Renovai a face da Terra

    Domingo de Pentecostes! Domingo para que celebremos e contemplemos toda a inspiração e todo o mistério da ação do Espírito na vida da Igreja e em nossas vidas. Sabemos que na vida da Igreja muitas são as nossas ações: planos pastorais, reuniões, ministérios, organizamos pessoas, pastorais, movimentos. Mas o verdadeiro protagonista da ação da Igreja é o Espírito Santo. Somos sempre chamados a fazer a nossa parte, a nos prepararmos, nos organizarmos e elevar nosso potencial humano naquilo que fazemos para Deus. Mas a parte fundamental da nossa ação é confiar e deixar-se conduzir pelo Espírito, aquele que é a Alma da Igreja, como já nos recordava o papa Leão XIII.

    Depois de termos vivido dias intensos com a novena (ou semana) de preparação para a Festa de Pentecostes, a semana de oração pela unidade dos cristãos e ao final, a celebração da vigília com as várias leituras que são previstas pelo diretório, chegamos à celebração da grande solenidade, do grande segredo que faz com que a Igreja leve adiante a missão recebida por Jesus. Ele mesmo nos prometeu que nos daria o seu Espírito como defensor, como aquele que nos faria recordar todas as coisas e como aquele que faria da Igreja sinal visível da presença de Deus.

    Nunca podemos nos esquecer de que a Igreja é feita de homens e mulheres, com suas virtudes e suas fragilidades, suas alegrias e tristezas, suas vitórias e derrotas. Temos um número grande de homens e mulheres de Deus, que são canonizados, beatificados ou que ocultamente desenvolvem seu caminho de santidade. Seria interessante usarmos a imagem de uma floresta que cresce silenciosamente e que nem sempre é percebida. Assim é a ação da vida no Espírito na vida da Igreja: percebemos que é a sua ação que guia a vida da Igreja. Em meio a tantos contratemos que temos ao nosso redor, em meio aos contratempos que a Igreja tem de enfrentar, é sempre bom celebrarmos a certeza da presença do Espírito que conduz a nossa vida, que conduz a história da Igreja, que sempre foi conduzida por momentos difíceis de perseguição, de expulsão de países, de martírios. Quanto mais perseguida e martirizada, a Igreja se tornava firme e forte para poder proclamar que o Senhor está vivo e presente no meio de nós.

    A Liturgia de hoje vai nos recordar que:  Ninguém pode dizer «Jesus é o Senhor» a não ser pela ação do Espírito Santo (1 Cor. 12, 3). É exatamente isso que vamos constatar: por mais que façamos, nos reunamos e organizemos é a ação do Espírito que nos move interiormente para anunciar e que também faz com que as pessoas acolham esta mensagem. Mesmo quando os horizontes nos parecem turvos, escuros e difíceis, somos chamados a colocar toda nossa confiança na ação do Espírito e pedir que Ele esteja sempre em nossa mente e em nosso coração para que possamos trilhar o caminho de Deus e nos fazer lembrar que sempre após momentos de luta e difíceis, há momentos de grande fecundidade espiritual. Portanto, é dia de pedirmos Vem Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor! Enviai o Vosso Espírito e tudo será criado; e renovareis a face da terra! A terceira pessoa da Santíssima Trindade, o amor do Pai e do Filho um amor, o amor de Deus para conosco, que quer estar presente em nossa vida.

    A primeira leitura da festa (At 2, 1-11) apresenta a narrativa do evento de Pentecostes que era uma das três grandes festas judaicas, e que se celebra 50 dias após a Páscoa e muitos israelitas peregrinavam a Jerusalém para as celebrações. Sua origem era festejar o final da colheita dos cereais e dar graças a Deus por ela, junto com a oferta das primícias ao Senhor. Depois se acrescentou o motivo de comemorar a proclamação da Lei dada por Moisés no monte Sinai. O barulho do vento forte e as línguas de fogo evocam exatamente a manifestação de Deus no monte Sinai quando Deus, ao dar a Lei a Moisés, constitui Israel como seu povo. Agora, com as mesmas características se manifesta ao Novo Povo de Deus, a Igreja: o vento significa a novidade transcendente de sua ação na história dos homens (CIC 691); o fogo simboliza a energia transformadora dos atos do Espírito Santo (CIC 696).

