Irmão universal

    Outubro é um mês rico de grandes comemorações. O mês das missões, do rosário que se inicia com a Semana Nacional da Vida, logo depois da Santa do Carmelo, temos a festa de São Francisco de Assis, no dia 04 de outubro (Assis, 1182-1226). É o padroeiro principal da Itália – fundador da Ordem Franciscana e inspirador de tantos outros movimentos que levam o seu nome. É o dia de rezarmos pelo Papa Francisco que escolheu seu nome como inspiração para o seu pontificado.

    Utilizando de dados já de domínio público e de mídias digitais e livros somos convidados a refletir sobre o que significa hoje para nós Igreja a figura de São Francisco de Assis. Cada santo traz consigo sua vida, seu tempo histórico, mas principalmente a vida segundo o evangelho, que faz toda a diferença.

    Francisco nasceu em Assis em 1181/1182, filho do comerciante de tecidos, Pedro de Bernardone, e de dona Joana, no batismo, recebeu o nome de João, provavelmente na infância, seu nome foi mudado em homenagem a França. Sua mãe era de origem provençal, seu pai ia muitas vezes a França, em razão de seus negócios, e para homenagear a França, preferiu chamá-lo de Francisco.

    Pouco sabemos sobre sua infância. O pároco da Igreja de San Giorgio foi quem lhe ensinou os primeiros rudimentos da escrita e do latim; provavelmente foi com a mãe que ele aprendeu o provençal, um dialeto francês. Francisco talvez tenha acompanhado o Pai em alguma destas viagens de negócio a França.

    Ele viveu como tantos outros jovens de sua cidade, do final do século XII, viveu as paixões de seu tempo, os ideais de cavalaria, as aspirações de cruzada, onde via jovens cavaleiros serem enviados a Jerusalém para defender os lugares santos. Estes lugares santos tinham caído em mãos muçulmanas em 1187.

    Francisco viveu e cresceu assistindo as tensões políticas e sociais de sua cidade de Assis, atravessado pelas lutas entre os aristocratas, que controlavam a cidade, e os membros do negócio, as classes comerciais que aspiravam compartilhar o governo da cidade. Ele mesmo lutou contra a vizinha cidade de Perugia, com um forte exército, foi feito prisioneiro e mais tarde, solto. Aspirando alcançar o cinturão de cavaleiro, ele também estava prestes a seguir o caminho dos cavaleiros local em uma das cruzadas.

    O jovem Francisco de Assis desde a sua juventude soube cultivar uma sensibilidade que o levara a estar junto dos seus amigos, como aquele jovem bom, compreensível, acolhedor, mesmo que ainda não despertasse para a fé e o desejo de Seguir Jesus Cristo na aventura da vida religiosa.  Foi numa destas viagens de cavalaria que ele sentiu que algo estava mudando em sua vida. Na peregrinação a Roma sentiu-se atraído pelo desejo de servir e amar os pobres. Era o início de sua conversão.  Um sonho a caminho de Spoleto o fizera despertar definitivamente para o chamado do Senhor, para a alegria do Evangelho. Este momento foi marcante na vida do Poverello de Assis, e ficou conhecido como o Sonho de Spoleto.

    O ano 1204-1205 marca o início de seu itinerário espiritual à luz do Evangelho: é o tempo da sua súbita crise espiritual e decisão decisiva, talvez inaugurado por uma doença que o obrigou a parar, logo que chegou a Spoleto, na sua jornada em busca da glória de cavaleiro. Sua conversão está ligada à experiência da doença, e marcada por momentos decisivos. Um deles é o episódio misterioso da Igrejinha de São Damião, onde a voz do crucificado lhe falara ao coração: ele viu uma Igrejinha abandonada em ruinas, fora, nos arredores de Assis, em São Damião, o jovem entrou para rezar: Oh! glorioso Deus altíssimo, ilumina as trevas do meu coração dá- me Senhor o reto sentir e conhecer a fim de que eu possa cumprir o sagrado encargo, que agora acaba de dar-me.  E nesta sua oração silenciosa teve uma visão, durante o qual o crucifixo naquela Igrejinha lhe falara ao coração: Francisco, Francisco não vês que a minha Igreja está ruinas? Vai e Restaura a minha Igreja. Depois disso, entregou-se intensamente a uma vida de pobreza e caridade, servindo os leprosos e restaurando fisicamente a igreja que estava em ruinas. Seguindo literalmente a voz do crucificado.

