Quinta Catequese Quaresmal

    Alegria do Senhor é a nossa força.

    Caríssimos irmãos e irmãs,

    Quaresma é um tempo especial: preparamos a festa da Páscoa e somos convidados a limpar “nossa casa”. Percorremos estes dias da quaresma rumo a Páscoa, com coragem de fé, nos transfigurando dia a dia por meio de uma real e verdadeira conversão de coração, hoje chegamos a ao domingo da alegria – domingo Laetare, “dia das rosas em Roma” –, pois vemos o Deus do amor gratuito e incondicional que nos ama de modo fiel e eterno, por isso confia em nós e nos espera para nos acolher com o abraço da misericórdia amorosa e terna de Deus. Eis o porquê podemos dizer que a penitência nos leva a alegria!
    Chegamos a este momento da quaresma depois de vivermos nestes dias as “24 horas para o Senhor” como tempo propício para conversão e celebração da reconciliação. Os paramentos róseo nos convida a celebramos na esperança a alegria do Senhor que nos reconcilia e nos convida a viver uma nova vida.
    No Batismo recebemos o abraço do Pai, saímos das trevas para a luz, o mesmo acontece no Sacramento da Confissão. Por isso, hoje, a abertura da fé ao encontro renovador com Cristo é como deixar-se abraçar pelo Pai que nos acolhe e nos dá com alegria, novamente, a dignidade de filhos e filhas de Deus.
    Neste quarto Domingo da Quaresma vemos na 1ª Leitura (Jos 5,9a.10-12) que recorda a chegada ao povo de Deus e a celebração pascal, quando começaram a comer os frutos da terra prometida. O grande anúncio é claro: “hoje tirei de cima de vós o opróbrio do Egito”. Eis os frutos da conversão, na vida nova de liberdade e paz. Cada um de nós, fiéis cristãos, como o Povo de Deus precisamos passar da escravidão e do deserto a libertação e a vida nova. Assim poderemos saborear e ver “quão suave é o Senhor” (cf. Sl 33[34]).
    Na 2ª Leitura (2Cor 5,17-21) vemos a oferta de amor que Deus nos faz por meio de Jesus. Aqui temos a reconciliação como chave de leitura. Somos chamados a aceitar a proposta de reconciliação que o próprio Deus nos faz, mesmo infiéis, Deus continua fiel. É em Jesus, nosso Irmão Maior, que nos reconciliamos com Deus, por isso mesmo que esta comunhão só existira quando reconciliarmos com os outros irmãos e irmãs. É o grito da Igreja a todos nós neste tempo: “deixai-vos reconciliar com Deus”. “O mundo velho despareceu e tudo agora é novo”. Eis a nossa direção!
    Porém, nós ainda peregrinamos para Jerusalém, mas caminhamos com Jesus e hoje Ele vem nos dizer no Evangelho sobre a misericórdia, de modo especial (Lc 15, 1-3.11-32). Vemos um Deus de amor e bondade que quer estender os braços até nós, não por que mereçamos, mas porque Ele nos ama profundamente mesmo. Eis a parábola do “Pai misericordioso”, que traz também figuras que sempre devemos nos colocar, seja como filho mais novo que sai de casa, ou como o filho mais velho e refletir a figura central do Pai. Anel e sandálias são cenas que nos recordam autoridade  e o ser do homem livre.
    No filho mais novo vemos a ingratidão, o orgulho, a autossuficiência, a irresponsabilidade, vemos o que temos hoje, pessoas que tentam se preencher, mas se encontram inteiramente vazias. As grandes cidades, cidades que não dormem, mas que não preenchem o repouso de muitos. Estamos cercados de muitos, mas estamos verdadeiramente no deserto, sem nada e, às vezes, sem a água viva que nos dá força e animo de continuar a caminhar.
    Já o filho mais velho, aquele que “parecia” todo correto, segue uma lógica que não é a de Deus, mas da simples justiça. Falta a misericórdia no seu coração, misericórdia que poderia fazer ele também participar da volta do irmão, mas ele chega a dizer ao Pai “que este teu filho”, recorda a atitude de Caim que responde a Deus: “sou eu, por acaso, guarda do meu irmão?” (Gn 4,9b).
    O Pai, porém, não exclui ninguém, mas abraça a todos, abraça o filho que retorna, vai até o filho que não entra em casa, mas é de casa. O Pai misericordioso ama a todos. Eis o Pai das misericórdias que vai contra toda lógica humana, pois tem uma lógica maior ainda. Eis a alegria do Pai, de reencontrar, acolher e reintegrar a grande família aqueles que se foram, mesmo aqueles que estão dentro, mas não plenamente aceitam o outro (e se julga melhor que o outro): Ele vai até eles e os convida, porém o Evangelho não diz se o filho entrou ou não, mas sabemos o quanto este Pai tenta ainda hoje fazer você e eu entrar nesta festa dos reconciliados. O Pai ama de forma transbordante, por isso vai além do que é justo, para chegar a justiça de Deus. O Pai misericordioso e paciente que espera com esperança cada um de nós.
