Na carta, bispos denominam situação como catástrofe social
Os bispos do regional Leste 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que compreende o Rio de Janeiro, divulgaram carta sobre o momento atual do estado. “Manifestamos nossa angústia diante das inúmeras formas de sofrimento humano pelas quais a população do Estado vive atualmente. Como pastores, não podemos deixar de nos sentir afetados pelas lágrimas que brotam de tantas situações precárias que atingem, entre outras, as áreas da saúde, educação, alimentação, segurança, moradia, emprego, não recebimento de salários e aposentadorias”, manifestaram os bispos.
No texto, assinado pelo arcebispo do Rio de Janeiro (RJ) e presidente do regional Leste 1 da CNBB, cardeal Orani João Tempesta, os prelados exortam aqueles que “mais diretamente têm a responsabilidade de encontrar com rapidez soluções estruturais para a triste realidade” que atinge a população fluminense. Para isso, os bispos pedem que seja o empenho de pessoas e instituições seja “sempre marcado pela paz, pelo diálogo e pela colaboração mútua, em busca do bem comum”.
Diante da crise econômica no estado, que atinge, entre outras, as áreas da saúde, educação, alimentação, segurança, moradia e emprego, além de comprometer o recebimento de salários e aposentadorias, os bispos denominam a situação como “catástrofe social”.
Leia a carta na íntegra:
Queridos irmãos e irmãs do Estado do Rio de Janeiro,
A dor de qualquer ser humano clama a Deus e onera a consciência de quem se deseja humano.
Nós, bispos do Regional Leste 1, que abrange as dioceses do Estado do Rio de Janeiro, movidos pela Fé e pela Esperança, manifestamos nossa angústia diante das inúmeras formas de sofrimento humano pelas quais a população do Estado vive atualmente. Como pastores, não podemos deixar de nos sentir afetados pelas lágrimas que brotam de tantas situações precárias que atingem, entre outras, as áreas da saúde, educação, alimentação, segurança, moradia, emprego, não recebimento de salários e aposentadorias.
Neste sentido, não podemos deixar de exortar os que mais diretamente têm a responsabilidade de encontrar com rapidez soluções estruturais para a triste realidade que atinge nossa gente. Investidos no poder público em seus diversos âmbitos, têm diante de si, a responsabilidade moral e legal de buscar soluções, devendo fazê-lo através da união de forças, do diálogo e também da criatividade, dentro do espírito democrático e pacífico que marca nossa nação.
Em momentos de grandes dores, podemos nos fechar em embates teóricos ou ideológicos, correndo até mesmo o risco de nos envolvermos em posturas que ultrapassem os limites do bom senso, ingressando nas raias da violência. Por isso, clamamos para que o empenho de cada um, desde o nível pessoal até o institucional, seja sempre marcado pela paz, pelo diálogo e pela colaboração mútua, em busca do bem comum.
Reconhecemos, em tudo isso, uma situação que não podemos deixar de denominar como catástrofe social. O número de pessoas atingidas nos habilita a assim considerar o quadro que se apresenta diante de nós. Interpelados pelo Deus de Justiça, não podemos permanecer de braços cruzados e insensíveis à dor de qualquer ser humano. Temos consciência de muitas das causas da atual situação, clamamos por sua superação e consideramos urgente que se olhe para as conseqüências que ferem a dignidade dos filhos e filhas de Deus, atingidos de maneira ultrajante. Exortamos todos os católicos e as pessoas de boa vontade, que sonham com um mundo mais humano, a que assumam sua responsabilidade na busca e na concretização de soluções.
As primeiras soluções voltar-se-ão para o imediato, isto é, para as dores que não podem esperar o dia de amanhã, aguardando os trâmites dos planejamentos e das burocracias. O ponto de partida encontra-se em cada pessoa cujo coração não se endureceu de tão acostumado a ouvir clamores, a enxergar lágrimas. Por isso, na criatividade tão própria do povo brasileiro, cada um encontre formas de ajudar a quem está bem próximo, ao alcance da mão e do coração.
Este não é o momento de ficarmos apenas apontando responsabilidades alheias, mas de agirmos, pensando no bem comum. Por isso, ouvindo o clamor de nosso povo (cf Ex 3,7), conclamamos as comunidades católicas, paróquias, movimentos e demais associações para que abram suas portas e saiam, como uma igreja samaritana, uma igreja em campanha, uma igreja em missão, na busca de quem está sofrendo as mais diversas formas deste momento tão peculiar. Não se trata de aguardar quem venha bater à porta de nossas comunidades, mas, ao contrário, colocando tudo em comum (cf At 2,44), sair ao encontro de quem precisa, mobilizando os(as) batizados(as) a ações que, impulsionadas pela criatividade do Espírito Santo, sejam capazes de aliviar a dor e a penúria.
Contemplando o mistério do Deus-Amor, que se fez pão descido do céu, convocamos os católicos a participarem intensamente da Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, a ser celebrada este ano no dia 26 de maio. Em cada uma de nossas dioceses, haverá procissões e outros momentos em honra do Santíssimo Sacramento. Além das orações para pedirmos perdão pelos pecados e forças para a transformação do mundo, conclamamos os católicos a exercitarem, de modo ainda mais generoso, o sentimento de partilha, recolhendo em cada procissão ou outro evento, alimentos a serem imediatamente enviados a quem necessita. Todos nós vivenciamos preocupações quanto ao dia de amanhã e, com isso, corremos o risco de nos fecharmos em torno da proteção daqueles que amamos. No entanto, consideramos importante alertar para o fato de que, em Deus, amamos todos os seres humanos e o que acontece com um só ser humano, afeta a toda a humanidade.
Finalmente, diante do Deus de Misericórdia, colocamo-nos como servidores, partilhando a dor de cada coração que sofre, sonha e busca por soluções. Nós não temos todas as respostas, mas temos o desejo de colaborar para que as lágrimas sejam enxugadas, a alegria e a paz retornem aos corações, a justiça e integridade reinem cada vez mais em nossa terra.
Que Deus nos abençoe e acompanhe.
Rio de Janeiro, 1º de maio de 2016.
Orani João Cardeal Tempesta, O.Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro
Presidente do Regional Leste 1 – CNBB
Fonte: CNBB