    O pai de Francisco, que havia investido grande parte de suas esperanças em seu filho e talvez até mesmo apoiado seu dispendioso tipo de vida, não apreciou sua conversão e recorreu à autoridade do episcopado de Assis, do bispo Dom Guido, para que os sonhos místicos do jovem se reduzissem autoritariamente à realidade, e ele voltaria a tomar consciência de seus deveres filiais e das tarefas familiares e profissionais que o aguardavam. Parece que, pelo contrário, o prelado ficou impressionado com a sinceridade e seriedade dos propósitos de Francisco, ou tomados sob a proteção da Igreja; isso aparece simbolizado pelo episódio durante o qual Francisco renuncia à herança de seu pai despindo-se publicamente diante do bispo, pai e concidadãos, e o bispo cobre sua nudez com seu manto.

    Desde então, iniciava a jornada de Francisco no caminho da sequela Christi, dedicou-se ao cuidado dos pobres e dos leprosos, passou a viver próximo do Monte Subasio, um desejo ardente de amar e cuidar das criaturas de Deus invadia seu coração de Apóstolo do bem, e por isso gostava de nomear tudo e todos com o título de irmã e irmão. Para Francisco tudo era irmão, irmão sol e irmã lua, irmã andorinha, irmã água, até a morte chamou-a de irmã. Depois mais adiante, perto da Capela de Santa Maria dos Anjos, chamada “Porciúncula”. Foi lá que, em 1208, provavelmente em 24 de fevereiro, durante a missa, ele sentiu o desejo e a necessidade de sair definitivamente do “mundo” de acordo com Evangelho de São Mateus, conhecido como o Evangelho da Missão.  Eis aí o convite do Senhor que ele escutou com os olhos da fé e do coração sensível aos apelos dos necessitados de seu tempo, Francisco decide se privar de tudo para fazer o bem onde quer que fosse possível. Tornou-se profeta dos desprezados, o esposo da pobreza, e irmão das criaturas de Deus.

    Voltando a Assis, o homem de Deus começou sua pregação reunindo em torno de si uma dúzia de jovens seguidores, na maioria, seus antigos companheiros dos festivais e das serenatas; eles se tornaram os primeiros membros da fraternidade dos irmãos menores, vivendo em liberdade a pobreza evangélica, partilhando a vida fraterna e exercitando a caridade para com os leprosos e excluídos de sua cidade.  Em 1210 a fraternidade foi reconhecida e aprovada oralmente pela benção e as palavras do Papa Inocêncio III.

    Em 1212, ele iniciou um ramo feminino da mesma fraternidade, com a jovem Clara de Offreduzzio e alguns moças da cidade.  Acolhendo o chamamento à vida fraterna através da experiência de clausura, enquanto Francisco de Assis seguia as estradas da Úmbria anunciando com a vida o Evangelho de Cristo, cuidando dos pobres. Clara de Assis sua primeira discipula conhecida como a “plantinha de são Francisco”, acolhe a graça da vida contemplativa evangélica. Honório, sucessor do Papa Inocêncio III, foi muito importante para a consolidação da Fraternidade nascente e sua transformação em uma Ordem religiosa. Um momento muito importante foi o chamado “capítulo das esteiras” no Pentecostes de 1221. Na presença de mais de cinco mil frades, vindos de todas as partes, Francisco reiterou vigorosamente a especificidade de sua vocação evangélica, diferente da de qualquer outra Ordem, e não em competição com qualquer um deles, mas também irredutível a qualquer outra. Francisco assegurou definitivamente quanto á razão de ser de sua fraternidade no meio do mundo, no coração da Igreja, quanto à vocação dos frades menores, e que estes deveriam acolher e viver para toda a vida: viver segundo o Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, eis aqui irmãos o nosso carisma, nosso ideal, diz Francisco aos frades reunidos.  Desde então, os membros da ordem espalharam-se pela Europa e pela Terra Santa. Aí nasceu na Palestina aos cuidados da ordem seráfica, a Custódia da Terra Santa que tanto bem faz aos lugares santos. O próprio Francisco esteve como peregrino nos lugares santos da redenção e abençoou a missão de seus frades como custódios dos santos lugares, e lá permanecem até hoje.  Nessa circunstância, é muito provável que ele tenha conhecido o sultão Malik al-Kamil. Este encontro abriu a grande temporada da vocação missionária franciscana.

     Francisco voltou para a Itália em 1220 com sua saúde debilitada e frágil, talvez foi durante a sua estadia no delta egípcio que ele contraiu glaucoma que levou a uma cegueira quase total.

     A regra, da laboriosa gestação que inspirou o nascimento da fraternidade de Francisco de Assis conheceu um primeiro texto de 1221, (a chamada de Regra não bulada, isto é, que não é legitimado por um documento oficial do Papa. A regra de 1223 foi aprovada por bula papal, os três anos que vão do retorno de Francisco do Egito à legitimação da Regra devem ter sido um dos mais amargos e difíceis da vida de Francisco de Assis.

