Alessandro Gisotti
“Na atual guerra na Ucrânia, estamos vendo a impotência da Organização das Nações Unidas.” As palavras do Papa Francisco na Audiência Geral, da última quarta-feira (06/04), foram amplamente ecoadas. Não menos relevantes, porém, são as palavras que precederam imediatamente esta afirmação. Na verdade, elas são a premissa da amarga observação: “Depois da Segunda Guerra Mundial, foi feita uma tentativa de lançar as bases para uma nova história de paz, mas infelizmente – não aprendemos – a velha história de grandes potências concorrentes continuou”. O Papa Francisco acredita firmemente no papel das Nações Unidas e no valor do multilateralismo. Uma convicção que hoje é ainda mais forte naquela “mudança de época” que estamos vivendo na árdua busca por um novo horizonte de convivência para a humanidade. Seguindo as pegadas de seus predecessores – e em particular de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI – Francisco multiplicou gestos e palavras em apoio às Nações Unidas, encorajando um processo de reforma que é exigido em particular por aqueles países, por aqueles povos, que mais sofrem as consequências dessa impotência a que o Papa se referiu.
Falando em 25 de setembro de 2015 na Assembleia Geral da ONU, o Pontífice afirmou que “a reforma e a adaptação aos tempos são sempre necessárias, progredindo para o objetivo final de conceder a todos os países, sem exceção, uma participação e um impacto real e justo nas decisões”. Desde os primeiros anos de seu pontificado, sublinhou, portanto, o tema da “necessidade de uma maior equidade”, especialmente “para os órgãos com capacidade executiva efetiva, como o Conselho de Segurança, organismos e grupos financeiros, grupos ou mecanismos especificamente criados para enfrentar as crises econômicas”. E concluiu seu discurso na sede da ONU reiterando a necessidade de fortalecimento da ONU. “A louvável construção jurídica internacional da Organização das Nações Unidas”, observou, “pode ser uma promessa de um futuro seguro e feliz para as gerações futuras. Será se os representantes dos Estados saberão deixar de lado os interesses setoriais e ideologias e buscar sinceramente o serviço do bem comum”. Conceitos reiterados em novembro do mesmo ano na visita à sede das Nações Unidas em Nairóbi.
Sobre o compromisso com o cuidado da Casa comum, a solução pacífica das controvérsias internacionais ou um desenvolvimento econômico centrado nas pessoas e povos, o Papa e a Santa Sé consideram a Organização das Nações Unidas o foro internacional mais adequado para encontrar um ponto de convergência entre diferentes instâncias e interesses. Em dezembro de 2019, numa mensagem de vídeo conjunta, o Papa e o secretário-geral da ONU, António Guterres, reafirmaram que “a confiança no diálogo entre as pessoas e entre as nações, no multilateralismo, no papel das organizações internacionais, na diplomacia como instrumento de entendimento e compreensão, é essencial para construir um mundo pacífico”. Poucos meses depois eclodiu a pandemia da Covid-19, tornando ainda mais imprescindível, se possível, investir no multilateralismo, na consciência de que estamos todos no mesmo barco da humanidade. “A pandemia – observou ele na mensagem de vídeo para o 75º aniversário da fundação da ONU, em 25 de setembro de 2020 – nos mostrou que não podemos viver um sem o outro, ou pior ainda, um contra o outro. A ONU foi criada para unir as nações, para aproximá-las, como uma ponte entre os povos”. E com palavras bem conectadas com o que foi dito na última quarta-feira, acrescentou que “o nosso mundo em conflito precisa que a ONU se torne um laboratório para a paz cada vez mais eficaz, o que exige que os membros do Conselho de Segurança, especialmente o Permanente, atuem com maior unidade e determinação”.
Significativamente, a reforma das Nações Unidas também encontra espaço na Encíclica Fratelli tutti. Francisco dedica um parágrafo inteiro ao assunto, 173. (João XXIII dedicado o parágrafo 75 da Pacem in Terris à ONU). Para o Papa, esta reforma é necessária “para que o conceito de família das nações possa ter uma real concretude”. É preciso garantir “o domínio indiscutível do direito e o recurso incansável à negociação, aos bons ofícios e à arbitragem”. Com um sentimento que também o levou a proferir as palavras de quarta-feira, adverte ainda que “devemos evitar que esta Organização seja deslegitimada, porque os seus problemas e deficiências podem ser enfrentados e resolvidos em conjunto”. As Nações Unidas, portanto, não existem, parece sugerir o Papa, se as nações não estão unidas, concordes em buscar corajosamente o caminho do entendimento. Que seja o fim de uma guerra, as patentes de vacinas ou o combate ao aquecimento global, todos devem estar dispostos a “perder” um pouco, para que todos possam ganhar juntos. Em jogo está o desafio mais importante: o futuro da humanidade.