    «Péguy dizia da parábola do filho pródigo: “Aquele que a ouve pela centésima vez, é como se a ouvisse pela primeira vez”. Conhecemo-la de cor… É preciso parar longamente, saboreá-la ainda e sempre. Podemos hoje pensar na seguinte frase: “Bem desejava ele matar a fome com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava”. Parece que não diz nada de importante. Mas pode ser a frase-chave da parábola. A verdadeira miséria do filho mais novo é de não ter ninguém que esteja atento a ele, que o olhe. Para os seres humanos, o olhar é vital. Quando o olhar não é transparente, acontecem desvios, recusa do amor, os seres humanos torna-se inimigos em vez de serem irmãos e irmãs, acontece desconfiança, inveja, indiferença. O filho mais novo morre da falta de um olhar de amor, sente fome de amor. Jesus quer mudar esta situação, renovando relações em que o amor possa circular de novo. Jesus lança o seu olhar de amor sobre nós, sobre cada um de nós. Um olhar que é fonte de vida! Um olhar do qual não podemos fugir!» .
    A volta a casa sempre é momento de alegria, mesmo quando viajamos, bom da viagem é quando voltamos a casa, onde podemos repousar dos cansaços da caminhada. Eis o que o filho mais novo quis quando estava nos porcos, voltar a casa e mesmo ser um empregado, pois estaria perto do que foi sua casa. Quantos de nós também queremos voltar a casa, a ter uma casa, a partilhar e a viver com a família, o sentir-se amado. Quem mora na rua, não mora por morar, sempre há uma história de dor, de exclusão, de incompreensão, de carência, de vazio. Precisamos reconciliar também aqui estas pessoas. Reconciliar a quantos que enveredam no mundo da droga e do álcool, porque se sentiam vazias, e agora estão num abismo cada vez maior. Viver a liturgia significa fazer a missa continuar a cada instante no espaço de nossas vidas. Pois, se a Liturgia nos exorta para que como pecadores temos ainda como voltar a alegria que Deus nos prepara e não só depois da morte, mas no já. O pecado traz sequelas terríveis, pois é o maior vicio que nos deixa escravos e não conseguimos ver saída, desde que caiamos em nós mesmos e tomemos a decisão de mudar as coisas de forma radical, com a força do Espírito Santo.
    Que cada um de nós descubra neste domingo e nesta semana o Deus rico de misericórdia que não se cansa de perdoar e de nos querer de volta. Ele é paciente e está sempre à espera, para acolher e abraçar os filhos e filhas que decidem voltar, dando força e ânimo para continuarem a caminhada.
    Recordo o que o Papa Bento XVI dizia em 2007:
    «Estamos no quarto Domingo de Quaresma, chamada em latim Domingo «in Laetare», isto é, «Alegra-te» da primeira palavra da antífona da entrada na liturgia da Missa. Hoje a liturgia convida-nos a alegrar-nos porque se aproxima a Páscoa, o dia da vitória de Cristo sobre o pecado e sobre a morte. Mas onde se encontra a fonte da alegria cristã a não ser na Eucaristia, que Cristo nos deixou como Alimento espiritual, enquanto somos peregrinos nesta terra? A Eucaristia alimenta nos crentes de todas as épocas aquela alegria profunda, que forma um todo com o amor e com a paz, e que tem origem na comunhão com Deus e com os irmãos. […] Na Eucaristia Cristo quis doar-nos o seu amor, que o levou a oferecer na cruz a vida por nós. Na última Ceia, lavando os pés dos discípulos, Jesus deixou-nos o mandamento do amor:  «Assim como Eu vos amei, vós também vos deveis amar uns aos outros» (Jo 13, 34). Mas isto só é possível se permanecermos unidos a Ele, como os ramos à videira (cf. Jo 15, 1-8), ele mesmo escolheu permanecer entre nós na Eucaristia para que pudéssemos permanecer com Ele. Portanto, quando nos alimentamos com fé do seu Corpo e do seu Sangue, o seu amor vem a nós e torna-nos capazes por nossa vez de dar a vida pelos fiéis (cf. 1 Jo 3, 16) e não de a termos para nós mesmos. Daqui brota a alegria cristã, a alegria de amar e de ser amados. […]».
    A certeza do amor de Deus nos enche de consolação e afasta de nós qualquer atitude de desesperança e de tristeza. Apesar de nossas contínuas infidelidades, Deus, misericordioso e sempre fiel à sua aliança, procuramos incansavelmente, chamando-nos à obediência filial e à reconciliação. Que Deus nos ajude e nos ilumine a percebermos os sinais de amor presente na vida quotidiana, porque da morte gloriosa de Cristo nasceu a vida plena.
    Pai Misericordioso, Pai Amado, Pai Santo, que conheceis os segredos dos corações, escutai esta nossa prece: não permitais que nos domine o poder das trevas, mas abri os nossos olhos e corações à luz do Espírito Santo, a fim de que amemos o Cristo com renovado impulso, reconhecendo-o presente nos nossos irmãos e irmãs, reconciliando-nos com todos para que mudemos sempre o nosso coração, inspirados nas iniciativas do perdão e de paz, para sermos a verdadeira família de Deus.

    Is 66, 10-11
    ANTÍFONA DE ENTRADA: Alegra-te, Jerusalém; rejubilai, todos os seus amigos. Exultai de alegria, todos vós que participastes no seu luto e podereis beber e saciar-vos na abundância das suas consolações

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