Procuro um Homem…

     

    “Maldito o homem que confia no homem, que faz da carne a sua força”.  (Jeremias, 17,5)

     

    Conta-se que Diógenes de Sinope, (404 ou 412 a.C. – c. 323 a.C.) o célebre e cínico filósofo grego, passeava à luz do dia com uma lamparina acesa, dizendo: “Procuro um homem honesto”. Não tinha achado ninguém digno de levar esse título. Outro filósofo, da era moderna, o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, compartilhava da mesma opinião depois de viajar décadas de um continente ao outro e de consagrar toda uma vida ao estudo dos seres humanos.

    Aos 80 anos de idade, um jornalista fez o que chamou de radiografia da vida do                                                                       antropólogo para destacar os pontos fortes. Ao final da entrevista, o repórter perguntou: – O senhor conheceu tantas personalidades ilustres, de qual delas gostaria de ser amigo íntimo?- De nenhum!  Foi à resposta lacônica. – Isso é muito triste, reagiu o jornalista. O senhor não confia em nenhum homem? – Atualmente não creio que tenha grandes motivos para confiar no homem.

    A palavra de Deus sempre esteve de acordo com tal opinião. Por exemplo, a Epístola aos Romanos começa com um quadro desesperador da humanidade (pagãos, gregos, judeus, moralistas, filósofos, etc). Mas também nos revela Aquele que jamais nos decepciona: Jesus, o Salvador do mundo. Afirma o autor da Epístola: “Miserável homem que eu sou” (7, 24). Também ele declara: “Nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (8,1).

    Você conhece Jesus Cristo? Leia a Sagrada Escritura, participe da comunidade cristã e descubra por que Ele é o único em quem você pode confiar totalmente. Não há mentira, nem falsidade, nem parcialidade n’Ele. Talvez depois de tantas decepções seja difícil restaurar sua confiança nos homens, mas experimente confiar em Nosso Senhor Jesus Cristo, porque “ele é bom, porque a sua benignidade é para sempre” (Salmo 106,1).

     

    Confiança e Fortaleza

     

    “Sê, enfim, forte para que a prosperidade não te ensoberbeça ou a adversidade não te abata”. Santo Estevão da Hungria(1)

     

    No romance histórico chinês chamado Romance dos três reinos, o autor Luo Guanzhong descreve a “Estratégia da fortaleza vazia”, utilizando um argumento contrário ou psicologia reversa para enganar o inimigo. Quando 150 mil tropas do reino Wei alcançaram Xicheng, que tinha menos de 2.500 soldados, eles encontraram os portões da cidade abertos e o famoso estrategista militar Zhuge Liang tocando calmamente uma cítara com duas crianças ao seu lado. O general Wei, perplexo com a situação e crendo ser uma emboscada, ordenou retirada completa.

    A Sagrada Escritura oferece outro exemplo de uma desconcertante estratégia de batalha. No livro de Juízes capítulo 7, Deus fez Gideão usar 300 homens, toque de trombetas, cântaros e tochas em chamas contra os exercícios que “… cobriam o vale como gafanhotos em multidão; e eram os seus camelos em multidão inumerável…” (v.12). Israel poderia derrotar um inimigo tão formidável? Era humanamente impossível! Eles não tinham a mão de obra nem o equipamento militar. Mas eles tinham algo que funcionou para eles e era tudo o que precisavam. Tinham a promessa e a confiança de Deus: “… Com estes trezentos homens que lamberam a água eu vos livrarei…” (v.7). O resultado? Vitória!

    Você está enfrentando um enorme desafio? O Senhor Deus disse: “Eis que eu sou o Senhor, o Deus de todos os viventes; acaso, haveria coisa demasiadamente maravilhosa para mim”? (Jeremias 32,27.) “Haveria coisa alguma difícil ao Senhor” (Gn 18,14). “Para Deus nada é impossível” (Lc 1,37).

    De forma magistral e pastoral exorta o Papa Francisco: “Não pecamos jamais a confiança” (2).

    Há inúmeras razões para total desconfiança no ser humano. Há tantas incompatibilidades e catastróficas covardias na história da raça humana. No entanto, atos de heroísmos e bondade monumental fazem acreditar que a confiança faz parte da fortaleza da dignidade da pessoa humana. É inteligente ser otimista e ter fé no impossível. Confiar sempre com honestidade é a meta evangélica!

     

    Pe. Inácio José do Vale

    Professor e Conferencista

    Sociólogo em Ciência da Religião

    Fraternidade Sacerdotal Jesus  Cáritas

    E-mail: pe.inacio.jose@gmail.com

     

    Notas:

     

    (1) Soares, Hélio. O que dizem os santos: 3000 pensamentos em mais de 200 atributos. Uberlândia, MG: Editora A Partilha, 2010, p. 133.

    (2) Trecho da Homilia do Papa Francisco na Festa de Divina Misericórdia em 07/04/2013.

     

    Fontes:

     

    Passagens Bíblicas e Reflexões. Boa Semente Devocional de 2009.

    Pão Diário, janeiro a Março de 2014.

     

     

    O HOMEM

     

    “A vida do homem consiste no afeto que principalmente o sustenta e no qual encontra sua maior satisfação”.

    Santo Tomás de Aquino

    Doutor da Igreja (1)

     

    O homem é um ser mortal, sujeito ao corpo, limitado no espaço e no tempo, submetido ás leis físicas, escravo de suas paixões, movido por suas emoções. Também é um espírito curioso, desejoso de compreender o propósito de sua existência, o que não se pode ver, o futuro, Deus, etc.

