A ARTE DE CELEBRAR

                O segundo foco da Carta Apostólica “Desiderio Desideravi” (Desejei Ardentemente) do Papa Francisco, frisa o aspecto da arte de celebrar como questão fundamental ao bom termo de nossas celebrações litúrgicas. Não é, nunca foi e nunca será um simples ato, um acontecimento social… “A ars celebranti não pode ser reduzida a apenas um mecanismo rubrical, muito menos deve ser pensada como imaginativa – às vezes selvagem – criatividade sem regras” (48). Dizendo o que não é, Francisco foca no desejo de Cristo ao instituir seu rito sacramental, apresentando-se como centro vivo e razão do encontro eucarístico. Ele é o “artista” desse acontecimento. E, como tal, “o verdadeiro artista não possui uma arte, mas é possuído por ela. Não se aprende a arte de celebrar frequentando um curso de oratória ou técnicas de comunicação persuasivas” (50).

                Silêncio e respeito devem marcar grande parte dos momentos litúrgicos. “Entre os atos rituais que pertencem a toda assembleia, o silêncio ocupa um lugar de absoluta importância… Toda a celebração eucarística está imersa no silêncio que precede o seu início e que marca cada momento do seu desenrolar ritual” (52). Não celebramos uma festa, um bacanal mundano, mas “algo muito mais grandioso” que só o silêncio é capaz de traduzir para nossas vidas a grandiosidade do milagre que aqui contemplamos. “Também ajoelhar-se deve ser feito com arte, ou seja, com plena consciência do seu sentido simbólico e da necessidade que temos deste gesto para expressar o nosso modo de estar na presença do Senhor” (53).

                Ademais, o celebrante da liturgia eucarística nunca é nem será um homem qualquer, a quem o sacramento da ordem outorgou um ministério especial, mas sim o próprio Cristo, ali presente. Não contemplamos a simples humanidade de um Deus representado na imagem de um homem de carne e osso, como qualquer um de nós. Ao contrário, o que presenciamos é a divindade de um Homem que se fez um igual àqueles que tanto amou, que se deu e continua se doando para que tenhamos nossa fé alimentada pelo pão da vida. “O ministro ordenado é ele próprio um dos tipos de presença do Senhor que torna a assembleia cristã única, diferente de qualquer outra assembleia” (cf. Sacrossanctum Concilium n. 7), cita Francisco, que ainda nos lembra: “Então, o Senhor ressuscitado está no papel principal e não nossas próprias imaturidades” (57), referindo-se à nossa fé infantil.

                Por fim, Francisco se preocupa com a coerência de muitos sacerdotes, que, mesmo revestidos da graça de uma unção sacerdotal, ainda titubeiam no dom que receberam. Há muitos indecisos e incrédulos ao redor da mesa da comunhão, dentre estes também sacerdotes, presidentes e propiciadores do milagre que emana do altar. Nessa linha escrevi “Pedra dos Milagres” (Editora A partilha), que aqui cito para aqueles que desejem aprofundar esse assunto. Mas quem sou eu diante da preciosidade das reflexões de um Papa? Eis uma de suas preocupações, que não isenta ninguém das negligências presentes numa celebração de fé: “Os sacerdotes devem permitir que o Espírito Santo aja sobre eles, para completar o trabalho que ele começou neles em sua ordenação” (59). Por mais indigno que seja o celebrante, por mais contraditória que seja sua vida de fé – como muitas vezes constatamos – o padre nunca fala às paredes. “As palavras que a Liturgia coloca em seus lábios têm conteúdos diversos que requerem tonalidades específicas” (60). São palavras divinas, não humanas. Concluindo: “De domingo a domingo a energia do Pão partido nos sustenta no anúncio do Evangelho no qual se manifesta a autenticidade da nossa celebração” (65) Então, Ide em Paz!

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