“Cultivar e guardar a criação”

    A Campanha da Fraternidade 2017 trata dos biomas brasileiros e convida para a sua defesa. O estudo dos biomas envolve várias ciências e deve ser abordado de diferentes pontos de vista. A presente reflexão tem como referência a Sagrada Escritura. Não encontramos nela uma reflexão direta sobre biomas. Contudo, ela oferece muitos elementos que iluminam a temática da ecologia.
    A fé judaico-cristã sustenta que o mundo foi desejado e criado por Deus. Inclusive, a criação é apresentada em dois textos diferentes nos quais progressivamente vão se organizando os elementos constitutivos da natureza até a conclusão do cosmos. “Assim, a Bíblia afirma que nenhum ser existe isoladamente, todos estão relacionados como partes de um plano no qual, de certa forma, uns dependem dos outros e o ser humano possui o papel de ser o guarda desta obra criada” (Texto Base da Campanha da Fraternidade nº 228).
    Esta compreensão da interdependência de todos os seres vivos, apresentada na Bíblia numa ótica de fé, hoje, por meio de outras ciências, afirma-se o mesmo. Não é possível isolar qualquer ser vivo ou destruir qualquer bioma que não resulte em desequilíbrios e morte. A parte está ligada ao todo e o todo à parte. É uma estrutura de vida.
    Na teologia da criação está clara a existência de uma harmonia entre as criaturas. O ambiente é descrito como jardim por causa da sua beleza, das frutas e das criaturas. Harmonia que ocorre na relação do homem com Deus, com a obra criada e com as outras pessoas. O texto bíblico apresenta de forma poética a relação próxima da criatura com o criador, afirmando que o “Senhor Deus passeava pelo jardim à brisa da tarde” (Gênesis 3,8). Também, apresenta a expressão de alegria do homem ao se encontrar com alguém igual a ele: “Desta vez sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne!” (Gn 2, 23).
    Diversas passagens bíblicas ressaltam que a criação está repleta de maravilhas que ultrapassam o conhecimento humano. Conhecemos muito mais agora, mas ainda não conhecemos tudo. Causa admiração tanto o que é conhecido, quanto aquilo que é desconhecido. Diante daquilo que é belo, o convite é para manifestar-se em forma de louvor a Deus.
    A criação como tal se apresenta como a mensagem de Deus, como o primeiro livro de sua revelação. Sugestivo é o salmo 19, 2-5: “Os céus narram a glória Deus, o firmamento anuncia a obra de suas mãos. O dia transmite ao dia a mensagem e a noite conta a notícia a outra noite. Não é uma fala, nem são palavras, não se escuta a sua voz. Por toda a terra difundiu-se a sua voz e aos confins do mundo chegou a sua palavra”.
    A mensagem bíblica apresenta tanto o projeto ideal, quanto as marcas doloridas oriundas do pecado do homem. Vários textos refletem as consequências das rupturas nas relações com Deus, com o próximo e a criação.  A criação é o ambiente concreto onde o homem realiza sua vocação. Cuidar e cultivar se torna uma missão. As consequências da exploração indiscriminada dos recursos naturais estão visíveis aos olhos das pessoas atentas e solidárias. Mas também a esperança se concretiza, no crescimento da conscientização, em novas legislações e nas mudanças comportamentais. Tanto que, as últimas páginas bíblicas, os capítulos 21 e 22 do Apocalipse, são carregadas de novidades: “Vi então um novo céu e uma nova terra”; “um rio de água vivificante …. frutificando doze meses por ano”.

    Dom Rodolfo Luís Weber
    Arcebispo de Passo Fundo
    25 de março de 2017

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