comunidade cristã pode ser reconhecida. Portanto, o modo como o conteúdo é comunicado nas redes sociais é tão importante quanto o próprio conteúdo.

    No contexto da disseminação de notícias falsas, Jesus Cristo, como o caminho, a verdade e a vida, é o princípio que orienta a comunhão com Deus e entre as pessoas. A obrigação de preservar a verdade surge da necessidade de reconhecer a comunhão mútua. A comunicação autêntica requer a construção de comunidades em vez de ações individuais arbitrárias. É preciso deixar de lado agendas pessoais e habilidades individuais para colaborar como membros de um corpo.

    No mundo fragmentado de hoje, as pessoas buscam liderança moral e espiritual, muitas vezes encontrando-a em influenciadores das redes sociais. Cada cristão é um micro influenciador e deve estar ciente de sua influência potencial, independentemente do número de seguidores. O estilo cristão na comunicação digital deve ser reflexivo, não reativo.

    É um documento instigante e interessante. Merece nossa reflexão e aprofundamento. Vale a pena refletir sobre isso e tomar decisões importantes em nosso trabalho pastoral.

    Dessa maneira, a comunicação nos proporciona um vislumbre da união que tem suas raízes na Santíssima Trindade e é a verdadeira “terra prometida” para todos os irmãos e irmãs em Cristo.

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