Dom Mário Antônio, bispo da diocese de Roraima, segundo vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e presidente eleito da Cáritas Brasileira fala nesta entrevista sobre sua trajetória de aproximação com a Cáritas e sobre o novo ciclo de gestão da instituição. A entrevista aconteceu na sede da CNBB, em Brasília, após o primeiro encontro com a equipe do Secretariado Nacional da Cáritas Brasileira e primeira reunião com a diretoria que inicia o mandato em 1º de janeiro de 2020.
Dom Mário, como se deu a aproximação do senhor com a missão Cáritas Brasileira?
Cheguei em Manaus como bispo auxiliar em setembro de 2010 e foi a partir dessa época que me aproximei mais com a organização Cáritas Arquidiocesana, também conhecendo um pouco mais do que é a instituição no Brasil. Foi por circunstância do meu ministério episcopal, é claro que antes ouvia muito sobre a Cáritas, mas não acompanhava de perto nenhuma organização Cáritas. Comecei realmente a conhecer os trabalhos e a participar de algumas atividades desde 2010, quando comecei meu trabalho na Amazônia na Arquidiocese de Manaus.
Depois, quando eu cheguei a Roraima já existia um trabalho de articulação tanto do Regional Norte 1 quanto da própria Diocese para institucionalizar uma Cáritas Diocesana. E aconteceu que há um ano e meio fizemos realmente os trâmites, com acompanhamento da Cáritas Brasileira, para a criação da Cáritas Diocesana de Roraima. Tanto que na 24ª Assembleia Nacional realizada em Teresina, a nossa Cáritas Diocesana foi acolhida, de maneira oficial, como entidade-membro da Cáritas Brasileira. Chegar em Roraima foi ampliar um pouco mais essa proximidade e esse compromisso com a rede Cáritas no Brasil.
A Cáritas tem 63 anos de história no Brasil, como o senhor vê essa trajetória que tem em sua origem nomes como Dom Helder Câmara?
Desde o início a Cáritas tem um testemunho muito forte daquilo que nos pede Jesus: “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. A Cáritas é uma interpelação, não apenas para um trabalho, mas para um compromisso pessoal de viver a caridade. Em outras palavras, a Cáritas deve sempre ser uma página viva do Evangelho. De tal maneira, muito terna, muito amorosa com as pessoas mais ameaçadas, com os mais sofredores, à luz do Reino de Deus, como nos fala Jesus, com os mais pobres. E eu penso que a história da Cáritas no Brasil, bem como em todo mundo é uma história de compromisso com os mais pobres, uma história de profetismo, à luz do que precisa ser anunciado e denunciado. Então, é uma história que nos interpela e que nos compromete com a vida do nosso povo.
Está na identidade da Cáritas defender valores essenciais como os direitos humanos e a justiça social. Como a rede Cáritas tem se articulado para concretizar essa missão em tempos tão desafiadores?
A Rede Cáritas deve ser imbuída de uma atitude de prudência e coragem, porque os desafios são enormes e as situações nem sempre são favoráveis. Então, por isso, eu vejo que ser Cáritas hoje é tornar-se uma pessoa corajosa diante de tantos perigos e de tantas ameaças. Mas eu penso que é aquilo que nos ensina o próprio Jesus Cristo, a história da Cáritas, seja no Brasil ou em nossas regiões, é sempre de nos encorajar porque Deus nos ilumina e Deus cuida da vida e da felicidade daqueles que lutam pela justiça.
A rede Cáritas acabou de realizar a sua 24ª Assembleia e inicia um novo ciclo de gestão. O que o senhor já pode dizer a respeito das prioridades, ou dos princípios que vão orientar essa nova gestão?
Primeiramente, como nova diretoria, agradeço a confiança de ser escolhido para ser o presidente da Cáritas Brasileira. A nossa primeira preocupação, digamos assim, é nos apropriar da caminhada da Cáritas para dar continuidade. O que vem sendo frutuoso merece, da nossa parte, extremo cuidado e dedicação para que continue frutificando. E é claro que na caminhada os desafios e as conquistas vão nos apontando, também, necessárias mudanças. Mudança provoca mudança. Ainda não sei indicar quais serão, mas penso que o caminhar, talvez desses primeiros seis meses, já vão nos fazer perceber, juntamente com o Secretariado Nacional, com as Cáritas regionais, diocesanas e paroquiais, aquilo que deve ter continuidade e também renovação em todo trabalho, em toda Rede para que continue produzindo frutos na caridade para a vida de todas as pessoas, não só para aqueles que têm simpatia ou proximidade com a Cáritas, mas a todos aqueles que têm necessidade de uma vida mais digna e de ser envolvido por aquilo que é específico da Cáritas: a sua missão.
A sustentabilidade é sempre um grande desafio para organizações como a Cáritas. Como a nova gestão pensa esse caminho?
A sustentabilidade é sempre, realmente como você diz, preocupação em todas as organizações. Ainda não nos debruçamos sobre essa questão, tendo em vista que ainda estamos fazendo alguns levantamentos, ouvindo o que tem já de previsão orçamentária para o próximo ano e aquilo que está no balanço, ao final dessa gestão. Claro, vamos acolher e considerar o que vier até nós e fazer o possível para ajustar o que for necessário para que a questão da sustentabilidade não nos deixe a mercê de não realizar os trabalhos mais necessários e daqueles projetos que estão em andamento.
Queremos ter um olhar sensível e bastante real das possibilidades de continuidade ou não de algumas coisas. Mas priorizando aquilo que o ser humano tem necessidade e que for do alcance da Rede Cáritas, agradecendo e buscando apoio daqueles que sempre colaboraram para que as atividades não parassem e fizessem o bem àqueles que mais precisam.
Há um grande número de pessoas que fazem a missão da Cáritas acontecer, nesse quadro há profissionais remunerados e também voluntários, o que o senhor diria pra essas pessoas, agora como presidente eleito da instituição?
A primeira palavra é gratidão, seja aos profissionais ou aos voluntários, gratidão pela dedicação. E, ao mesmo tempo, gratidão por tudo aquilo que investem na Rede Cáritas. E eu sei que tem muitos profissionais e voluntários, que investem o seu tempo, suas habilidades, suas capacidades, até mesmo investem suas economias para que o trabalho saia da melhor forma possível. Agradeço porque tenho certeza que tal esforço, tal dedicação, às vezes até renúncia de algo, não ficará sem recompensa e sem benefício pessoal e até mesmo familiar e comunitário. Ao mesmo tempo digo, que caminhem conosco com esperança, com confiança, continue nos ajudando e colaborando porque eu vejo que ninguém deve se isolar.
Nenhum trabalho será exitoso no isolamento, mas sim na cooperação e no exercício das funções de maneira fraterna, humana, reconhecendo limites e funções e ao mesmo tempo sabendo que podemos fazer sempre algo mais. Sempre tenho dito ultimamente que quando a gente quer ir rápido, a gente vai sozinho. Mas quando a gente quer ir longe, quer fazer um trabalho mais amplo e realmente beneficiando mais e mais pessoas, a gente vai junto e faz junto.
Esse momento é de gratidão, de esperança, na união de todos os esforços, sobretudo, com quem é profissional, quem é voluntário na Rede Cáritas e aqueles também que, não apenas admiram, não apenas são simpatizantes, mas são colaboradores e incentivadores de que o trabalho continue e seja sempre fonte de benefício para todas as pessoas. Sem nenhum “ensimesmamento”, sem nenhum individualismo, mas com muita gratuidade e altruísmo.
Por Jucelene Rocha
Comunicação Cáritas Brasileira