Papa: Cúria fechada em si mesma está condenada à destruição

Nas felicitações natalinas, Francisco fez um longo discurso sobre o trabalho dos membros da Cúria Romana. Ele comparou os complôs a um câncer e enalteceu a missão da diplomacia vaticana.

Bianca Fraccalvieri – Cidade do Vaticano

A quinta-feira do Papa Francisco foi dedicada às felicitações de Natal, seja para seus colaboradores da Cúria, seja para os familiares dos funcionários da Cidade do Estado Vaticano.

Diferentemente dos anos anteriores, aos membros da Cúria o Papa propôs uma reflexão “ad extra”, isto é, não sobre questões internas, mas sobre as relações da Cúria com as nações, as Igrejas particulares, as Igrejas orientais e com representantes de outras religiões.

Num longo e articulado discurso, Francisco explicou que suas reflexões se baseiam nos princípios basilares e canônicos da Cúria, mas também sobre a sua visão pessoal no contexto da atual reforma em andamento.

Falando da reforma, brincou o Papa, “me vem à mente a simpática e significativa expressão de Dom Frédéric-François-Xavier De Mérode: ‘Fazer reformas em Roma é como limpar a Esfinge do Egito com uma escova de dentes’. Isso evidencia quanta paciência, dedicação e delicadeza são necessárias para alcançar este objetivo”.

A universalidade do serviço da Cúria, explicou o Pontífice, provém e brota da catolicidade do Ministério petrino. Por isso, uma Cúria fechada em si mesma trairia a finalidade da sua existência e cairia na autorreferencialidade, condenando-se à autodestruição.

Por sua própria natureza, a Cúria é projetada ad extra , enquanto e porque ligada ao Ministério petrino, ao serviço da Palavra e do anúncio da Boa Nova.  Sobre esta finalidade de serviço, a reflexão do Santo Padre foi inspirada na expressão de um “primado diaconal”, que antes de mais nada é a expressão da firme vontade de imitar Cristo, o qual assumiu a forma de servo.

“ Isso é muito importante para superar aquela desequilibrada e degenerada lógica dos complôs e dos pequenos círculos que, na realidade, representam um câncer que leva à autorreferencialidade, que se infiltra também nos organismos eclesiásticos e, em especial, nas pessoas que ali atuam. Quando isso acontece, porém, se perde a alegria do Evangelho, a alegria de comunicar Cristo e de estar em comunhão com Ele; se perde a generosidade da nossa consagração. ”

Francisco apontou ainda para outro perigo, isto é, o dos traidores de confiança ou dos aproveitadores da maternidade da Igreja.

“Ou seja, as pessoas que são selecionadas cuidadosamente para dar maior vigor ao corpo e à reforma, mas se deixam corromper pela ambição ou pela vanglória e, quando são delicadamente afastadas, se autodeclaram erroneamente mártires do sistema, do ‘Papa não informado’, da ‘velha guarda’…, ao invés de fazerem o ‘mea culpa’”. Ao lado dessas pessoas, existem outras que ainda atuam na Cúria às quais se dá todo o tempo para retomarem a justa via, na esperança de que encontrem na paciência da Igreja uma oportunidade para se converterem e não para se aproveitarem.”

Esta crítica de Francisco, todavia, foi acompanhada pelo agradecimento à maioria dos funcionários que, ao invés, trabalham com “empenho, fidelidade, competência, dedicação e muita santidade”.

A Cúria e as Nações

Entre os inúmeros campos de atuação da Cúria, o Papa falou em especial da relação com as países. A diplomacia vaticana, afirmou, é a busca sincera e constante por tornar a Santa Sé um construtor de pontes, de paz e de diálogo entre as nações. “O único interesse da diplomacia vaticana é ser livre de qualquer interesse mundano ou material.”

Francisco falou da importância para a Santa Sé de reiterar sempre a preservação da nossa casa comum de todo egoísmo destrutivo; para afirmar que as guerras trazem somente morte e destruição; para aprender do passado os ensinamentos que nos ajudam a viver melhor o presente, a construir solidamente o futuro e a preservá-lo para as novas gerações.

A Cúria e as Igrejas particulares

Sobre a relação de “primária importância” entre a Cúria e as Dioceses de todo o mundo, o Papa citou as visitas ad limina Apostolorum dos bispos, como um momento de grande oportunidade de encontro, de diálogo e de recíproco enriquecimento. Mencionou ainda o tema do Sínodo dos Bispos do próximo ano, dedicado aos jovens.

A Cúria e as Igrejas Orientais

Já a unidade e a comunhão que dominam a relação da Igreja de Roma e as Igrejas Orientais representam um concreto exemplo de riqueza na diversidade para toda a Igreja.

Na realidade, “a Igreja de Roma não seria realmente católica sem as inestimáveis riquezas das Igrejas Orientais e sem o testemunho heroico de tantos nossos irmãos e irmãs orientais que purificam a Igreja aceitando o martírio e o oferecendo a sua vida para não negar Cristo”.

A Cúria e as outras religiões

A relação da Cúria Romana com as outras religiões se baseia no ensinamento do Concílio Vaticano II e sobre a necessidade de diálogo, reiterou o Papa.

Francisco recordou que o diálogo é contruído sobre três orientações fundamentais: o dever de identidade, a coragem da alteridade e a sinceridade das intenções.

O Pontífice concluiu seu discurso evidenciando que “o Natal nos recorda que uma fé que não nos coloca em crise, é uma fé em crise; uma fé que não nos interroga é uma fé sobre a qual devemos nos interrogar; uma fé que não nos anima, é uma fé que deve ser animada; uma fé que não nos sacode, é uma fé que deve sacudida. Na realidade, uma fé somente intelectual ou morna é somente uma proposta de fé, que pode se realizar quando envolve o coração, a alma, o espírito e todo o nosso ser”.

Que este Natal nos abra os olhos para abandonar o supérfluo, o falso, o malicioso, para ver o essencial, o verdadeiro, o bom e o autêntico.

“Com essas reflexões renovo minhas fervorosas felicitações natalinas!”, concluiu o Papa.

 

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Fonte: Rádio Vaticano

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