Detalhes sobre a composição dos textos divinamente inspirados
ABíblia nasceu dentro da história humana, escrita ao longo de muitos anos por mãos humanas, dizendo coisas do relacionamento do homem com Deus. “A palavra de Deus, expressada em línguas humanas, se faz semelhante à linguagem humana, como a palavra do Eterno Pai, assumindo a nossa frágil condição humana, se fez semelhante aos homens” (Dei verbum, 13).
A palavra de Deus abre a história com a criação do mundo e do homem, “Deus disse” (Gn 1,3), proclama que o seu centro está na encarnação do Filho, Jesus Cristo, “o Verbo se fez carne” (Jo 1,14), e fecha-a com a promessa do encontro com Ele numa vida sem fim, “sim, Eu virei em breve” (Ap 22,20).
Seleção dos livros
A tradição da Igreja foi aos poucos discernindo quais escritos eram inspirados. A lista destes escritos é denominada Cânon das Escrituras, palavra grega que significa medida, regra. Nem todos os livros escritos entre o povo de Deus fazem parte do cânon da sagrada escritura; muitos livros se perderam com o tempo.
O cânon compreende 46 livros para o Antigo Testamento (AT) e 27 para o novo (NT). Os judeus consideravam que existiam dois cânones: o breve, escrito em hebraico (palestinense), e o longo que incluía escritos em grego (alexandrino). O AT em hebraico (Cânon Breve) é formado por 39 livros e se divide em três partes: a Torah, os Profetas e os Escritos. O Cânon Alexandrino, antigo testamento que compreendia também os livros escritos em grego, está formado por 46 livros.
A versão grega da Bíblia, conhecida como dos Setenta, contém sete livros a mais: Tobias, Judite, Baruc, Eclesiástico, I e II Macabeus e Sabedoria, além de partes do livro de Ester e Daniel. Os judeus de Alexandria tinham um conceito mais amplo da inspiração bíblica, convencidos de que Deus não deixava de se comunicar com seu povo, mesmo fora dos limites da Palestina, e de que o fazia iluminando os seus filhos nas circunstâncias em que se encontravam. Os apóstolos, ao levarem o evangelho ao mundo greco-romano, utilizaram o Cânon Alexandrino.
O Cânon do Novo Testamento é formado por 27 livros, e se divide em quatro partes: Evangelhos, Atos dos Apóstolos, Cartas e Apocalipse. No séc. I, o número dos livros variava de comunidade para comunidade; no séc. II, algumas correntes heréticas afirmavam que apenas o evangelho de Lucas e as cartas de Paulo eram inspirados, e pretendiam introduzir seus próprios escritos, de modo que foi necessária a formação do cânon para os livros do novo testamento.
O Concílio de Hipona (393) e os de Cartago (397 e 419) reconheceram o cânon de 27 livros para o novo testamento. A chegada do Protestantismo no séc. XVI reacendeu antigas reflexões acerca da inspiração dos livros. O Concílio de Trento (1545) definiu dogmaticamente a lista dos livros do NT para a Igreja Católica.
Mais que uma biblioteca
Antes de se tornar um livro, a bíblia foi vivida e experimentada, foi contada e celebrada, e, na medida do possível, algumas pessoas começaram a escrever a experiência do povo com Deus.
As formas de leitura e de interpretação variam de acordo com a comunidade; os acontecimentos bíblicos podem ser vistos por vários ângulos. A intenção é descobrir a verdadeira mensagem de Deus, comunicada em linguagem humana. “Movido pela fé, conduzido pelo Espírito do Senhor que enche o orbe da terra, o povo de Deus esforça-se por discernir nos acontecimentos, nas exigências e nas aspirações de nosso tempo, em que participa com outros homens, quais os sinais verdadeiros da presença ou dos desígnios de Deus. A fé, com efeito, esclarece todas as coisas com luz nova, manifesta o plano divino sobre a vocação integral do homem, e por isso orienta a mente para soluções plenamente humanas” (Gaudium et spes, 11).