Centenário do Nascimento de D. Estêvão Bettencourt

    Feliz o homem que ocupa da sabedoria, e que raciocina com a inteligência, que reflete, em seu coração, nos caminhos da sabedoria e medita em seus segredos. Sai atrás dela como um caçador, põe-se à espreita nos seus caminhos. Inclina-se para olhar por suas janelas escuta às suas portas. Detém-se junto à sua casa, fixa o prego nas suas paredes. Coloca a sua tenda junto a ela acampará num lugar de felicidade.” (Eclo 14, 22-25).

    Neste ano em que nossa Arquidiocese vivencia o ano vocacional sacerdotal, e se prepara para o ano de início de animação missionária (batizados: sempre missionários) como um tempo especial, e também, neste tempo, em que iniciamos as comemorações dos centenários dos nascimentos de São João Paulo II e de D. Eugênio Salles, é com grata alegria que damos graças a Deus e recordamos o centenário de uma das figuras mais destacadas no âmbito da Teologia, da Filosofia, da catequese e da pastoral, tanto em nossa Arquidiocese como em todo o Brasil, a figura de D. Estêvão Tavares Bettencourt.

    Dom Estêvão está marcado na história da Igreja no Rio por toda a sua dedicação e empenho, humildade e verdadeiro saber utilizado em prol do crescimento do Reino de Deus. As palavras da Escritura acima citadas, tiradas do livro do Eclesiástico, ilustram perfeitamente este homem de trabalho, estudo e oração que segue nos concedendo abundantes frutos espirituais.

    Com a capacidade imensa que tinha, ele poderia ter desenvolvido uma obra própria. Seu grande mérito foi criar uma obra de divulgação da teologia para que os leigos pudessem ter acesso de maneira segura, fidedigna à doutrina católica, e ter as suas mais diversas questões respondidas.

    Flávio Tavares Bettencourt nasceu na cidade do Rio de Janeiro aos 16 de setembro de 1919, um carioca que se colocou a serviço da igreja. Aos 4 anos de idade viajou com os pais para Paris, onde permaneceu até 1928 quando então regressou ao Brasil. Os estudos, iniciados em Paris no Lyceé Buffon prosseguiram no Colégio de São Bento do Rio de Janeiro, onde, de 1931 a 1935, fez o curso ginasial. Foi através do convívio diário com os monges que chegou a conhecer a vida monástica. Tendo já concluído o curso ginasial, ingressou no Mosteiro de São Bento a 1 de fevereiro de 1936.

    Recebeu aos 6 de outubro de 1936 o hábito de noviço e, em razão de sua devoção aos mártires da Igreja primitiva, teve como padroeiro onomástico o protomártir S. Estêvão. Emitiu seus primeiros votos monásticos a 7 de outubro de 1937 na sala capitular do Mosteiro.

    Com o conhecimento do grego, do latim, do francês, do inglês e do alemão, ele foi mandado por D. Tomás Keller para Roma a fim de doutorar-se em Filosofia no Pontifício Ateneu de Santo Anselmo, onde permaneceu até1945.

    Pouco antes de iniciar o curso de Teologia, fez sua profissão solene em Monte Cassino aos 7 de novembro de 1940. Recebeu o diaconato aos 12 de julho de 1942, em Roma. A ordenação presbiteral realizou-se na igreja de S. Agnese na Piazza Navona aos 18 de julho de 1943. Em novembro de 1944 defendeu a tese de doutorado sobre Orígenes. Em outubro de 1944 matriculou-se no Pontifício Instituto Bíblico de Roma para cursar algumas matérias, pois ele antecipara a redação e a defesa de sua tese de doutorado. Aos 21 de janeiro de 1945 apresentou-se a oportunidade rara de voltar ao Brasil devido à II Guerra Mundial.

