A participação de leigos e leigas na Missão além-fronteiras é uma raridade, mas existem alguns exemplos marcantes como o da leiga Neiva Hoffelder, catarinense de Joaçaba (SC). Ela trabalhava em atividades sociais e pastorais até ser convidada pelos Irmãos Maristas a integrar uma equipe missionária para trabalhar na Ásia.Em 2009, Neiva trabalhava na Universidade Católica do Paraná quando aceitou tal missão , indo primeiro fazer cursos em Manila e Davao (Filipinas) e depois na Tailândia. Atualmente participa de uma comunidade de irmãos e leigos maristela em Bangkon, pelo projeto Missão Ad Gentes para a Ásia, o qual é integrado po 42 irmãos e cinco leigos e leigas de 19 países. O trabalho inclui a Pastoral da Juventude, CEB´s e os Direitos da Criança e do Adolescente em 15 comunidades, em sete países destacando-se Camboja, Bangladesh, Tailândia e Índia. Neiva coordena os projetos com reuniões e formação para motivar os agentes nas dificuldades. Em uma de suas andanças por Banglasdesch, a missionária observa a realidade e exclama: ”Deus deve morar por estes lados!” Acompanhe o relato:
Tomamos um carro para irmos para o outro lado da cidade para almoçar e pegar ônibus a Mymensingh.O carro que nos levou estava aos pedaços. Almoçamos ali, em um lugar não muito higiênico, cheio de gente para todos os lados, pedindo esmolas, crianças puxando pela roupa, crianças carregando outras no colo…coisas de cortar o coração!
Seguimos para a estação de ônibus, uma tenda ao lado um lixão. Muitas moscas, esgotos, sujeira…um amontoado de gente esperando o ônibus… No meio da rua circulam pessoas junto a carroças, bicicletas, tuk tuk, carros, ônibus, caminhões, vacas, cabritos… enfim, a Babilônia acho que é por aqui!!!
O trajeto foi de 120 Km, mas levamos quase três horas para chegar. O ônibus anda por todos os lados buzinando, ultrapassando. Tenho a impressão que Deus deve morar por estes lados porque só por ele mesmo que a gente sobrevive nesse tipo de viagem. Passando por um espaço onde trabalham milhares de pessoas, 12 a 16 horas por dia para ganhar uma miséria fabricando roupas. Gente tomando banhos em açudes de água barrenta, entre peixes e lavação de roupa… Enfim, já de noite, chegamos à cidade de Mymensingh, onde temos uma comunidade de Agentes Maristas.
Tivemos dois dias de reunião para apresentar os materiais de suporte de três projetos. Depois visitamos a Vila Pirgacha, no distrito de Tangail. O padre Eugene Homrich é quem coordena o local. Um grande centro com dois internos, uma para 150 meninas, e outro para 80 meninos. O centro comporta a casa paroquial; igreja; escolas; centro de produção de roupas onde trabalham as mulheres da vila; a enfermaria, para partos de mães solteiras, e que, após o parto, voltam para suas casas e as crianças ficam para doação.
Essa região é dividida por comunidades/vilas de diferentes etnias. Visitamos também a vila Kaialakuri onde tem um projeto de saúde, com o hospital , em condições precárias .
Ali encontramos uma experiência de Comunidade Eclesial de Base inter-religiosa. Todas as manhas os paramédicos e funcionários se reúnem, fazem formações e rezam. Liderados por um rapaz muçulmano, participam cristãos , muçulmanos, e hindus. rezam com a bíblia, o alcorão e refletem sobre a realidade. Um exemplo muito bonito. foi uma experiência incrível. Nessas terras os missionários são verdadeiros heróis anônimos merecendo nosso respeito, oração e solidariedade.
O que é ser discípulo de Cristo?
Nestes dias, estou refletindo a respeito do Evangelho de São Lucas (14,25-33), onde Jesus nos faz um alerta: “Quem não carrega sua cruz e não caminha após mim, não pode ser meu discípulo”. Para ser verdadeiro discípulo de jesus é preciso deixar tudo, ate mesmo os familiares.
Seguir Cristo, ser um discípulo, não é apenas fazer algumas ações cegamente irrefletidas e ir a outros lugares, mais requer deliberação e planejamento. Precisamos escutar a voz de Deus que nos empurra a sairmos de nos mesmos para seguir Cristo e prosseguir no caminho mostrando, apresentando o seu amor a quem encontramos, independente de credo, cultura, raça… Seguir Cristo nunca foi fácil. Até mesmo com as pessoas próximas. Como cristãos somos chamados a fazer sacrifícios, deixando de lado o que temos; nosso conforto, nossos bens manterias e pelo menos tentar defender, ajudar o outro a seguir esse Cristo. Isso amedronta! Principalmente quando a multidão que e encontra ao nosso redor nos oprime e nos vemos sozinhos. Nesse momento, precisamos de coragem e da força que encontramos no próprio Cristo para seguirmos o caminho.
Mas como sermos discípulos de Jesus em meio a um turbilhão de coisas opostas ao que acreditamos? O que é verdadeiramente necessário para seguirmos em frente? Estar em meio a culturas ancestrais, religiões fundamentalistas, em situações hostis ao cristianismo, tendo que trabalhar no anonimato, por desvios, para sobreviver e pelo menos tentar mostrar que este povo tem seus direitos e precisam ser respeitados. Como ser um discípulo de Cristo em uma cultura onde predominam o machismo e a intolerância? Onde é normal os familiares venderem suas crianças e adolescentes para o casamento com homens mais velhos? Em uma cultura onde o estupro de mulheres e crianças é comum. Na região das Ilhas do Pacífico, conforme pesquisas, quatro entre cinco homens confessaram que já mantiveram relações sexuais forçadas. como trabalhar com isso? Como você muda uma cultura milenar?
Diante de tudo caímos na tentação de desistir, de voltar para casa, para o conforto, junto de quem pensa e segue os mesmos ensinamentos cristãos que temos. Mas Jesus nos chama a realidade novamente ao dizer: “Levantai-vos!Vamo-nos daqui “! (Jo,14,31). Toda vez que temos vontade de sentar,de desistir no meio do caminho, de ser feliz junto a quem amamos , precisamos lembrar da voz de Jesus que nos chama a levantar e seguir adiante. Essa voz nos desperta e nos chama a prosseguir. Deus nos convida a partir com Ele! Esta é a força que nos move, que nos impulsiona a continuar sonhando com uma realidade diferente onde o amor e a misericórdia de Deus estejam em primeiro lugar.
Neiva Hoffeelder é leiga missionária com os Irmão Maristas na Ásia.
Fonte: Revista SIM