Segundo Domingo da Quaresma

    Estamos celebrando o segundo domingo da Quaresma. Para compreendermos o que Senhor nos quer dizer hoje, com as leituras da sua santa Palavra, é necessário recordar que estamos no caminho quaresmal e que este caminho, que nos leva à luz da celebração pascal, é imagem do próprio caminhar nosso neste mundo: caminho por entre trevas e luzes, crises e bonanças, momentos de profunda dor e de grande consolação. No caminho da Quaresma, como naquele outro, da vida, o Senhor nos educa, nos prova, nos consola, nos conforma à sua Cruz e nos prepara para participar da sua gloriosa Ressurreição.

    Na primeira leitura – Gn 15,5-12.17-18 – Deus celebra sua Aliança com Abraão, prometendo fazê-lo pai de um grande povo, povo mais numeroso que as estrelas do céu, e de ser seu fiel protetor. Aliança celebrada mediante um sacrifício de animais consumidos pelo fogo.

    Na segunda leitura – Fl 3,17-4,1 – São Paulo está na cadeia e seus adversários procuram confundir a comunidade de Filipos; por isso, Paulo procura salvar sua Comunidade recomendando que ela observe o seu comportamento e se afaste daqueles que adoram comer e praticar a imoralidade: “Nós somos cidadãos do céu e aguardamos a salvação de Jesus nosso Salvador!”.

    No Evangelho – Lc 9,28b-36 – Jesus mostra sua glória divina aos apóstolos e o Pai celeste recomenda sua imitação a fim de sermos nós também transfigurados, participando da glória de Jesus. É um caminho doloroso – passa pela cruz – mas por ele Cristo se forma em nós!

    No segundo domingo da Quaresma, o Evangelho é sempre o da Transfiguração de Jesus (Ano A – Mateus; Ano B – Marcos e Ano C – Lucas). Sempre a mesma história, mas contada de três maneiras bem diferentes. Em Lucas, a narração é bastante mais comprida. Jesus sobe a uma alta montanha e leva consigo Pedro, Tiago e João. Jesus sobe ao monte para rezar, para buscar a vontade do Pai. Já aqui temos uma bela lição quaresmal. Se o nosso Salvador rezou durante toda a sua vida, como nós poderíamos não rezar? Como poderíamos nos dar ao luxo de pensar poder ser verdadeiramente cristãos sem buscar sintonizar nosso coração com o coração de Cristo, que é imagem do coração do Pai? Rezando, Jesus é transfigurado na glória do Pai, que é o próprio Espírito Santo, representado pela nuvem luminosa. Também nós, caríssimos, perseverando na oração, traremos certamente em nós o reflexo da glória de Deus que resplandece na face de Cristo – e este é o objetivo da Quaresma: fazer-nos participantes da alegria pascal, plena da glória do Ressuscitado Entra em oração (São Lucas gosta de mostrar Jesus rezando), seu rosto muda de aspecto e sua veste se torna branca e esplendorosa. Aparecem ao seu lado, em glória, Moisés e Elias, conversando com Ele.

    Pensai agora naqueles que aparecem sobre o Tabor: Moisés, que representa a Lei, e Elias, que representa os profetas de Israel. Eis a mensagem clara: a Lei e os profetas dão testemunho da paixão do Senhor, que irá consumar-se em Jerusalém. A Cruz não é um absurdo, mas parte de um desígnio de Deus, desígnio de salvação e de vida, de modo que seria uma tristeza, uma miséria, um cristão desejar ser discípulo de Cristo Jesus fugindo da Cruz, comportando-se como inimigo da Cruz do Senhor! Será o próprio Senhor ressuscitado quem recordará aos discípulos de Emaús que era necessário que o Cristo sofresse para que entrasse na glória; será o próprio Senhor quem mostrará que tudo isto fora anunciado na Lei e nos profetas, representados hoje por Moisés e Elias (cf. Lc 24,26-27).

    Moisés é quem entende de “êxodo”. Jesus é o novo Moisés. Ele refaz a história do povo hebreu. Foi tentado no deserto, mas resistiu ao tentador (enquanto o povo hebreu no deserto se revoltou contra Deus). Agora ele vai levar a termo essa caminhada. Logo mais se dirigirá resolutamente a Jerusalém (Lc 9,51). Lá celebrará a nova Páscoa e a nova Aliança (22,15.20). Lá ele tornará livre, por sua palavra da verdade e pelo sacrifício de si mesmo, o novo povo de Deus.

    E há também Elias, Jesus é também o novo Elias: como este, Jesus viveu quarenta dias no deserto e fez milagres muito semelhante (o filho da viúva, Lc 7,11-17). Elias teve de fazer seu “êxodo” fugindo da rainha Jezebel por causa de sua fidelidade a Deus (1 Reis 19,1-3). Assim, como Elias foi arrebatado por Deus, Jesus subiu aos céus (Lc 9,51;24,51; cf. 2Rs 2,1; Eclo 48,1.9). E, como se espera Elias para inaugurar o tempo final e preparar o julgamento de Deus (Ml 3,23-24; Eclo 49,10), pode-se também dizer que Jesus é este Elias do tempo final. (Mateus e Marcos tendem antes a identificar João Batista com Elias).

    Lucas vai explicar que durante a teofania de Jesus com Moisés e Elias, Pedro e seus companheiros tinham dormindo. Por isso, não souberam nada do que foi dito. Quando despertaram, viram os dois personagens com Jesus transfigurado. Quando os dois começavam a se afastar, Pedro propôs construir três “tendas”, isto é, moradas de nômades, como a Tenda de Deus no êxodo, para que essa presença gloriosa pudesse continuar. Achou bom demais estarem assim! Mas a nuvem, símbolo da presença divina, tirou-os de como no tempo de Moisés, no deserto (Ex 19,16, etc). E, de fato, da nuvem sai uma voz declarando a respeito de Jesus: “Este é meu Filho o eleito: escutai-o”.

    De repente, terminou a visão. Encontravam-se sós. E não falaram disso, naqueles dias. Só depois. O que significa tudo isso? Significa que, durante a vida de Jesus, quando ele iniciou seu “êxodo” rumo a Jerusalém, eles perceberam nele algo de Deus, mas não o entenderam (dormiram). Nem o publicaram. Só depois da Páscoa, depois da ascensão de Jesus, é que vão compreender e proclamar.

    Eis a mensagem clara: como Abraão, que somente viu a glória de Deus no meio da noite depois da vigília e da provação, como Moisés e Elias, que somente viram o resplendor da glória do Senhor após o combate e a penitência, assim também nós, se quisermos de verdade ser inundados da glória pascal, devemos combater o combate quaresmal. O combate da Quaresma, este é o combate da vida: passar da imagem do homem velho, com seus velhos raciocínios e sentimentos, ao homem novo, imagem do Cristo glorioso.

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