Papa Francisco no encontro com vítimas de violência na RDCongo
Jane Nogara – Vatican News
No segundo dia da viagem do Papa Francisco à RDCongo, o Papa encontrou na Nunciatura Apostólica de Kinshasa, (01/02) as vítimas da violência no Leste do país. “O meu coração está hoje no leste deste imenso país, que não terá paz enquanto esta não for alcançada lá, na sua parte oriental”. Assim iniciou seu discurso aos habitantes do Leste da RDCongo esclarecendo em seguida:
Amados por Deus
O Papa disse ainda que enquanto os violentos “vos tratam como objetos, o Pai que está nos Céus vê a vossa dignidade e diz a cada um de vós: ‘És precioso aos meus olhos, estimo-te e amo-te’ (Is 43, 4). Irmãos e irmãs, a Igreja está e estará sempre da vossa parte. Deus ama-vos e não Se esqueceu de vós; oxalá se recordem de vós também os homens!”.
Condenação e perdão
“Em nome d’Ele e juntamente com as vítimas e quantos se empenham pela paz, a justiça e a fraternidade”, exortou o Papa, “condeno as violências das armas, os massacres, os estupros, a destruição e ocupação de aldeias que continuam a ser perpetrados na República Democrática do Congo; e também a exploração sangrenta e ilegal da riqueza deste país, bem como as tentativas de dividi-lo para o poder controlar”. E Francisco apela ainda “Volto-me para o Pai que está nos Céus e nos quer ver a todos como irmãos e irmãs na terra, humildemente inclino a cabeça e, com a tristeza no coração, peço-Lhe perdão pela violência do homem sobre o homem”:
Os conflitos
Francisco explica que se trata de conflitos que obrigam milhões de pessoas a abandonar suas casas, provocam gravíssimas violações dos direitos humanos, desintegram o tecido socioeconómico, causam feridas difíceis de cicatrizar. São lutas de parte nas quais se entrelaçam dinâmicas étnicas, territoriais e de grupo; conflitos que têm a ver com a posse da terra, a ausência ou debilidade das instituições, ódios nos quais se infiltra, em nome dum falso deus, a blasfémia da violência. “Mas é, sobretudo, a guerra desencadeada por uma insaciável ganância de matérias-primas e de dinheiro, que alimenta uma economia de guerra que exige instabilidade e corrupção. Que escândalo, que hipocrisia: as pessoas são estupradas e assassinadas, enquanto os negócios que provocam violências e mortes continuam a prosperar!”. Prosseguindo com um apelo: “Dirijo um sentido apelo a todas as pessoas, a todas as entidades, internas e externas, responsáveis pela guerra na República Democrática do Congo, saqueando-a, flagelando-a e desestabilizando-a. Enriqueceis-vos mediante a exploração ilegal dos bens deste país e o sacrifício cruento de vítimas inocentes”.
Como promover a paz: não à violência, não à resignação
Em seguida o Papa reflete, mas o que fazer, por onde começar… para promover a paz? E sua proposta é de recomeçar com dois “nãos e dois “sins”.
Antes de mais nada, não à violência, sempre e em todo o caso, sem “se” nem “mas”. Amar o próprio povo não significa nutrir ódio contra os outros. Pelo contrário, “amar o próprio país significa recusar a envolver-se com quantos incitam ao uso da força”. “O ódio”explicou o Papa, “só gera mais ódio, e violência outra violência”. Devemos dizer um claro e forte ‘não’ a quem os propaga em nome de Deus.
Francisco continuou dizendo que para se dizer “verdadeiramente ‘não’ à violência, não basta evitar atos violentos; é preciso extirpar as raízes da violência: penso na ganância, na inveja e, sobretudo, no rancor”.
Há depois um segundo “não” que devemos dizer: “não à resignação. A paz pede para se combater o desânimo, o desalento e a desconfiança que nos levam a crer que é melhor suspeitar de todos, é melhor viver separados e afastados do que dar as mãos e caminhar juntos. Mais uma vez, em nome de Deus, renovo o convite a quantos vivem na República Democrática do Congo para que não desistam, mas se empenhem por construir um futuro melhor”. “Um futuro de paz não vai cair do céu, mas poderá chegar se se eliminarem dos corações o fatalismo resignado e o medo de se envolver com os outros. Um futuro diferente virá se for de todos e não de um, se for para todos e não contra alguém. Um futuro novo virá se o outro, seja ele tutsi ou hutu, deixar de ser um adversário ou um inimigo, passando a ser um irmão e uma irmã em cujo coração (assim é preciso acreditar) existe, embora oculto, o mesmo desejo de paz. Também no leste, a paz é possível! Acreditemos nisto e trabalhemos sem delegar para outro a mudança!
Os dois “sins”: sim à reconciliação e à esperança
“E eis-nos, finalmente, aos dois ‘sins’ pela paz. Em primeiro lugar, sim à reconciliação. Amigos, é maravilhoso aquilo que estais prestes a fazer. Quereis assumir o compromisso de vos perdoardes mutuamente e de repudiardes as guerras e os conflitos para solucionar as distâncias e as diferenças”.
“O último ‘sim’, decisivo: sim à esperança. Se é possível representar a reconciliação como uma árvore, como uma palmeira que dá fruto, a esperança é a água que a torna mimosa. Esta esperança tem uma fonte, e esta fonte tem um nome, que quero proclamar aqui juntamente convosco: Jesus! Jesus: com Ele, o mal já não tem a última palavra sobre a vida; com Ele, que, dum túmulo – estação final do trajeto humano – fez o início duma nova história, abrem-se sempre novas possibilidades”.
Por fim o Papa quis motivar mais uma vez com a esperança:
“Irmãos, irmãs do Leste do país, esta esperança é para vós; tendes direito a ela. Mas é um direito que também deve ser conquistado. Como? Semeando-a cada dia, com paciência. Volto à imagem da palmeira. Diz um provérbio: ‘Quando comes a tâmara, vês a palmeira, mas quem a plantou, há muito tempo que voltou à terra’. Por outras palavras, para se obter os frutos esperados, é preciso trabalhar com o mesmo espírito dos plantadores de palmeiras, pensando nas gerações futuras e não nos resultados imediatos. Semear o bem faz-nos bem: liberta da lógica estreita do ganho pessoal e dá de prenda a cada dia o seu porquê; traz à vida o respiro da gratuidade e torna-nos mais semelhantes a Deus, semeador paciente que irradia esperança sem nunca Se cansar”.