“Our Common Mission”: encontro regional sobre a proteção de menores

Desde o início de 2017, a professora Hanna Suchocka, juntamente com outros membros da Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores, está envolvida na organização de um encontro regional sobre a proteção de menores para a Europa Centro-Oriental, a realizar-se em setembro em Varsóvia. Ele nos fala sobre a dinâmica do encontro …

Prof. Hanna Suchocka

Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores foi criada em 2104 como órgão consultivo ao serviço do Santo Padre. A tarefa da Comissão é “propor ao Santo Padre iniciativas voltadas à promoção da responsabilidade nas Igrejas particulares na proteção de todos os menores e adultos vulneráveis” (Estatuto, art. 1). Desde o início, a maior preocupação da Comissão foi encontrar a melhor maneira de proteger as crianças e ajudar o Papa e a Igreja a alcançar este objetivo. O papel da Comissão, no entanto, nunca foi o de assumir a responsabilidade por casos individuais de abuso (de competência, em vez disso, de uma autoridade judicial ou de um tribunal).

Logo ficou evidente que em muitos casos o comportamento da Igreja – voltado a defender a si mesma – a mergulhava cada vez mais em uma situação perigosa, causando ainda danos. O ressentimento mais profundo havia sido causado por aqueles que, em uma posição de autoridade, quiseram proteger a própria reputação e tentavam evitar escândalos encobrindo os abusadores, transferindo-os e, assim, provocando novos abusos de crianças em vez de sua proteção. A Comissão partilhou princípios gerais fundamentais, como a credibilidade, a transparência, a responsabilidade e a “accountability” [responsabilização ética]. Quem quer que seja responsável pelos outros deve responder, de maneira transparente, do modo como faz uso da própria autoridade; não é tolerado nenhum critério de auto regulamentação a portas fechadas, incluindo a gestão dos aspectos profissionais das funções pastorais, de ensino, de aconselhamento e de envolvimento da comunidade.

No primeiro período, a Pontifícia Comissão promoveu várias atividades e iniciativas que abordaram problemas gerais como o segredo pontifício e a obrigação de informar. Ao mesmo tempo, foram promovidas diversas iniciativas a nível local. A atenção se concentra substancialmente em áreas nas quais já se falava muito de abusos, como por exemplo o Chile. A Comissão está envolvida na organização de alguns projetos e conferências, como a Conferência Latino-Americana para a Proteção de Menores em 2017, organizada conjuntamente pela Pontifícia Comissão e pela Arquidiocese de Bogotá, com a participação da CLAR (Confederação Latino-americana de Religiosos), do CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano), das escolas católicas, de entidades governamentais, de ONGs internacionais e locais, de órgãos de informação internacionais e de Igrejas de outras denominações cristãs; ou como a verificação da condição da tutela na educação e na formação nas escolas católicas, com projetos-piloto iniciados na África do Sul, Colômbia, Índia, Filipinas e Tonga.

Em 2017, a Conferência na América Latina sobre a proteção de menores nas casas e escolas, promovida pela Pont. Com. para a Proteção de Menores
Em 2017, a Conferência na América Latina sobre a proteção de menores nas casas e escolas, promovida pela Pont. Com. para a Proteção de Menores

Europa Central e Oriental

Nesta primeira fase, a Europa Central e Oriental manteve-se fora do principal campo de interesse da Comissão. Embora inicialmente parecesse que as Igrejas daquela região haviam sido poupadas desses problemas, infelizmente mais tarde tornou-se evidente que esse não era o caso.

A ideia – ou antes, a necessidade – de organizar uma conferência para esta área geográfica nasce no final de 2017, antes da cúpula internacional que se realizou no Vaticano. A conferência “Our common mission of safeguarding God’s children foi inicialmente programada para fevereiro de 2019 e depois adiada para 2020 devido ao encontro desejado pelo Papa Francisco no Vaticano, precisamente em fevereiro de 2019. Infelizmente, a pandemia (de Covid-19) não permitiu que fosse organizada nesse período – e eis o motivo pelo qual no final a Comissão aprovou a data de setembro de 2021 para a realização desta Conferência.

Já em 2017, havia ficado evidente que o fenômeno dos abusos sexuais tinha uma dimensão muito mais amplo (do que se pensava anteriormente) nos países da Europa Central e Oriental e que não se limitava a um único país. Por isso, a Pontifícia Comissão compreendeu a importância de organizar esta Conferência em um nível regional mais amplo. Além disso, precisamente em consideração à importância da Igreja polonesa, mas também em consideração ao número de casos que vieram à tona no país, decidiu-se realizar a conferência em Varsóvia, mas que esta não se concentraria unicamente na situação na Polônia.

Nesta região existem diversos países, diversas situações religiosas e diversas comunidades eclesiais. Não obstante essa diversidade, o problema do abuso sexual contra menores existe, em diferentes níveis, em toda a região. Para poder enfrentar os desafios, é necessária uma troca de experiências entre as Igrejas de toda a região. Na luta contra a chaga do abuso sexual contra menores e na prossecução do objetivo estatutário de promover as responsabilidades das Igrejas locais, a Pontifícia Comissão exprime toda a sua solidariedade às Igrejas da Europa Centro-oriental pelo seu empenho em prevenir e combater o mal originado pela traição de jovens de sua região. Uma forma de expressar essa solidariedade é oferecer oportunidades aos líderes das Igrejas se encontrem e aprender uns com os outros e com aqueles que têm particular experiência e/ou que se confrontaram com as realidades da crise em um espírito de comunhão e determinação para garantir que a Igreja seja um local seguro para os jovens. Outro objetivo da Conferência é a prevenção do fenômeno.

