No Evangelho de São Lucas o sermão da Montanha é apresentado numa síntese na qual são retratados aqueles aos quais pertence o reino de Deus e aqueles que dele são excluídos, (Lc 5,17. 20-26) Quatro bem-aventuranças às quais se contrapõem quatro maldições, alertas de Jesus a seus seguidores. É fixada a bem-aventurança dos pobres, daqueles que choram, dos que têm fome e daqueles que são perseguidos. A estas quatro classes paralelamente surgem quatro execrações, introduzidas pelas palavras “Ai de vós”. A exposição de São Lucas é mais abrupta, sintética, abreviada que as de São Mateus. Trata-se de uma exposição direta sobre quem é agradável a Deus, ou seja, os pobres, os deserdados, os sofredores, os que padecem fome, os desprezados. São situações concretas nas quais, porém, devem sentir a presença amorosa de seu Senhor, que nestas ocasiões dolorosas transforma os espinhos da vida em pérolas para a eternidade. Por mais atrozes que sejam as aflições o fato de se estar imerso em Deus disto jorra felicidade. Deus é o amigo íntimo dos que sofrem e sabem valorizar as amarguras. Não se trata de uma vã consolação, mas de viver uma realidade que transforma a própria vida e faz olhar os irmãos padecentes à luz de uma fé profunda. Infelizes são os ricos que colocam na riqueza todo o seu bem, os que endeusam os prazeres de uma lauta mesa, aqueles que só procuram apenas delícias mundanas e os louvores humanos. Isto contrastando com a prática das virtudes apenas valorizando o que é passageiro. Ai de vós os ricos, não pelo fato de serem ricos, pois Jesus teve amigos entre pessoas que eram afortunadas como Mateus e Zaqueu, Marta e Maria, mas porque nada mais esperam de Deus e se entregam a uma segurança meramente material. Os ricos a que Jesus se refere são aqueles que não dão espaço para Deus, não se abrem àquela esperança de uma ventura total que somente o Criador pode oferecer. Felizes, ao contrário, os pobres porque deles a riqueza é o reino do amor do Ser Infinito. Cristo não disse que feliz é a miséria, porque a miséria é um mal que deve ser eliminada, mas bem-aventurada é a pobreza que abre o coração aos dons divinos, sendo a fonte da verdadeira alegria. Ai daqueles que estão fartos, apreciando com avidez o que a vida pode oferecer e não têm mais fome das coisas eternas que Deus oferece a quem O ama. São aqueles que estão contentes com o imediato e se deixam possuir pelos bens materiais e não aspiram mais por uma vida autenticamente cristã, aberta e generosa para os outros. Felizes, isto sim, os que aspiram pelas realidades espirituais e delas têm fome e sede. De fato, infelizes aqueles que se instalam no bem estar terreno, no egoísmo, fixados em si mesmo, porque na hora das provações não encontrarão os que verdadeiramente os possa consolar. Bem-aventurados, porém, os que sabem chorar com que os que choram porque haverão de rir na luz que vem de Deus, quando o sorriso do Todo-poderoso triunfa de todos os medos. Então se degustará a alegria dos corações livres, o júbilo dos que amam e sabem ser amados. Ai daqueles que se tornam profetas das veleidades, abandonando as exigências do Reino de Deus, acatando todas as falsas doutrinas. Felizes, contudo, aqueles que por causa de Jesus é detestado, rejeitado, marginalizado. Neste caso se terá o júbilo que só o divino Redentor pode oferecer, uma recompensa para os que Lhe são fiéis apesar de todas as turbulências Portanto, o discípulo de Jesus pode ser feliz ou não, dependendo da aceitação de sua proposta de bem-aventurança ou de infelicidade. Ser seu discípulo é andar pelo caminho da ventura que Ele propõe, palavra que suscita o desejo de viver as realidades espirituais que geram para si e para os outros a verdadeira liberdade, palavra que abre o Reino de Deus. Cumpre sair de uma lógica puramente humana para entrar na lógica de Jesus e nela se encontrará a verdadeira felicidade.