Celebramos neste final de semana o terceiro domingo da Páscoa. A liturgia deste domingo recorda-nos que a comunidade cristã tem por missão testemunhar e concretizar o projeto que Jesus iniciou. Recorda-nos também que Jesus ressuscitado, acompanhará sempre a sua Igreja em missão, vivificando-a com sua presença e orientando-a com a sua Palavra. Sem a presença de Cristo nada acontece. Podemos nos esforçar muito e dedicar todas as horas do dia tentando mudar o mundo, mas, se Cristo não estiver presente, se não escutarmos sua voz, se não ouvirmos atentamente a Palavra que Ele nos dirige, nossos esforços não terão êxito.
A primeira leitura – (cf. At 5, 27b-32.40b-41) – atesta o testemunho dos apóstolos a respeito de Cristo diante do Sinédrio. Eles anunciam seu mestre, sua vida e seus ensinamentos. O texto apresenta ainda a resistência ou incômodo que esse anúncio causa na classe dirigente. A razão da resistência é clara: os apóstolos não só anunciam o Cristo ressuscitado, mas também, junto a esse anúncio, denunciam aquela mesma liderança por seu papel ativo no processo que desembocou na execução de seu mestre. Em nome da Lei divina, o Sinédrio condenou Jesus, e a divulgação da ressurreição deste representava dura acusação contra o tribunal – pois, se Deus ressuscitou o condenado, isso significava que seus juízes eram culpados e este era inocente.
Pedro respondeu que iria obedecer primeiramente a Deus e não a autoridades humanas. Mencionou ainda a assistência do Espírito Santo no encargo de testemunhar tanto a morte quanto a ressurreição de Jesus. O Sinédrio, então, intimou os apóstolos a não falar mais no nome de Jesus. Mandou açoitá-los e soltá-los. A conduta deles após os açoites indica que ficaram felizes por terem sido achados dignos de sofrer por causa do nome de Jesus. As injúrias significavam que eles estavam, de fato, fazendo a vontade de Deus, caso contrário não teriam incomodado ninguém e suas palavras teriam sido bem-aceitas.
A segunda leitura (cf. Ap 5, 11-14), está intimamente ligada à primeira e ao Evangelho. Ela traz o testemunho celeste do Cristo. São os anjos e os santos, no céu, que reconhecem, exaltam e louvam o Cristo, a exemplo do que fizeram os discípulos, na terra, diante do Sinédrio. O rebanho do Senhor que fora confiado aos apóstolos, tendo Pedro como líder desse grupo, agora louva seu Senhor e pastor nas alturas celestes.
O Evangelho – (cf. Jo 21, 1-19) – nos relata o encontro, à beira do lago, de Jesus com seus discípulos, com quem ele partilha uma refeição. Esse texto, chamado de “a pesca milagrosa”, é narrado por João no final de seu evangelho, distinguindo-se, assim, de Lucas, que o situa no início, no contexto do chamado dos primeiros discípulos. Para João, a pesca e a consequente partilha do alimento são expressões do reconhecimento do Ressuscitado como aquele que vivera com eles e fora crucificado. O crucificado e o ressuscitado são a mesmíssima pessoa. Essa é a experiência vivida que ilumina a mente e o coração dos discípulos. E isso não é tudo. Em João, à pesca e à consequente refeição segue-se o chamado de Pedro para apascentar as ovelhas do rebanho de Jesus. O texto conhecido como “primado de Pedro” nos sinóticos é, em João, um chamado a exercer uma missão, delegada a Pedro pelo Ressuscitado.
O número sete (discípulos presentes) significa perfeição ou totalidade. Aqui traduz a comunidade perfeita, a que se reúne em torno do banquete (vv. 9-13). Os protagonistas da cena, Pedro e o Discípulo Amado, são os mesmos que entraram no sepulcro vazio. Novamente, o Discípulo Amado reconhece o Senhor. É o amor que precede esse reconhecimento. Mas é Pedro, dessa vez, que corre ao encontro do Senhor (v. 7). É também ele quem toma a iniciativa de pescar e de trazer para a praia a rede cheia de peixes (v. 11). Assim, entrelaçam-se o reconhecimento do Ressuscitado e o serviço missionário representado pela pesca. Sem esse reconhecimento, o trabalho é estéril (v. 3); somente com Cristo ele se torna fecundo (v. 7). Os 153 peixes grandes simbolizam o grandioso sucesso da missão e seu caráter universal.
A Pedro é confiada a tarefa pastoral na Igreja (vv. 15-17). As três perguntas que Jesus lhe faz sobre se ele o ama correspondem às três negações do apóstolo. Pedro não ousa afirmar que ama o Senhor mais que os outros discípulos. Sua resposta é humilde, pois sabe de sua fraqueza e tem consciência de que sua tarefa é fundada na graça. Jesus pergunta a Pedro considerando sua disponibilidade, e é a partir daí que lhe é confiada a missão. No v. 18, Jesus apresenta a Pedro a total disponibilidade que o discípulo deve ter para o seguimento. Caminhar com Jesus é assumir também seu destino: o martírio. Dessa forma, o serviço que Pedro assume no pastoreio deve ser feito num total dom de si. Esse dom só é possível para aquele que ama, ainda que não o faça “mais que os outros”. Esse amor incondicional, que o próprio Cristo vivenciou, Pedro aprenderá em sua caminhada. Por enquanto, sua própria entrega foi o reflexo desse amor.
Nesta celebração, o Ressuscitado nos convida para a refeição e para retomar o caminho com Ele. Peçamos que o Senhor abra nossos olhos para percebermos sua presença no meio de nossa luta e nos firme na missão, apesar de todas as dificuldades. Que Ele nos dê a graça de podermos repetir em nossa vida a confissão de Pedro: “Senhor, tu conheces tudo, e sabes que eu te amo”.