    Desde o ano letivo de 1945, D. Estêvão assumiu a cátedra bíblica na Casa de Estudos da Congregação que funcionava no interior da Abadia do Rio de Janeiro e que, como Escola Teológica da Congregação Beneditina do Brasil, passou a funcionar em sede própria no Mosteiro. Ao longo dos anos foi professor também de diversas disciplinas filosóficas e teológicas em várias Universidades e Institutos do Rio de Janeiro: na Universidade Santa Úrsula (de 1946 a 1980), na Pontifícia Universidade Católica (de 1958 a 1961 e de 1968 a 1974), na Universidade Católica de Petrópolis (de 1968 a 1978), no Instituto Superior de Teologia da Arquidiocese do Rio de Janeiro (desde 1985), na Escola Superior de Catequese “Mater Ecclesiae”, na Escola “Luz e Vida” de Catequese, no Instituto Pio X do Rio de Janeiro (1957 e 1958).

    Em 1973 foi para Jerusalém aperfeiçoar-se em arqueologia bíblica na Escola Bíblica Franciscana e em exegese bíblica na Escola Bíblica dos Dominicanos.

    Entre outras atividades importantes, destacamos as seguintes: Diretor do Instituto de Teologia da Associação Universitária Santa Úrsula em 195; Decano do Centro de Teologia, Filosofia e Ciências Sociais em 1996 e 1997; Vice-Reitor da Faculdade Eclesiástica de Filosofia João Paulo II desde 1981; Membro dos Conselhos Universitários e de Ensino e Pesquisa de 1976 a 1980; Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Filósofos Católicos desde 1974; Vice-Presidente da LEB de 1964 a 1967 e de 1975 a 1977; Consultor da Comissão Episcopal de Doutrinas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; Membro da Comissão de Diálogo Judeu-Cristão da CNBB; Diretor Executivo das Escolas “Mater Ecclesiae” do Rio de Janeiro. Desde 1982 foi secretário da Instituição Communio e redator-chefe da revista homônima no Brasil, onde participava anualmente dos encontros internacionais organizados pela entidade.

    Sobre a sua obra, vale ressaltar a fidelidade plena ao Evangelho tal como é professado pelo Magistério da Igreja. Em seus livros recorre sempre ao dado bíblico, aos Santos Padres e às diretrizes da Santa Sé, sem negligenciar as conquistas do método histórico-crítico aplicado à Bíblia. Vale também ressaltar o seu modo de fazer teologia sempre a partir de sua vivência espiritual. Ele realizou uma integração entre exegese científica e exegese espiritual, entre crítica e investigação teológica, numa linguagem de fácil compreensão, tendo em vista a sólida formação dos leigos.

    Editou, desde 1957, a revista “Pergunte e Responderemos” da qual foi autor e redator de toda matérias publicadas. Mesmo idoso e adoentado, porém lúcido, continuou a editá-la e, tendo falecido em 14 de abril de 2008, deixou-a pronta até setembro do mesmo ano, quando saiu o número 555.

    Dom Estêvão começou a dar sinais de maiores problemas de saúde a partir de 2001, quando já estava com 82 anos. No dia de sua morte, acordou no horário de costume, às 4h30, para rezar o Ofício e pouco antes de tomar o café da manhã faleceu de infarto agudo do miocárdio.

    Ao celebrarmos o centenário do nascimento desse homem de Deus, homem do Evangelho e homem da Igreja, considerando o que ele significou e significa para nossa Arquidiocese e para a Igreja no Brasil, queremos registrar, ainda que de forma singela, esta grata lembrança, agradecendo a Deus, pelas mãos de Nossa Senhora de Montserrat, de São Bento e Santo Estêvão pela existência preciosa daquele que nós consideramos “um monge admirável”.

    Em nossa Arquidiocese, no mês de setembro celebrou-se o seu centenário com missas em nossa Capela do Edifício São João Paulo II com a participação de tantos alunos de nossas escolas nas quais D. Estêvão trabalhou. A nossa igreja particular é grata a D. Estêvão pela sua missão aqui desempenhada com tanto carinho e vigor. Deus acolheu esse monge carioca no céu recebendo a recompensa de sua vida santa e dedicada.

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