De repente, parece que o mundo se acabará em fogo e água. De um lado da esfera global milhares e milhares de animais silvestres morrem entre labaredas a queimar a vegetação de seus habitats ressequidos por uma seca impiedosa. Já aqui em nosso hemisfério, em especial mais ao sul, o volume das águas celestiais que jorram caudalosamente sobre nossas cabeças, aterroriza e desaloja a população do morro ou ribeirinha a muitos dos nossos rios e lagos até então paradisíacos. É mesmo janeiro. Seca e chuva, tempestades e trovoadas.
Como lidar com a fúria da natureza, quando seu ciclo bem estabelecido e providencial, faz parte do calendário, seja este augustiniano, gregoriano ou chinês? Não há como alterar as estações, nem o curso natural do tempo. Primavera ali, verão aqui, outono acolá e inverno mais acima. É assim e ponto.
Mas medir sua intensidade, prevenir suas catástrofes, zerar seus prejuízos ou evitar seus malefícios é obrigação humana. Não existe fúria da natureza, pois esta sempre foi previsível, normal, disciplinada em suas manifestações cíclicas. Tempo chuvoso faz parte. Tempo de seca também. Enchentes, deslizes, queimadas ou aridez só são catastróficas com a intervenção humana no ambiente mal ocupado, na represa má construída, no assoreamento provocado, no desmatamento desordenado, enfim, no uso abusivo que fazemos de nossos espaços e do ciclo natural e perfeito da rotação e translação dessa nossa casa comum.
Então, eis que chuvas e trovoadas também são bênçãos divinas. Tanto quanto a seca e até as queimadas em regiões áridas. Sem a ação do fogo numa vegetação de cerrado, por exemplo, muitas espécies não sobreviveriam, não renovariam suas folhas, estariam extintas de seus biomas… Sem o fogo a erva daninha dominaria… as sementes enclausuradas não germinariam, não venceriam a dureza de seus invólucros. Sem a água, pior.
Como vemos, não é a intensidade dos trovões ou das tempestades um sinal de perigo ou maldições. Quando ouvirmos tais sons em nossas vidas, demos graças, pois novos tempos virão. Assim na terra como nos céus. Assim na vida como na morte. Vida nova que floresce e alma nova que se purifica nas correntes da revitalização dos propósitos de um novo tempo. Ah! Pudéssemos trazer para nossas vidas o sentido disso tudo… Pudéssemos ouvir os sons de muitas trovoadas em nossos corações e bendizer a Deus pelo despertar de nossas consciências, pelos propósitos de renovação de nosso espírito sedento de vida nova, pelos clamores e pedidos de socorro que nossos propósitos formulam a cada dia, em cada circunstância da vida que pulsa em nós. Pudéssemos aclamar os trovões que nos despertam e repelir a aridez do deserto interior que assola nossa vida espiritual!
Porque chuvas e trovoadas sempre existiram, fazem parte do equilíbrio climático e da harmonia ecológica que prezamos para nosso mundinho. Deveriam também povoar o equilíbrio de qualquer alma sedenta de paz e harmonia com a vida espiritual humana. Porque as torrentes das graças celestiais tornam fecundos os corações dispostos a produzir setenta vezes sete mais do que habitualmente produzem. Eventuais trovoadas da consciência hão de dissipar as energias contrárias a qualquer negligência nossa com a obra que Deus nos confiou, o mundo novo que devemos construir. Quando ouvir “a voz do tempo”, lembre-se: As águas batismais não bastam; é preciso renascer no fogo do Espírito. Não temas. Porque “sua voz no trovão reboando, no seu templo os fiéis bradam: “Glória!” É o Senhor que domina os dilúvios…” (Sl 29).