Quem está no comando da Santa Sé enquanto o papa está internado

O papa Francisco deu entrada no Hospital Policlínico Gemelli para tratamento de bronquite em 14 de fevereiro. Quase duas semanas depois, médicos dizem que o papa, que contraiu pneumonia bilateral no hospital e teve uma “crise respiratória” no último sábado (22), e uma pequena insuficiência renal, se recupera de uma condição clínica complexa e crítica, segundo a Santa Sé.

Quem dirige a Santa Sé quando um papa está internado ou impossibilitado de desempenhar suas funções normais?

Matthew Bunson, vice-presidente e diretor editorial da EWTN News e autor de vários livros sobre o catolicismo, como Encyclopedia of Catholic History, disse à CNA, agência em inglês da EWTN News, que, embora o papa Francisco esteja no hospital há quase duas semanas, ele continua a supervisionar pelo menos um pouco os assuntos da Santa Sé.

O papa se encontrou com seus secretários no Hospital Gemelli no início desta semana. “Então ele claramente ainda está em contato com a Santa Sé e ainda está tomando decisões”, disse Bunson.

Nesses casos, “a máquina do Estado tende a continuar funcionando até o momento em que se entra num interregno”, como é chamado o período entre a morte ou a renúncia de um papa e a eleição de seu sucessor.

Andreas Widmer, professor associado de prática em empreendedorismo na Busch School of Business da Universidade Católica da América e ex-guarda suíço no Vaticano, também disse que grande parte da administração da Santa Sé continua mesmo quando o papa está doente.

“As coisas continuam acontecendo. Ele é mantido informado”, disse Widmer, que foi guarda suíço sob o papa são João Paulo II na década de 1980 e volta regularmente ao Vaticano para trabalhar com a guarda.

“Pelo que entendi, o papa ainda está lúcido e trabalhando”, disse Widmer sobre a atual internação de Francisco. “Talvez ele não cumpra suas jornadas de 12 horas, mas ele está trabalhando e se encontrando com as pessoas”.

Em alguns casos, os papas consideraram a possível necessidade de renunciar. Em 1965, o papa são Paulo VI escreveu uma carta ao reitor do Colégio dos Cardeais dizendo que, no caso de incapacidade, deveria ser considerado que ele havia renunciado formalmente ao cargo. O papa são Paulo VI viveu mais 13 anos e morreu no cargo.

Em 2022, o papa Francisco disse  que no primeiro ano de seu pontificado ele assinou sua renúncia e a entregou ao então Secretário de Estado da Santa Sé, cardeal Tarcisio Bertone, para ser invocada caso ele estivesse clinicamente incapacitado e incapaz de exercer suas funções.

“Não sei a quem Bertone deu, mas eu dei a ele quando ele era secretário de Estado”, disse o papa na época.

No entanto, em sua biografia publicada no ano passado, o papa disse que considera o ministério petrino como “algo para toda a vida” e não viu condições para renúncia, exceto em caso de deficiência física grave.

Widmer argumentou que os papas não são dados a deixar tais questões sem solução de uma forma ou de outra.

“Um papa não vai deixar isso ao acaso. Eles levam sua responsabilidade muito a sério”, disse Widmer.

Bunson citou o cenário semelhante recente em que a saúde de são João Paulo II declinou no final de seu pontificado.

Nesse período, disse o diretor editorial da EWTN News, ficou claro que os preparativos estavam sendo feitos para um possível interregno.

“É claro que ainda não estamos nessa posição, então a Cúria Romana continua a funcionar” normalmente, disse Bunson.

No caso da morte de um papa, disse Bunson, grande parte da administração imediata da Santa Sé recai sobre o camerlengo da Santa Igreja Romana — um dos poucos oficiais da Santa Sé que não perde imediatamente seu emprego depois da morte de um papa. Seus papéis incluem certificar a morte do papa e supervisionar as funções do interregno.

“É seu trabalho certificar a morte do papa reinante e garantir que os desejos do papa sejam respeitados”, disse Bunson.

Então os cardeais são convocados para Roma, e um novo papa é eleito.

Quem também mantém seu título no caso de morte de um papa é o chefe da Penitenciaria Apostólica, dicastério cuja principal função é o perdão dos pecados.

Esse funcionário “sempre mantém seu emprego”, disse Bunson, “porque sempre deve haver uma oportunidade para a misericórdia amorosa de Deus”.

Um segundo oficial-chave é o esmoleiro de Sua Santidade, o cardeal encarregado da caridade papal e do cuidado com os pobres. Foi o papa Francisco que decretou que o esmoleiro deveria manter seu posto, um reflexo da preocupação do papa com os esquecidos e mais vulneráveis.

Embora os fiéis possam estar curiosos sobre como a Santa Sé é administrada na internação de um papa, Widmer destacou um boato que ele disse ser “um completo absurdo”: a alegação de que os guardas suíços estão “ensaiando” para o funeral do papa.

Relatos de tais ensaios circularam na mídia internacional nos últimos dias, com a própria Guarda Suíça negando as alegações.

É “lixo completo”, disse Widmer sobre os rumores, argumentando que a Guarda Suíça já está preparada para tais ocorrências como parte normal de seu emprego.

“Ninguém precisa praticar nada”, disse Widmer. “É o que eles fazem na vida”.

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