Rui Saraiva – Portugal
A XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos bispos que está a decorrer em Roma, encontra-se nos últimos dias da sua segunda sessão. São aguardadas com expectativa as conclusões deste grande processo de encontro e diálogo que movimentou milhões de pessoas desde outubro de 2021 sobre o tema “Por uma Igreja sinodal: participação, comunhão e missão”.
Terceira fase do Sínodo será a receção nas dioceses
Sobre o tempo que se segue, falou o padre Dario Vitali, coordenador dos peritos em Teologia nesta Assembleia. Em conferência de imprensa destacou aquela que será a terceira fase do processo sinodal com a receção do documento final nas dioceses.
O sacerdote italiano assinalou a existência de uma terceira fase neste processo sinodal, que é a da aplicação do Sínodo nas igrejas locais após a publicação do documento final. Salientou que a primeira foi a consulta nas dioceses, com as suas tonalidades nacionais e continentais e a segunda fase as duas sessões da Assembleia em Roma.
“Há uma terceira fase do Sínodo: a primeira foi nas Igrejas particulares, com a consulta do Povo de Deus e a escuta, o discernimento das Conferências Episcopais e das assembleias continentais; a segunda é a da assembleia nas duas sessões; a terceira fase é o regresso às Igrejas particulares e às Conferências Episcopais”, especificou o padre Dario Vitali
Recordemos que na constituição apostólica “Episcopalis communio” sobre o Sínodo dos Bispos, publicada em 2018, o Papa Francisco sublinha que “à celebração da Assembleia do Sínodo, deve seguir-se a fase da sua aplicação, com a finalidade de iniciar em todas as Igrejas particulares a receção das conclusões sinodais”.
Assim, para promover a receção das conclusões do Sínodo nas dioceses é necessário procurar respostas para dinamizar o processo. E este é o grande desafio que se coloca no final da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos.
Para aprofundar a reflexão sobre este tema fomos ouvir duas personalidades católicas com reconhecida intervenção eclesial e especialmente envolvidas e animadas pela dinâmica sinodal. São eles Joaquim Franco, jornalista e investigador em Ciência das Religiões e João Paiva, professor na Faculdade de Ciências do Porto.
Alargar espaço e diálogo em sinodalidade civil
Joaquim Franco sublinha que a dinâmica proposta pelo Papa Francisco é desafiante e “vai muito para lá do contexto eclesial”. O investigador propõe uma nova forma de discernimento feita em diálogo com o mundo, propondo o conceito de sinodalidade civil.
“A dinâmica proposta pelo Papa para este Sínodo, é de uma tão ambiciosa e desafiante ousadia que vai muito para lá do contexto eclesial. A ideia de um povo que caminha nas diferenças, sem perder um foco comum, reveste-se hoje de uma grande lucidez. É assim na Igreja Católica, a precisar de sintonizar com o mundo, de encontrar mecanismos eficazes de corresponsabilidade, de horizontalizar a missão, de trazer ao modo de ser e de agir a coerência do Evangelho. E é assim também no mundo. Se os agentes pastorais não entenderem a obra grandiosa que pode ser este Sínodo, como podem entender o contributo social, político e relacional da ética cristã? A dinâmica que este Sínodo imprime deve ser exemplar em todas as estruturas da Igreja; dioceses, paróquias e movimentos. Criando espaços que soltam a pausa do Espírito, espaços para a calma das palavras construtivas, mas também, repito e ouso dizê-lo, em todas as estruturas não religiosas, sociais, comunitárias ou até políticas, chamando todos e todas ao princípio da corresponsabilidade na diferença, à escuta que leva ao encontro. A escuta e o diálogo com o propósito do bem comum é também um desígnio, permitam-me a expressão, de uma sinodalidade civil, uma nova forma de desencadear o discernimento”, declara.
Evangelho no meio do mundo sem surdez à cultura
Por sua vez, João Paiva, sublinha que o dinamismo sinodal do Papa é mais do que uma metodologia, é mesmo um caminho para meter o Evangelho “no meio do mundo sem surdez em relação àquilo que a cultura grita”.
“Este dinamismo sinodal impresso pelo Papa Francisco tem um tom de ontologia estrutural, é mais do que uma metodologia, é mesmo um caminho que galvaniza um passado, porventura latente na Igreja e nos próprios Evangelhos e é sinalizado, particularmente, no Concílio Vaticano II, mas onde o tempo da Igreja e a sua inércia não ajudaram a implementar. E talvez possa mesmo ser o principal tesouro concentrado deste papado. Tenho por isso grande esperança neste desiderato tão complexo, quanto interessante, do ponto de vista de Igreja, de seguirmos todos juntos, mas ao mesmo tempo, encarando a verdade e um Evangelho inculturado e metido no meio do mundo sem surdez em relação àquilo que a cultura grita. Vejo com bons olhos todos estes caminhos e estas ambições, mas reconheço também que pode perder-se uma oportunidade se as resistências, principalmente, dos extremos forem excessivas. E, principalmente, se vencer a inércia não atuante, se ficarmos só em conversa e não formos capazes de eleger alguma coisa e começar a experimentar numa Igreja polifórmica ensaios novos, para um mundo novo e para um Evangelho que é sempre novo”, afirma.
Dar respiração ao dinamismo sinodal
João Paiva e Joaquim Franco têm participado com as suas reflexões, intervenções e entusiasmo na Rede Sinodal em Portugal, um site criado no início de 2024 que nasceu do dinamismo e trabalho coletivo de um grupo de leigos, leigas, sacerdotes e religiosas que partilharam as suas reflexões no livro “Não temos medo – Reflexões sobre a Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 e o caminho sinodal”.
Foi assim que tomando inspiração neste livro surgiu a Rede Sinodal em Portugal. Um site que tem como missão abrir um espaço de informação sobre o Sínodo, apresentando num mesmo lugar o entusiasmo de quem está em movimento fazendo caminho juntos, na pluralidade e diversidade, promovendo o método sinodal em diálogo com o mundo. O site foi anunciado a todos os bispos e dioceses de Portugal e respetivas comissões sinodais, colocando-se ao seu serviço.
A Rede Sinodal em Portugal revela a sua disponibilidade para, em ambiente de trabalho coletivo, ser parte de um projeto que permita dar respiração ao dinamismo sinodal. Com propostas como estas:
– acompanhar as atividades e iniciativas sinodais nas dioceses, paróquias e movimentos;
– valorizar os trabalhos de sinodalidade nos vários âmbitos pastorais;
– criar sinergias e colaborações estimulando as comunidades com momentos de formação e relação.
A XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos terá o seu encerramento a 27 de outubro e conheceremos as suas conclusões. Mas, para já, ficam algumas inquietações:
Será que a dinâmica do processo sinodal desenvolvida nestes 3 anos vai ser utilizada na animação das comunidades locais?
Vamos ter de facto mais participação, comunhão e missão num real e concreto caminho em conjunto?
O sopro do Espírito Santo que passou por este Sínodo vai mesmo chegar às igrejas locais?
Laudetur Iesus Christus