    Os discípulos estavam reunidos e escutam um barulho que encheu com uma forte ventania todo o Cenáculo. Vieram as línguas de fogo que pousaram sobre cada um eles e todos ficaram cheios do Espírito Santo. Começaram a falar em outras línguas conforme o Espírito os inspirava. Os discípulos estavam reunidos, ainda amedrontados com os acontecimentos, receberam esse dom, o Fogo do Espírito em suas mentes e em seus corações e dali começaram a pregar. Diz a leitura que: Residiam em Jerusalém judeus piedosos, procedentes de todas as nações que há debaixo do céu. Ao ouvir aquele ruído, a multidão reuniu-se e ficou muito admirada, pois cada qual os ouvia falar na sua própria língua (At 2, 5-6). A ação do Espírito faz com que eles saiam e falem a universalidade das línguas, exatamente o contrário do que havia sido realizado em Babel, onde há a confusão pela diversidade das línguas que confunde os que tentaram construir uma torre para chegar aos céus. Pentecostes sara a ferida deixada pelo evento de Babel. Traz o milagre da unidade onde todas as línguas são compreendidas. A presença do Espírito nos faz falar a língua da unidade, da comunhão entre nós. Pentecostes significa o começo da caminhada da Igreja: animada pelo Espírito Santo, constitui o novo povo de Deus que começa a proclamar o Evangelho a todas as nações e a convocar a todos os que são chamados por Deus. Atônitos e maravilhados, diziam: “Não são todos galileus os que estão falando? Então, como é que nós os escutamos em nossa própria língua? Partos, medos, elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judeia e da Capadócia, do Ponto e da Ásia, da Frígia e da Panfília, do Egito e das regiões da Líbia, vizinha de Cirene, colonos de Roma, tanto judeus como prosélitos, cretenses e árabes, ouvimos proclamar nas nossas línguas as maravilhas de Deus” (At, 2, 8-11). O mistério da Universalidade da Salvação. O Espírito vem para que possamos falar à universalidade dos corações nos concedendo o dom de falar a linguagem do amor. Esse amor manifesto em nossas vidas faz com que o comuniquemos aos nossos irmãos e irmãs. Essa palavra é uma palavra que nos impulsiona a estarmos abertos à ação do Espírito, a deixar que ele nos restaure interiormente e nos leve a comunicar as maravilhas do evangelho a todos os homens, mesmo com as perseguições e dificuldades que temos de enfrentar. Contudo, foi no dia de Pentecostes, em que desceu sobre os discípulos para ficar para sempre com eles, que a Igreja foi publicamente manifestada diante duma grande multidão, que a difusão do Evangelho entre os gentios por meio da pregação. Teve o seu início, e que, finalmente, a união dos povos numa catolicidade de fé foi esboçada de antemão na Igreja da nova Aliança, a qual fala em todas as línguas e entende e abraça todas as línguas na sua caridade, superando assim a dispersão de Babel. (Concílio vaticano II, Ad Gentes 4).

    O Evangelho (Jo 20, 19-23) mostra o momento após a ressurreição onde Jesus sopra sobre os discípulos o dom do Espírito. No próprio dia da Ressurreição, Jesus aparece aos seus para lhes comunicar a sua paz e o dom do Espírito para tirar os pecados do mundo, ou seja, para que eles continuem sua obra salvadora. “Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: ‘Recebei o Espírito Santo: aqueles a quem perdoardes os pecados lhes serão perdoados; e aqueles a quem os retiverdes serão retidos (At 20, 22). Dias antes de retornar aos céus, Cristo envia os apóstolos com o mesmo poder com que o Pai o havia enviado. Deu-lhes o mandato de espalhar por todo o mundo a boa nova da salvação. Os apóstolos são enviados da mesma forma com que Ele foi enviado pelo Pai. Assim como o sopro de Deus fez do barro um ser vivente, o sopro do Ressuscitado faz da humanidade uma nova humanidade. Que possamos renovar o mundo por essa Ação do Espírito, que é uma ação de perdão e reconciliação.

    Na segunda leitura (1Cor 12, 3b-7.12-13) nos é recordado: Ninguém pode dizer «Jesus é o Senhor» a não ser pela ação do Espírito Santo (1 Cor 12, 3). A ação do Espírito é causa de unidade em meio a uma diversidade em que nos encontramos e que somos: há diversidade de dons espirituais, mas o Senhor é o mesmo. Há diversas operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. Em cada um se manifestam os dons do Espírito para o bem comum. Assim como o corpo é um só e tem muitos membros e todos os membros, apesar de numerosos, constituem um só corpo, assim também sucede com Cristo. Na verdade, todos nós – judeus e gregos, escravos e homens livres – fomos batizados num só Espírito, para constituirmos um só Corpo. E a todos nos foi dado beber um único Espírito (1 Cor 12, 12s).

    O princípio da unidade orgânica da Igreja é o Espírito Santo, que congrega os fiéis em uma sociedade e além disso penetra e vivifica os membros realizando a mesma ação que a alma realiza no corpo físico. Como nos recorda a Lumen Gentium: “para que nos renovássemos incessantemente nele, o senhor nos concedeu participar do seu Espírito, que sendo um só na cabeça e nos membros, de tal forma vivifica todo o corpo, o move e une, que sua ação pode ser comparada pelos Padres da Igreja com a função que exerce a alma no corpo humano” (Lumen Gentium 7). Essa comunhão e essa unidade, dons de Deus, é o que continua a fazer com que a Igreja seja sinal vivo de sua ação no mundo e em meio ao nosso tempo. Mais do que nossos planejamentos e trabalhos, devemos estar abertos à ação do Espírito em nós.

    Como nos recorda ainda a Lumen Gentium, “ O mesmo Espírito Santo não somente santifica e dirige o Povo de Deus pelos sacramentos e pelos ministérios e o enriquece com as suas virtudes, mas distribui seus dons a cada um segundo lhe apraz (1Cor 12,11), reparte entre os fiéis de qualquer condição inclusive graças especiais com que os dispõe e prepara para realizar uma variedade de obras e de ofícios proveitosos para a renovação e para a edificação da Igreja segundo aquelas palavras: “A cada um é dada a manifestação do Espírito para o bem comum” (1Cor 12,7). Esses carismas, tanto os mais extraordinários como os mais simples e comuns, pelo fato de que são muito úteis às necessidades da Igreja, temos de recebe-los com agradecimento e consolo. Não devemos pedir temerariamente os dons extraordinários, nem devemos esperar com presunção os frutos dos trabalhos apostólicos” (Lumen Gentium 12).

    Confiamos na ação do Espírito Santo e caminhamos confiantes no Senhor. A nós, cristãos, nos corresponde anunciar nestes dias e a este mundo onde estamos e vivemos, a mensagem antiga e sempre nova do Evangelho:

    Vinde, ó santo Espírito,

    vinde, Amor ardente,

    acendei na terra

    vossa luz fulgente.

     

    Vinde, Pai dos pobres:

    na dor e aflições,

    vinde encher de gozo

    nossos corações.

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