    Em 1223 ele se retirou para a pequena cidade de Greccio, na Úmbria, onde celebrou o Natal com uma espécie de representação sagrada que deu origem à tradição do presépio. Em 1224 ele passou um longo período de hospitalização em seu amado São Damião, e lá ele compôs o belíssimo “Cântico das Criaturas”. Em setembro do mesmo ano ele se retirou para o Monte Alverne, entre a Toscana e Romagna para uma Quaresma dedicada ao Arcanjo Miguel, e no dia da Exaltação da Santa Cruz, em 14 de setembro, ele recebeu os Santos estigmas de Nosso Senhor Jesus Cristo.

    Em abril de 1226, mudou-se para Cortona, no convento de Cele, onde, segundo a tradição, escreveu o documento fundamental e definitivo de sua experiência: o Testamento de São Francisco, no qual ele recomendava veementemente que a regra de 1223 fosse seguida constantemente sine glossa, sem qualquer forma de comentário ou interpretação, porém, embora mantendo a originalidade e a centralidade do carisma, ao longos dos tempos foi preciso atualizar a regra de Francisco segundo os sinais dos tempos, com suas novas exigências, mais jamais  se retirou o espírito original, permanece sempre vivo aquele  ideal que Francisco de Assis inspirou e deixou como herança  para a Igreja, o mundo, e para sua ordem. É um Dom que se atualiza constantemente e mantém-se vivo como uma chama acessa a iluminar a fraternidade universal.

              Francisco de Assis morreu ao pôr-do-sol do dia 3 de outubro de 1226, saudado pelas criaturas de Deus, no canto das cotovias, que lhe rendeu homenagem fraterna, a quem sempre olhou com carinho e cuidado de irmão.  Francisco se despede deste mundo, além das irmãs andorinhas, estavam ali os frades menores, seus filhos a quem ele tanto amou e dedicando toda sua vida, estava os pobres de Assis por quem ele viveu com tanta paixão e dedicação se tonado o arauto do grande rei servidor dos pobres, fazendo-se pobre com eles, entre eles o mais pobre, o irmão menor.

     Como herança de seu testemunho seráfico, dedicou-lhe as palavras de seu Testamento, e aos frades disse “irmãos eu fiz a minha parte que o Senhor vos ajude a fazer a vossa, porque até agora pouco ou nada fizemos”. Neste momento o homem de Deus, Francisco de Assis entoa os últimos versos do seu cântico das criaturas, “Bem-aventurados os que sustentam a paz, que por ti, Altíssimo, serão coroados. Louvado sejas, meu Senhor, por nossa irmã a Morte corporal da qual homem algum pode escapar. Ai dos que morrerem em pecado mortal. Felizes os que ela achar conformes á tua santíssima vontade, porque a morte segunda não lhes fará mal. Louvai e bendizei a meu Senhor, E dai-lhe graças. E servi-o com grande humildade”.

    Foi uma despedida fraterna e emocionante, o cortejo percorreu as estradas de Assis, avistando Santa Maria dos Anjos, São Damião ficava próximo, e para receber o último adeus daquela que sempre o acompanhou e apoiou sua vocação de apóstolo do Evangelho; levaram-lhe até o mosteiro de São Damião, onde vivia Clara de Assis e suas irmãs, do alto  vendo através da janelinha da clausura, Clara chorava expressava assim  seu amor fraterno e sororal, sua gratidão ao grande amigo que lhe despertou para a  graça da vocação evangélica contemplativa e missionária, e que sempre o acompanhou na vida.

    Francisco de Assis foi canonizado quase imediatamente, em 1228, e seus restos mortais repousam em um grande santuário a ele dedicado em Assis, os frades ergueram com a ajuda do Cardeal Ugolino, pois queriam render homenagem àqueles que, na vida, nem sequer aceitou ter a posse de um lar modesto, porque tudo, segundo Francisco era do Senhor. Ele viveu sua vocação evangélica minoritica sem nada de próprio.

    Ainda hoje Francisco de Assis é honrado como alter Christus, um outro Cristo que viveu neste mundo fazendo o bem. É patrono da ecologia, protetor dos animais, irmãos do meio ambiente, ele é Francisco de Assis o ícone da paz e da fraternidade, rosto de ternura e reconciliação, o irmão universal.

    Neste mês missionário, em que o Papa Francisco, convida todos os cristãos para rezarem o terço, com a oração a Nossa Senhora e a Oração a São Miguel Arcanjo, em favor da Igreja e de sua ação no mundo, protegendo a Igreja e seus filhos diletos das ações do maligno e do demônio, vamos imitar as virtudes de São Francisco de Assis e passar a vida fazendo o bem, anunciando a beleza do Evangelho e procurando construir pontes de fraternidade, misericórdia e paz! Vale a pena deixar tudo para viver o Evangelho e testemunhá-lo ao mundo!

     São Francisco de Assis irmão de todo irmão, rogai por nós.

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