“Se teu irmão tiver pecado contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente” (Mt 18,15). Embora exija discernimento e caridade, a correção fraterna pode ser considerada um ato de equilíbrio. Como coloca-la em prática sem humilhar ou ferir o irmão?
Você não sabe quando, como e por quais motivos corrigir os seus irmãos? Explicaremos tudo na forma de seis questionamentos, com a ajuda do Irmão Dominique-Benoît, professor de teologia.
Qual é a melhor maneira de fazer a correção fraterna?
Não existe receita milagrosa. Cada correção deverá ser adaptada à pessoa a ser corrigida, à gravidade da falta e ao momento mais favorável. “Mostrar ao irmão o “pecadinho” que ele cometeu não é a mesma coisa de conversar sobre um pecado grave”, diz o irmão Dominique-Benoît. A forma com que corrigimos também é importante. Pode ser necessário seguir a fórmula do “bom exemplo”. Quando Santa Teresa de Ávila via uma de suas Irmãs agir mal, ela desenvolvia a virtude oposta: agir cada vez melhor. Os Padres do Deserto gostavam de dar o exemplo de forma inteligente. Abba Poemen relata: “O monge geralmente fazia sua refeição com um discípulo. Infelizmente, esse irmão costumava colocar um pé na mesa para a refeição. O velho não fazia comentários, pelo contrário, por muito tempo via isso e ficava em silêncio. Por fim, sem mais aguentar a situação, confiou a outro ancião o problema. Quando chegou a hora da refeição, o mais velho, muito rapidamente e antes que o jovem pudesse fazer o menor movimento, pôs os pés sobre a mesa. O jovem ficou muito chocado e disse ‘pai, isso é impróprio’. O ancião imediatamente tirou os dois pés e disse: “Você está certo, meu irmão”. O irmão então nunca mais se deixou levar por essa incongruência”. A nossa correção fraterna pode ser feita também através do conselho de uma leitura oportuna (uma passagem do Evangelho, os escritos de um sábio, etc.) ou através da recontagem de uma história (a vida de um santo ou alguns contos dos Padres do Deserto). A forma mais comum, no entanto, continua sendo uma discussão franca, direta e imediata.
Em termos concretos, para corrigir um amigo ou ente querido, basta um encontro individual de alguns minutos, em uma sala adequada e longe de ouvidos curiosos. “Nas poucas vezes que isso aconteceu, combinei de encontrar um amigo em minha casa para um drink. Foi tranquilo e sério ao mesmo tempo!”, disse Guilherme, ex-líder dos escoteiros. O lugar e o ambiente são essenciais. Você não “corrige” o outro em uma posição desequilibrada – um sentado e outro em pé, por exemplo. “Em geral, devemos ter o cuidado de conversar sentados em torno de uma mesa, tendo em mente que estamos lá para nos ajudar e não para julgar uns aos outros”, confidenciaram Claire e seu marido Xavier. Quanto mais pensarmos no que dizer com antecedência, melhor será. Portanto, cada palavra conta e deve ser considerada cuidadosamente. Isso não exclui a franqueza ou alguma forma de improvisação no momento para se adaptar às reações do outro. Guilherme tem a sua técnica: “Procuro sempre partir dos meus próprios defeitos para mostrar os dos outros. Mostro que também não sou santo! ”
Devemos seguir os quatro passos dados por Cristo?
Não devemos fazer algo “automático”. “O Evangelho não prevê procedimentos a serem seguidos estritamente como os procedimentos de nossos códigos civil e penal”, avisa o irmão Dominique-Benoît. A gradualidade presente no Evangelho de São Mateus – o mais eclesiológico dos quatro Evangelhos – quer mostrar que “o pecado, mesmo sendo inicialmente pessoal, gera um impacto na comunidade que fere”, especifica o Dominicano. Portanto, a ferida pessoal gerada pelo pecado é também uma ferida em todo o corpo eclesial. “A nossa existência está ligada à dos outros, tanto no bem como no mal; o pecado, assim como as obras de amor, também tem uma dimensão social”, disse Bento XVI.
