02 Fugacidade dos bens temporais

    Jesus mostrou claramente qual deve ser a atitude de seu seguidor com relação aos bens materiais (Lc 12,13-21). Com precisão o Mestre divino demonstrou que se deve evitar que o angelismo no que diz respeitos às precisões humanas, quer o apego exagerado às propriedades terrenas. Sua sentença foi lapidar: “Cuidai e guardai-vos de toda cobiça, por que a vida de alguém não esta na abundância de seus haveres”. Estes devem estar subordinados aos interesses espirituais. Trata-se da boa administração de tudo que Deus concede a cada um, mas sem uma supervalorização das riquezas. Com a morte ninguém levará nada deste mundo, mas o modo como empregou o que possuiu, inclusive na ajuda generosa ao culto divino e aos mais necessitados de acordo com as possibilidades de cada um. O ser humano espiritualizado ostenta sempre o desapego do que fugaz, mas sabe bem empregar os dons que o Criador lhe outorgou sabendo que a previdência humana não vai contra a Providência divina.  Isto impede um materialismo condenável, como também evita a negligência em amealhar o que é necessário para o sustento próprio e da família num labor eficiente e perseverante. O cristão vê sua vida nesta terra apenas como uma etapa para a existência eterna na Casa do Pai. Cumpre então uma coerência absoluta entre o que se crê e o que se vive. São Paulo aconselhou sabiamente a procurar então as riquezas do alto (Col 3,1-4). Para isto é preciso um criterioso amor a si mesmo, ao próximo e a Deus, pois deste modo se utilizará com sapiência os bens materiais em ordem à eternidade. Ficam então afastadas as ilusões desta terra e, ao mesmo tempo, será possível usufruir ao máximo de tudo que Deus concede e que dá segurança por entre as turbulências inevitáveis a um exílio terreno. Isto afasta peremptoriamente um desejo imoderado de poder e glória. Trata-se de um agir responsável para consigo mesmo, para com a família e a comunidade em que se vive numa perspectiva repleta de esperança e de confiança no Senhor Onipotente. É deste modo que no ocaso da existência a pessoa não se lamentará da vacuidade de sua passagem neste mundo. Terá deixado um rastilho luminoso e beneficiado a inúmeras pessoas. Este fugiu da vaidade de tudo que é transitório por que fez do amor partilhado sua garantia e sua felicidade sem nunca se preocupar com as incertezas do porvir. O importante é ser rico diante de Deus estando contente com o que se tem para prover uma vida decente sem endeusar o dinheiro que deve ser um mero instrumento a ser manejado com prudência e sem servidão ao mesmo. Estas reflexões são tanto mais importantes perante uma sociedade de consumo e num contexto impregnado de corrupção fruto da ganância, sobretudo, de certos políticos. É o que vale também para os governantes que gastam a torno e a direito com o que arrancam do povo com impostos escorchantes, inadmissíveis e os empregam olhando somente seus interesses pessoais. Estes políticos jamais entenderão o que disse Jesus: “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos céus (Mt 5,3). Criou-se uma sociedade chancelada pelo pragmatismo na qual se diviniza o sucesso e o progresso econômico, sacrificando valores como a educação, a saúde, um mínimo de bem estar. Como bem afirmou o papa emérito Bento XVI, “em matéria espiritual e moral contemplamos uma sociedade que não capitaliza o que enobrece o ser humano”.  De fato, pelo contrário, é o capitalismo desumano que só favorece um grupo de interesseiros que malbaratam o bem comum. É o império da cobiça a levar aos maiores desvios éticos. Não se tem noção do que supérfluo, útil, importante, necessário e essencial para a população em geral. Muitos são os que se esquecem de que fortunas, sobretudo, as injustamente adquiridas, glórias de um poder espúrio, principalmente as riquezas extorquidas do povo são apenas um nuvem passageira e que um dia de tudo se dará contas a Deus. Donde o alerta do Pe. Antônio Vieira: “Tudo passa, e nada passa. Tudo passa para a vida e nada passa para a conta. A verdade e desengano de que tudo passa, posto que seja por uma parte tão evidente, que parece não há mister prova, é por outro tão dificultoso, que nenhuma evidência basta para o persuadir. Lede os Filósofos, lede os Profetas, lede os Apóstolos, lede os Santos Padres, e vereis como todos empregaram a escrita e não uma, senão muitas vezes, e com todas as forças da eloquência, na declaração deste desengano, posto por si mesmo tão claro”. Que então, isto sim, o autêntico discípulo de Jesus eleve seu coração para os bens espirituais, para as realidades perenes que não se compram, vivendo num verdadeiro amor inteiramente dentro dos princípios do Evangelho. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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