    O homem foi feito á imagem e semelhança de Deus (Gn 1, 26). Mas por causa de sua natureza independente foi expulso do Éden e separado do Criador. Embora não esteja consciente disso, sofre por tal ruptura e sente o vazio que ela produz. Mas Deus quis resolver essa questão e abolir a distância que O separava de Sua criatura, porque cada ser humano é único e insubstituível a Seus olhos. Ele amou tanto o homem que enviou seu filho para busca-lo e salvá-lo. São João Apóstolo em seu Santo Evangelho (3,16) atesta esse amor de forma abissal e para o ser humano receber e viver esse amor para o bem aqui e eterno. “Quanto mais o homem fizer o bem, mais livre se torna”, disse o teólogo brasileiro Padre Francisco Sehnem, SCJ (*).

    Que verdade extraordinária: Deus se preocupa com nossa felicidade terrena e eterna! “porque eu bem sei os pensamentos que tenho a vosso respeito, diz o Senhor: pensamentos de paz, e não de mal, para vos dar o fim que esperais” (Jr 29,11). É esse amor que é tudo para nossa vida. Por ele temos a certeza das moradas celestiais!

     

    BLAISE PASCAL

     

    “Nada caracteriza melhor o homem do que o fato de pensar”.

     

    Aristóteles (384 – 322 a.C.)

    Filosofo Grego

     

    Blaise Pascal (1623–1662), físico e matemático francês, é conhecido não somente por seus méritos científicos, mas também por seus “pensamentos sobre religião e alguns outros temas” que sempre voltam a ser reimpressos. Pascal dá muitas indicações sobre a veracidade da Bíblia Sagrada, porém mostra também que a razão e a ciência humanas são limitadas.

    Segundo Pascal, o conhecimento de Deus não se obtém mediante o exercício do raciocínio, mas só através da fé na revelação de Deus por meio de seu Filho. Afirmou que sem as Sagradas Escrituras e sem Cristo só podemos ver escuridão e confusão na natureza de Deus e na nossa. Por meio de Jesus Cristo não apenas conhecemos a Deus, mas também a nós mesmos. “Sem Jesus Cristo não sabemos o que é nossa vida nem nossa morte, nem o que Deus e nós mesmos somos.”

    Aqui Pascal expõe acertadamente que Jesus Cristo é a verdade. Em Sua Pessoa, em Sua vida na terra e em sua morte na cruz o amor incompreensível, insondável e inexplicável de Deus para conosco.

    E com propriedade que Pascal declara acerca de seu Senhor e Salvador: “Quem O conhece, conhece a razão de todas as coisas”.

    “O Homem é uma vara pensante”, essa célebre definição de Blaise Pascal expressa ao mesmo tempo à fragilidade do ser humano e o que o faz forte. De fato, a sociedade humana é fruto da multidão de pensamentos que se opõem, superpõem se complementam e se encarnam em múltiplas realizações técnicas, sociais, políticas, econômicas e religiosas.

    Nossos pensamentos podem ser bons, verdadeiros, compassivos e justos, mas também falsos, perversos e cruéis. A Bíblia Sagrada afirma que “viu o Senhor que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente” (Gn 6,5).

    A Boa Notícia, ou seja, a Boa Nova é que Deus quer transformar nossa mente por completo. Isso é o arrependimento, transformação via a Sua maravilhosa graça.

    Os pensamentos definem todo o curso de nossa vida, por isso o Senhor Deus vai mais além. Ele nos dá o “capacete da salvação”, ou seja, “a mente de Cristo” (1 Cor 2,16), a forma como Cristo pensa. É um processo pelo qual todo filho e filha de Deus passam durante a vida, necessário para conhecerem a boa, agradável e perfeita vontade de Deus. (2)

    Escreve São Paulo Apóstolo: “Ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, honroso, virtuosos ou que de qualquer modo mereça louvor”, nisso pensai (Fl 4,8). Diz de forma magistral Santa Teresa de Ávila: “Os nossos pensamentos sejam grandes, porque deles nascem o nosso bem… é preciso não diminuir os nossos desejos, mas confiar em Deus” (3).

     

    CONCLUSÃO

     

    A categoria singular do ser humano está radicada no fato de estar dotado de inteligência e de vontade, com liberdade para tomar decisões. Por ter sido criado á imagem de Deus, não é tão somente alguma coisa, mas, sim, alguém. Distingue-se dos demais seres por sua razão ou inteligência, reflexo da inteligência de Deus. O homem é um ser livre. Pode escolher fazer o bem ou o mal, cumprir ou não as leis do Senhor. Deus lhe concedeu a faculdade de escolher livremente.

    Não há duvida de que a liberdade é um dos mais belos dons que Deus concedeu ao homem. Esse glorioso dom flui no pensar e no praticar o bem. A nossa liberdade está conectada na graça para efetuar as maravilhas de Deus em prol da humanidade.

    Afirma de forma magistral Pascal: “O último esforço da razão é reconhecer que existe uma infinidade de coisas que a ultrapassam”. “O coração tem razões que a razão ignora”.

     

    Pe. Inácio José do Vale

    Professor de Historia da Igreja

    Instituto de Teologia Bento XVI

    Sociólogo em Ciência da Religião

    Doutor em História do Cristianismo

    E-mail: pe.inacio.jose@gmail.com

     

    Notas:

     

    (1) Summa Theologiae  IIa, IIae, q. 179, art.1.

    (2) Passagens Bíblicas e Reflexes. Boa Semente Devocional de 2014.

    (3) Soares, Hélio. O que dizem os santos: 3000 pensamentos em mais de 200 atributos. Uberlândia; MG: Editora A partilha, 2010, p.241.

    (*) Brasil Cristão, maio de 2014, p.5.