À CIDADE E AO MUNDO

    A cena do Papa Francisco galgando as escadarias de uma praça São Pedro completamente vazia, no último 27 de março, possui mais que um emblemático significado… É sintomática, aterradora. É bela, esperançosa. O quadro compõe todos os elementos para um aprofundamento da realidade que a pandemia mundial de um vírus pode representar. Um ancião numa praça vazia, perfazendo o caminho de uma escada bela, porém imensa – como aquela de Jacó – tendo por meta um altar, uma mesa e ícones da fé cristã, mas por objetivo abençoar o mundo e seus habitantes! Poesia apenas ou sério alerta às ações humanas que negligenciam o poder de Deus nessa história toda?

    Não sei mais o que dizer. Estamos vivendo dias de provações nunca dantes provados e testemunhados pela totalidade do gênero humano. Alguns dizem que o dia apocalíptico das dores finais bate à porta. Outros que a volta gloriosa do Mestre já faz ouvir os sons das trombetas e clarins angelicais, quais batedores alvissareiros de um novo tempo. Por outro lado, a dor e o medo provocam a latente espiritualidade humana. Muitos voltam a acreditar e apelam a misericórdia do Pai de todas as coisas. A fé até então recrudescida pelos prazeres do bem viver aflora como aquela água que brotou da rocha no deserto. Ainda bem! Constata-se a velha máxima das forças contidas na realidade da dor e do amor. Quem não se aproxima pelo amor, vem pela dor. Deus-Pai, de uma forma ou de outra, sempre se faz presente na história humana.

    Todavia, o essencial não foi dito ainda. Constata-se na mídia brasileira um silêncio e uma indiferença questionadora quanto ao sermão proferido naquela praça vazia. Nenhum órgão da grande mídia se preocupou em comentar ou ao menos reproduzir o que foi dito pelo solitário ancião da cátedra de Pedro. Suas palavras de esperança ecoaram no vazio da mídia fatalista e extremamente imediatista. Para esta o que vale é a palavra da ciência, desta triste e falida ciência humana capaz de disseminar um vírus, mas incapaz de frear sua ação. Palavras, no caso, apenas soltam seus perdigotos contaminadores. Mas no caso da esperança adoecida, eis que a Palavra cura. “Como sois medrosos! Ainda não tendes fé?”

    Nesse momento de dor e angustia que assola a grande nave humana e muitos de seus tripulantes zombam da “sonolência” divina, eis que Papa Francisco renova nosso espírito com a profundidade da Palavra de Deus. A citação e os comentários sobre o texto de Marcos (4, 35-41) era tudo o que o mundo precisava ouvir nesse tempo de tempestades e trovoadas. Não se compreende a indiferença midiática sobre palavras de alento e conforto providencial. Fica aqui minha indignação.

    Mas também, ecos dessas palavras. Quais as razões de nosso pânico? Simples falta de fé. “O início da fé é reconhecer-se necessitado de salvação. Não somos autossuficientes, sozinhos afundamos, precisamos do Senhor como os antigos navegadores das estrelas. Convidemos Jesus a subir para o barco da nossa vida”, lembrou o papa com seu discurso alentador. Igualmente recordou nossa necessidade de abraçar as cruzes cotidianas, não fugir da sua realidade. “Abraçar a sua cruz significa encontrar a coragem de abraçar todas as contrariedades da hora atual, abandonando por um momento a nossa ânsia de onipotência e possessão, para dar espaço à criatividade que só o Espírito é capaz de suscitar. Significa encontrar a coragem de abrir espaços onde todos possam sentir-se chamados e permitir novas formas de hospitalidade, de fraternidade, de solidariedade”.

    Eis que, de repente, o mundo se descobre fraterno e solidário. Aprende a amar, apesar das suas dores. “Mas Tu, Senhor, não nos deixe à mercê da tempestade”, foi o brado de Roma para o Mundo.

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