As Olimpíadas e as religiões

    Dentre as várias atividades dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, faz parte um espaço inter-religioso. A liberdade de culto do estado leigo faz com que a vila dos atletas tenha essa possibilidade. Tem os que foram escolhidos pelo Comitê Olímpico para coordenarem esse espaço, que sempre esteve aberto a todas as confissões, dependendo apenas da solicitação dos atletas. Esse espaço não poderia servir para fazer proselitismo e sim para se colocar a serviço de quem pede um culto religioso. A equipe de coordenação foi escolhida pelo Comitê Olímpico, com já mencionado acima, para organizar o centro inter-religioso da Vila dos Atletas, que também vai receber os atletas paralímpicos agora em setembro. Para coordenar o grupo cristão, foi nomeado o Padre Leandro Lenin, sacerdote de nossa Arquidiocese.
    É bom entender que a Igreja não mede esforços para sempre ressaltar o valor da pessoa que está envolvida nesses eventos. Ou seja, não se pode festejar um grande momento positivo, como são as Olimpíadas e as Paralimpíadas, tendo por baixo de tudo isso histórias de tristeza ou histórias de incompreensão, até injustiça. Nossa grande tentativa é em associação a estes grandes que querem o bem da cidade, que querem o bem da população. Ou seja, por princípio, nós não estaríamos falando em nada negativo: jogos olímpicos e paralímpicos, seus atletas, seus valores são fantásticos; agora, o modo como proceder precisa ser mais humanizado. Voltamos ao tema de legados mais humanos e não tanto estruturais, ou visuais. Precisaríamos atingir o coração das pessoas também.
    Como Católicos temos a tradição do diálogo inter-religioso e ecumênico, que há muito acontece em nossa cidade, tanto nas manifestações, como nas celebrações e em eventos específicos. É desafiador o tema, é desafiador o contexto, ou seja, estamos falando do maior evento esportivo do mundo e que, no Rio de Janeiro, com certeza está sendo o maior da história pelo número de atletas, de turistas e até modalidades esportivas. Dentro do Comitê Organizador da Rio 2016, o Centro Inter-religioso da Vila dos Atletas – que funcionará por quase dois meses – embora coordenado pela Igreja Católica do Rio, mas a serviço dos atletas de todas as religiões, proporcionará a possibilidade de todos serem assistidos pelas suas religiões. Tivemos algumas religiões já tradicionais nos Jogos Olímpicos como o judaísmo, o budismo, o islamismo, o hinduísmo, além das outras religiões não-cristãs. O nosso espaço cristão foi repartido entre nós, católicos, e demais igrejas cristãs e grupos religiosos. Um modo de organizar o serviço corrente da Vila porque, pelo conceito, a Vila dos Atletas é casa deles e, por isso, deve oferecer de um tudo, inclusive o aspecto religioso. Aí, realmente estamos num estado laico, pois um estado ateu seria confessional.
    O diálogo inter-religioso é o grande desafio que se apresenta hoje à Igreja, de um modo particular neste mundo da globalização que se está a afirmar perante os olhos estupefatos tanto dos que a aprovam como dos que dela discordam. Alguém já vai dizendo que não estamos simplesmente perante uma época de mudanças, mas sim de uma mudança de época.
    Dentro da nossa visão católica, podemos ver o diálogo inter-religioso dentro de nossa missão evangelizadora. O Gênesis diz-nos que: tudo teve início pela Palavra, o Logos, de Deus. Deus diz e a sua Palavra faz ser. A Palavra de Deus é o mediador imediato entre Deus e as criaturas. Através da Palavra cria-se um movimento dialógico entre Criador e criatura, na salvaguarda da diferença ontológica. Com a vinda de Cristo “a palavra faz-se carne” e Ele é o fulcro do movimento unificador e relacional entre Deus e a sua criação. Cristo é a Palavra que se faz alguém vivente; com Ele o transcendente faz-se presente no imanente, numa relação criadora/reveladora entre Deus e o ser criado por excelência – o homem.
    Os documentos sobre o diálogo e a reflexão que se lhes seguiram apresentam o diálogo como um fator positivo, de aprofundamento da própria fé, e não como elemento negativo que a leva a enfraquecer. O Diálogo e Anúncio, no número 50 da Dignitatis Humanae, diz mesmo que “o diálogo, longe de lhes enfraquecer a fé, torná-la-á mais profunda… compreenderão mais claramente os elementos distintivos da mensagem cristã e a presença operante do mistério de Jesus Cristo para além dos confins visíveis da Igreja e do rebanho cristão”.
    A relação dialógica deve ser assim entendida como relação de diferentes logos, conceitos, sensações, ações expressas em palavras a dizer ao outro e a escutar do outro. Cristo é o absoluto, o diálogo originário, a pedra de alicerce do sentido de todo diálogo inter-humano. Ele mesmo diz: “onde dois ou três se encontram reunidos em meu nome, eu estarei no meio deles” (Mt 18, 20).
    Contudo, a declaração Dignitatis Humanae veio consagrar a liberdade religiosa e afirmar a dignidade da consciência que deve ser respeitada. A declaração Nostra Aetate, por seu lado, afirmou a estima e o reconhecimento que a Igreja Católica tem pelos valores presentes nas outras religiões, expressamente no Hinduísmo, Budismo, Islamismo, Judaísmo. Estas “refletem não raramente um raio da verdade que ilumina todos os homens”. Além desses documentos de diálogo com a sociedade, com a cultura e com as religiões temos o documento do Concílio sobre o ecumenismo “Unitatis Redintegratio”, que nos coloca na caminhada de celebrações com os irmãos cristãos.
    Que estes jogos Olímpicos que já ocorreram, e os Paralímpicos que irão iniciar em nossa acolhedora cidade, sejam canais de diálogo entre os povos, culturas e religiões.

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