Sinal de contradição

    Quando se fala em sinal analógico, nos dias de hoje, qualquer brasileiro, bem ou mal, compreende e arrisca um palpite. Está se falando de algo vital para continuar recebendo as imagens daquela telinha fundamental na manutenção dos nossos costumes e tradições. Verdade? Nem tanto… Mas quando o assunto nos desafia a ser sinal de contradição, como ficamos? O desafio do velho Simeão ecoou nas paredes de pedra do templo de Jerusalém e por lá ficou. O que seus olhos contemplaram, ao vivo e a cores, nenhum sinal dos tempos modernos foi capaz de reproduzir ou retransmitir com fidelidade. “Porque os meus olhos viram a vossa Salvação” (Lc 2,30).
    Tal analogia não mais se repetiu e por isso mesmo tornou-se sinal de contradição. O milagre presenciado e compreendido em sua plenitude por aquele homem “justo e piedoso” foi a primeira grande manifestação do poder, glória e fidelidade divina para satisfação e júbilo do povo que ainda buscava nos céus um sinal das promessas de vida nova. Contemplar uma criança e descobrir nela os planos de Deus foi sua grande alegria. Proclamar essa verdade, profetizando um futuro melhor “como luz para iluminar as nações e glorificar seu povo”, a primeira grande manchete da Boa Nova cristã. Um novo tempo se iniciava. Mas, contraditoriamente, a boa notícia vinha acompanhada de um enigma: “Eis que este menino está destinado a ser um sinal que provocará contradições” (Lc 2, 34).
    O sinal já não era tão analógico assim. Perdia seu ponto de semelhança, para ser diferente, contraditório. O novo tempo que seus olhos contemplavam trazia em si uma ferrenha oposição à realidade, ao comodismo, às contradições da história humana, que desde sempre primou em construir desvios aos sinais divinos, aos alertas que o Criador deixou ao longo da estrada, da história… Eis que agora o sinal nascia da debilidade, da simplicidade, da fragilidade, da inocência, da ingenuidade de uma criança pobre e indefesa. Uma criança recém-nascida sempre representou tudo isso. Mas ali estava uma criança que contradizia todas as demais. A profecia de Simeão punha às claras o mistério que o colo de Maria embalava e apresentava ao mundo. A Salvação nascia da fragilidade humana.
    A Salvação nasce da nossa fragilidade. Tal contradição não é mistério, mas revelação bem nítida e evidente na vida daqueles que enxergam a presença de Deus nos braços de Maria e dão glórias por isso. Jesus sempre foi o contraditório das lógicas. Seu sinal não é analógico, igual para todos, massificante, alienante. Não revela com nitidez apenas as cores desse mundo prazeroso e glamoroso, mas também e por primeiro as contradições de sua transitoriedade. Podemos até admirar e agradecer pelas maravilhas que nos cercam e das quais também usufruímos, mas é preciso olhar mais adiante e compreender o contraditório da fé que professamos. Como Cristo, o cristão é sinal de contradição. Vai contra a corrente do mundo que afaga o corpo, acalenta sonhos, inspira prazeres, mas não satisfaz seu espírito, sua alma sedenta de plenitude. Ou seja, enquanto muitos se comprazem com o conforto da tecnologia que nos afoga e sufoca a vida espiritual, alguns poucos ainda são capazes de decifrar outros sinais que permeiam nossa realidade, os céus de nossa vida terrena. Para estes a contradição é analógica, os iguala ao menino apresentado ao Templo. O menino que cumpria os preceitos da lei e se consagrava publicamente, “a fim de serem revelados os pensamentos de muitos corações”, divididos desde então a favor ou contra Jesus Cristo. Ele é o contraditório do mundo. Esse é seu canal, seu sinal, sua salvação.

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