A Conferência “Our Common Mission” contará com a presença de representantes de quase todos os países da região da Europa Centro-Oriental: Polônia, Eslováquia, República Tcheca, Ucrânia, Romênia, Croácia, Bielo-Rússia, Hungria, Eslovênia, Lituânia, Letônia, Estônia, Rússia , Sérvia, Montenegro, Kosovo, Macedônia do Norte, Moldávia, Albânia, Bulgária, Alemanha (com Renovabis). Participarão de cada país pessoas designadas pelas respectivas Conferências Episcopais, incluindo coordenadores ou delegados da Conferência e representantes de Congregações religiosas.

O Motu proprio do Papa Francisco “Vos estis lux mundi“, de 2019, que estabelece o procedimento que chama em causa as autoridades eclesiais, é o documento em que se baseia esta Conferência.

A situação está em evolução dinâmica

As circunstâncias mudaram desde a criação da Comissão. Duas fases podem ser distinguidas na maioria das Igrejas locais: a primeira, que vê a crescente tomada consciência do fato de que alguns sacerdotes abusaram de menores; a segunda, quando se torna evidente que a hierarquia da Igreja falhou gravemente em responder às denúncias recebidas. A sucessão de eventos em 2018, com acusações que envolveram líderes de alto nível na Igreja – como o cardeal Theodore McCarrick – e a negligência das autoridades eclesiais ao tratar as denúncias tiveram um importante impacto negativo na opinião pública no que diz respeito à credibilidade e à confiança na liderança da Igreja. A interpretação da lei no que se refere à responsabilidade de um superior pela ação de um subordinado mudou: isto significa que hoje é possível considerar responsável uma entidade jurídica eclesial pelos danos causados ​​pelo abuso sexual de um sacerdote, mesmo que isso não tenha ocorrido “no âmbito de” um eventual cumprimento de um ofício canônico por parte do sacerdote, como o ensino da religião ou a administração de sacramentos. No âmbito da jurisdição eclesial, o Papa Francisco decidiu que se os bispos falham em sua tarefa, eles devem prestar contas disso. Esta crise requer uma reflexão teológica e canônica sobre a responsabilidade de um bispo diocesano em relação à garantia de prevenção, intervenção, justiça e reparação.

Nos países da Europa Centro-Oriental, cresce a consciência social e institucional dos problemas decorrentes do abuso sexual em menores. Também a Igreja (local) está tomando consciência desse problema. Ainda existe uma mentalidade arraigada de segredo e desconfiança, legado do passado comunista. É muito importante que este aspecto seja levado em consideração na Conferência.

Prof. Hanna Suchocka (quarta à direita do Papa) e outros membros, antigos ​​e atuais, da Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores (foto de arquivo)
Prof. Hanna Suchocka (quarta à direita do Papa) e outros membros, antigos ​​e atuais, da Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores (foto de arquivo)

Os principais objetivos da Conferência

– A partilha de experiências e a reflexão com o objetivo de saber como as Igrejas da Europa Centro-Oriental estão enfrentando o fenômeno dos abusos sexuais em menores;

– inspirar as autoridades da Igreja a assumir as responsabilidades devidas para enfrentar corretamente os abusos em menores, com uma resposta adequada aos crimes cometidos por membros do clero e aos graves erros das autoridades eclesiais, juntamente com um forte compromisso em favor da prevenção;

– promover nos países da Europa Central-Oriental uma melhor compreensão da posição da Santa Sé em relação aos abusos sexuais em menores cometidos por membros do clero;

– promover uma melhor compreensão nas instituições da Santa Sé em relação às necessidades das Igrejas da Europa Centro-Oriental de uma assistência particular para enfrentar o fenômeno dos abusos sexuais por parte dos sacerdotes;

– criar uma plataforma de colaboração e de intercâmbio regular entre os países da Europa Central e Oriental;

– promover a comunicação entre as autoridades eclesiais e os fiéis e a sociedade civil dos países da Europa Central e Oriental;

– a criação de um grupo de trabalho que represente uma plataforma para um futuro intercâmbio regular e colaborativo na construção de ambientes seguros para os menores.

O início, não o fim

Desde o início houve uma precisa convicção compartilhada por todos os membros da Comissão de que os âmbitos das boas práticas deveriam incluir programas de formação e de educação. Em tudo isso, um dos aspectos cruciais é a garantia do direito à informação. A informação existente é insuficiente: em particular, existem lacunas no campo jurídico. Entre as muitas iniciativas, o reconhecimento da verdade e da justiça como direito das vítimas tem uma importância muito grande e por esse motivo é necessário que sejam reconhecidos os padrões mínimos do direito à informação. Não existe Igreja local, em nenhuma parte do mundo, imune às consequências da tragédia do abuso sexual de menores. As lições do assumir responsabilidade e transparência, dadas por outras jurisdições, precisam ser aprendidas. O tema do direito à informação encontra-se numa fase inicial e será necessário um estudo longo e aprofundado que cumpra uma análise do seu funcionamento, mas também uma troca de experiências.

Isso demonstra claramente que esta Conferência representa o início e não o fim desta atividade e quer ser o início de iniciativas e ações conjuntas.

A Professora Hanna Suchocka é professora de Direito Constitucional e especialista em direitos humanos na Universidade de Poznan (Polônia). Foi primeira-ministra da República da Polônia de 1992 a 1993 e Embaixadora do país junto à Santa Sé de 2001 a 2013. Em 2018 foi reconfirmada pelo Papa Francisco como membro da Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores.

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