Convém examinar, não apenas de relance, o quadro surpreendente da visita dos Santos Reis ao Menino-esperança, nascido em Belém. Não dá para entender com facilidade um acontecimento que tem vínculos simbólicos com os arcanos mais profundos da consciência humana. Chega a ser um arquétipo, nascido da consciência coletiva da humanidade, para expressar os mais recônditos desejos de fraternidade. Como expressão do que vai no refolho autêntico do ser humano, a visita dos assim chamados Reis Magos, foi um ato de significado religioso. Eles compreenderam que Jesus era muito mais do que qualquer homem, e por isso falaram: “Nós viemos para adorá-lo” (Mt 2, 2). Esse gesto é uma expressão da alma, reservado para quem o merece. Ninguém o esbanja em vão. Ademais, para chancelar a veracidade de seu ato religioso, realizaram o que costuma acompanhar qualquer oração: o sacrifício. “Ofereceram-lhe como presentes ouro, incenso e mirra” (Mt 2, 11). O incrível é que a Santa Família não recusou os presentes, apesar de virem de mãos pagãs. Ninguém exigiu deles, como atitude preliminar, abandonar os seus ídolos.
O Papa Emérito Bento XVI, um pensador magnífico e um cristão esclarecido, escreveu que a “adesão a Cristo não acontece por propaganda, ou por uma grande idéia, mas por atração” (Porta Fidei). Os Santos Reis, por Deus movidos, não responderam a uma propaganda (eventualmente enganosa), mas a uma moção interior do Espírito Divino. O proselitismo, praga useira de grupos aparentados com o fanatismo, deve ser proscrito definitivamente. Pois só pensam em angariar novos adeptos para suas fileiras, sem pensar no Reino de Deus. O que nos cabe fazer, por ordem de Jesus, é cumprir a ordem: “Ide e ensinai a todas as nações” (Mt 28, 19). A resposta deve ser livre. A fé dos outros deve ser respeitada, sem os constranger, nem falar mal dos defeitos de sua religião. Esta também pode ser instrumentos de salvação. O momento da graça divina chegará. Não tenhamos medo. O que Jesus ensinou, e o episódio da adoração dos Magos já o antecipou, vai se cumprir. “Atrairei todos os homens a mim” (Jo 12, 32). A cena dos Magos chega a ser ecumênica e profética.