Reconciliai-vos

    Na semana passada, aprofundamos reflexões sobre os “cenários da evangelização para o terceiro milênio” na Reunião Plenária do Pontifício Conselho dos Leigos, aqui em Roma, com o tema: “Encontrar Deus no coração da cidade”, trabalhando a missão nas grandes cidades e regiões metropolitanas. Escutamos várias palestras e testemunhos e pudemos intervir para colaborar. Nestes dias, estamos no Consistório no qual o Papa Francisco cria novos cardeais e discute assuntos da organização da Igreja com o Colégio Cardinalício.
    Estamos nos aproximando da Quaresma e da Campanha da Fraternidade, quando seremos convidados a um tempo de conversão profunda. Neste Sexto Domingo do Tempo Comum, acredito que temos uma palavra para essa evangelização. São tantos feridos pelo caminho que nós, igreja, encontramos e que somos chamados a nos aproximar, como fez Jesus no Evangelho. Ele nos diz que “Um leproso chegou perto de Jesus”. No tempo de Cristo, toda doença na pele que oferecesse perigo de contágio era considerada um tipo de lepra; tornava a pessoa impura. Na primeira leitura ouvimos: “O homem atingido por esse mal andará com as vestes rasgadas, os cabelos em desordem e a barba coberta, gritando: ‘Impuro! Impuro’! Durante todo o tempo em que estiver leproso será impuro; e, sendo impuro, deve ficar isolado e morar fora do acampamento”. Eis! É alguém assim que se aproxima de Jesus: ferido, excluído do convívio da Assembleia de Israel, colocado fora da Cidade, um morto-vivo… Um leproso não podia tocar as pessoas: elas se tornariam impuras como ele; um leproso não convivia com sua família, não podia entrar na Casa do Senhor para rezar com seus irmãos: era um ninguém: “Impuro! Impuro”! – ele gritava, com a barba coberta em sinal de luto e profunda tristeza.
    O Evangelho (Mc1,40-45) narra a cena de um leproso que, ao encontrar-se com Jesus, ficou curado. A Lei de Moisés prescrevia o seguinte: “O leproso deve ficar isolado e morar fora do acampamento” (Lv 13, 46). Um preceito duro, que só se explica pela preocupação de evitar o contágio e pela ideia corrente entre os hebreus de que era um castigo de Deus aos pecadores.
    Aquele homem, abandonado pelos homens e tido como rejeitado por Deus, demonstra sua fé! A fé autêntica não se perde em raciocínios sutis; tem uma lógica muito simples: Deus pode fazer tudo e basta, pois que o queira fazer. Ao pedido, que manifesta uma confiança ilimitada, Jesus responde com um gesto inaudito para um povo a quem fora proibido qualquer contato com os leprosos: “estendeu a mão, tocou-o”. Deus é o Senhor da Lei e demonstra um outro gesto: o da proximidade!
    A cena do leproso que vai ao encontro de Jesus é tão marcante que a encontramos narrada em três Evangelistas, que contam o episódio e transmitem-nos o gesto surpreendente do Senhor: “Estendeu a mão e o tocou”. Até aquele momento, todos os homens haviam fugido dele com medo e repugnância. Cristo, porém, que podia tê-lo curado à distância – como já o fizera em outras ocasiões –, não só não se afasta dele, como chega a tocar a sua lepra. Não é difícil imaginar a ternura de Cristo e a gratidão do doente quando viu o gesto do Senhor e ouviu as suas palavras: “Quero, sê limpo”.
    Os Santos Padres da Igreja viram na lepra a imagem do pecado. Porém, o pecado é incomparavelmente pior do que a lepra. Dizia o Cura d’Ars: “Se tivéssemos fé e víssemos uma alma em estado de pecado mortal, morreríamos de terror”. No entanto, uma realidade não podemos esquecer: Jesus é o único que nos pode curar. Só Ele!
    O que Ele nos diz é que veio perdoar, redimir, veio livrar-nos dessa lepra da alma, que é o pecado. E proclama o seu perdão como um sinal de onipotência, como sinal de um poder que só o próprio Deus pode exercer. Cada uma das nossas confissões é expressão do poder e da misericórdia de Deus. É o próprio Jesus quem, no Sacramento da Penitência, pronuncia a palavra autorizada e paterna: “Os teus pecados te são perdoados”.
    Um grande mal da nossa época, uma grande ilusão é achar que não temos pecado, pensar que somos maduros e integrados. Não somos capazes de reconhecer nossas lepras, somos incapazes de suplicar, de joelhos: “Senhor, se queres, podes curar-me”! E por que isso? Porque somos autossuficientes: olhamo-nos, examinamo-nos não à luz do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, mas à luz de nós mesmos. Pensamos que somos senhores do bem e do mal, do certo e do errado! É tão comum vivermos de modo contrário à vontade do Senhor e ainda, cheios de orgulho e soberba, dizermos que estamos certos… É tão comum querermos moldar Jesus e a sua Palavra à nossa vontade… É tão frequente a ilusão de que podemos jogar na lata do lixo o ensinamento da Igreja, sobretudo no campo moral… E assim, vamos construindo nossa vida ao nosso modo, modo de pecado, modo de lepra, modo de doença: doença da descrença, da indiferença, da falta de fé!
    É necessário anunciar ao povo da grande cidade que seus males são curados por Aquele que não tem medo de se aproximar de ninguém. Que também exerçamos a nossa missão de serviço (Eu vim para servir) para os nossos irmãos.
    Peçamos, pois, Senhor, cura-nos! Senhor, somos leprosos, somos pecadores, nossos pecados mancham não a nossa pele, mas o nosso coração, o mais profundo da nossa alma! Senhor, de joelhos, como o leproso do Evangelho, te suplicamos: cura-nos e seremos curados! Dá-nos a graça de reconhecermos nossos pecados; reconhecendo-os, dá-nos a coragem e sinceridade de confessá-los; confessando-os, dá-nos a graça de experimentar teu perdão, de cumprir generosamente a penitência e de procurarmos, com responsabilidade, emendar a nossa vida! Tem piedade de nós, ó Autor da graça e Doador do perdão! A ti, a glória para sempre! Amém!