É por isso que São Mateus insiste em ambos os aspectos, individual e eclesial. O último passo da correção (“Se o pecador se recusa a ouvir a Igreja, que seja considerado pagão”) é um dos fundamentos da prática da excomunhão nas Escrituras. “Isso não ocorre sempre e nem automaticamente. Deve-se atender às condições de justiça e de clara prudência. A culpa deve ser de particular gravidade e causar um grave escândalo na comunidade”, diz o Irmão dominicano.
Sobre quais assuntos podemos fazer a correção fraterna?
“A correção fraterna se refere a todo pecado venial ou mortal, porque todo pecado fere, até mesmo mata a caridade”, diz o irmão Dominique-Benoît. Portanto, a correção fraterna não deve ser reduzida apenas às faltas graves; ela também tem seu papel a desempenhar quanto a falhas leves que podem levar a falhas graves. “Por exemplo, a gula pode se mostrar inicialmente como uma ligeira falta de temperança na bebida, mas se essa tendência não for corrigida, corre-se o risco de evoluir para o pecado capital”, ilustra o dominicano.
Podemos corrigir a esposa, o marido, o chefe ou os filhos adultos?
Sim, mas com delicadeza. A correção fraterna é preferível entre duas pessoas moralmente iguais; isto é, sem que um tenha autoridade sobre o outro. “É assim no relacionamento a dois, entre irmãos e irmãs, entre irmãos batizados”, explica o Irmão. O sacerdote é antes de tudo um batizado e se eu, um leigo, o vejo cometendo uma falta contra a moral comum a todos na Igreja, a correção fraterna tem aqui o seu lugar. Onde não há igualdade, há espaço para correção paternal (do superior para subordinado)”.
No entanto, “se um subordinado vir um superior cometendo uma falta contra a moral comum a todos, ele se dirigirá ao superior não como superior, mas como irmão e, portanto, igual”. Já para a relação entre pais e filhos, a correção será paterna desde que o filho não seja adulto. Ao atingir a idade adulta, a correção torna-se fraterna por causa de uma certa igualdade moral entre os adultos. “Mas é preciso desenvolver um espírito de delicadeza pois a experiência de vida que um pai pode colocá-lo, mesmo entre os adultos, em certa superioridade”.
E se eu não conseguir convencer o meu irmão, devo perseverar ou me abster?
É importante discernir com cautela. Santo Agostinho, retomado por São Tomás de Aquino, admite a possibilidade de se abster de repreender e corrigir os que praticam o mal por três motivos:
1. “Porque esperamos o momento certo”;
2. “Porque tememos que eles piorem”;
3. “Porque tememos que, pressionando-os, eles se desviem da fé”.
São Tomás acrescenta que, se “a correção fraterna põe obstáculo à melhora de nosso irmão, que é aqui a nossa finalidade, ela perde o sentido”. “O exercício da correção fraterna, como o exercício de qualquer virtude (sendo ela virtude da caridade misericordiosa), analisa o irmão Dominique-Benoît, deve ser regulado pela virtude da prudência. Esta última tem dois aspectos. Do ponto de vista intelectual, ela aprecia o caso concreto do ponto de vista da verdade: o ato cometido por meu irmão é um pecado em si mesmo e nas circunstâncias precisas do caso? Mas a prudência é também uma virtude moral, no sentido de que deve avaliar as condições concretas do presente caso e do ato. Se do ponto de vista intelectual se verifica que existe pecado, do ponto de vista moral, cabe a pergunta: devo intervir agora? Estou na posição certa para fazer isso? Se não, devo informar alguém em uma posição melhor do que eu? Se sim, como podemos fazer isso da melhor maneira? Em outras palavras, a implementação concreta da minha intervenção deve ser apreciada”.
Antes de dar lições de moral aos outros, não deveríamos todos olhar as nossas próprias faltas?
O evangelho nos explica tudo. “Por que olhas a palha que está no olho do teu irmão e não vês a trave que está no teu? Como ousas dizer a teu irmão: Deixa-me tirar a palha do teu olho, quando tens uma trave no teu? Hipócrita! Tira primeiro a trave de teu olho e assim verás para tirar a palha do olho do teu irmão” (Mt 7,3-5). Ao abordar nosso irmão para corrigi-lo, não devemos afirmar ser bons ou nos colocar acima de qualquer crítica. A correção fraterna não é julgamento, mas ajuda fraterna mútua. “Portanto, eu também devo me tornar acessível às correções dos outros, e talvez até do irmão que estou corrigindo”.