O esposo da humanidade

    A criatura humana devia sempre pensar no projeto de Deus Pai a seu respeito, no sentido de perceber que a vida é vocação, é um chamado, e que implica em uma resposta generosa, a partir de uma insondável escuta interior. É imprescindível a busca de uma resposta generosa, dia após dia, como um apelo que vai dar-lhe sentido e iluminar toda a sua existência, consciente sempre de que o chamado é pessoal, onde Deus espera ouvir um “sim”. Foi assim que Deus chamou Abraão, a ponto de submetê-lo à prova, no que ele respondeu: “Aqui estou” (cf. Gn 22, 1).
    Sentimos que é necessário perceber sempre mais a força transformadora do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, no anúncio da palavra, com força e firmeza, sim, mas, acima de tudo, com gestos e sinais da própria vida, em uma criativa e alegre fidelidade, nas palavras do Papa Francisco (17.01.2016), em sua costumeira alocução precedida do Ângelus, falando de um Deus terno que desposou a humanidade: “O amor entre homem e mulher é uma boa estrada para viver o Evangelho, ou seja, para percorrer com alegria a via da santidade; o milagre do melhor vinho vai muito além do casamento, porque toda pessoa humana é chamada a encontrar o Senhor como Esposo de sua vida; a fé cristã é um dom que recebemos com o Batismo e que nos permite encontrar Deus”.
    De acordo com a mística do teólogo católico Karl Rahner (1904-1984), “o cristão do futuro, ou será místico ou não será nada”, entendido como apego à oração, à meditação e à contemplação da tradição católica, bem como à palavra do magistério, autenticamente interpretada para anunciar a boa-nova da Salvação a uma multidão de irmãos e irmãs, a partir da sua dor e sofrimento, na fidelidade à profecia de Ezequiel: “Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos, mas nunca tomam conta do rebanho” (cf. Ez 34, 1-2).
    Dom Helder jamais se afastou do assunto supramencionado, como pastor da paz e da ternura, na intimidade de enamorado de Deus, sentindo-se honrado quando seus inimigos o acusavam de utópico e sonhador, certamente levados por inveja, limitações e mediocridade, porque se aproximava do Cavaleiro Andante. O Artesão da Paz dizia-lhes: “Comparar-me a Dom Quixote está longe de ser uma nota depreciativa”. E acrescentava com voz profética: “Ai do mundo se não fosse a utopia, ai do mundo se não fossem os sonhadores”, asseverando ter pena dos “empobrecidos e sem abrigo, e mais pena ainda: sentia pena dos instalados e enraizados, como se este mundo fosse morada permanente”.
    Dentro desse mesmo rigor, de um Deus bom e terno, que acolhe a comunidade de fé como sua eterna esposa, consciente de que a desposada de Jesus é a comunidade dos que sofrem e carregam cruzes pesadas e aqui que ninguém se sinta excluído, que Deus nos dê aquela água da festa de casamento, que lava, purifica, fecunda e germina, e ainda mais o vinho que alegra, restaura dos males, transformando-o em júbilo, prazer e otimismo (cf. Jo 2, 1-11). Assim seja!

     

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