Era uma vez, antes que surgisse o ultrassom…

…o juramento de Hipócrates, que tinha muito boas razões para existir

Antes da aprovação do aborto nos EUA, a maioria dos primeiros “ativistas pró-vida” do país eram médicos e enfermeiros. Eles eram predominantemente católicos, mas a religião não tinha muito a ver com isso. A oposição deles ao aborto legalizado era simplesmente uma extensão lógica da sua vocação a salvar vidas.

É que o Juramento de Hipócrates era o alicerce ético da profissão médica. Popularmente resumido como “em primeiro lugar, não faça o mal”, o juramento destrinchava diversos detalhes desta obrigação. Os futuros guardiões da saúde das pessoas prometiam não dar nenhum remédio mortal a ninguém, mesmo que solicitados a dá-lo, nem sugerir tal conselho de forma alguma a quem quer que fosse. Igualmente, prometiam não colaborar com atos que provocassem o aborto.

Progressistas e feministas quiseram cortar esta parte do juramento. Eles argumentaram que, assim como a profissão médica tinha deixado de lado a exigência de jurar por Apolo, Asclépio, Hígia, Panaceia e todos os outros deuses e deusas gregos, também deveria se livrar dessa preocupação antiquada com a vida fetal.

Foram propostas muitas teorias sobre o porquê de os profissionais católicos da saúde terem sido os que mais remavam contra essa nova maré ideológica. Para mim, o argumento mais convincente tem a ver com a formação deles, mas não exatamente com os aspectos ligados à teologia católica. O motivo mais relevante era de tipo filosófico.

Os médicos católicos aprenderam com o grande cientista e filósofo grego Aristóteles e com o filósofo e Doutor da Igreja Tomás de Aquino que a vida humana, incluindo o embrião, tem um “telos”, uma finalidade, um objetivo, um plano, um desígnio, uma lógica interna. Ou, como os cientistas o chamariam mais tarde, um DNA.

O resultado do processo da procriação humana era uma pessoa, única, dotada de dignidade e de direitos. Era um ser humano. Era um ser humano que ainda não tinha se desenvolvido tanto quanto o resto de nós, adultos; mas era, ainda assim, um ser humano. Esta era uma verdade que os profissionais médicos respeitavam pela própria natureza do seu trabalho.

Havia a este propósito argumentos que iam desde a especulação antiga sobre a alma humana até a ideia atual de “pessoalidade”. Nada alterava a perspectiva ética básica dos profissionais da saúde: seu trabalho era ajudar os outros seres humanos, não matá-los. A biologia básica e a abundante experiência informavam aos médicos que a vida fetal era vida humana.

Por isso, médicos e enfermeiros que enxergavam o próprio trabalho conscientemente viam com clareza o que a disseminação da tecnologia de ultrassom acabaria mostrando também para o resto de nós. A “coisa” que reside no ventre materno não é um amontoado aleatório de células; é um de nós. Desde um estágio extremamente precoce do seu desenvolvimento, o feto é, reconhecivelmente, um ser humano, que vai passando pelas mesmas fases pelas quais todos nós passamos.

Foi preciso trilhar uma longa estrada para levar as pessoas a ignorar esta verdade inegável sobre a nossa biologia e sobre a nossa humanidade compartilhada. Mas ela continua sendo verdade.

Não é preciso acreditar em Deus nem concordar com artigos particulares de fé para enxergar que o aborto é o extermínio de uma vida humana única, uma vida a ser dotada, com toda a justiça e desde o instante da sua concepção, de direitos contra essa mesma violência.

Muita gente de fé enxerga esta verdade com clareza. É hora de o resto do mundo admiti-la também.

 

Fonte: Aleteia