Não só milagrosa, mas também impetuosa. Milagrosa pela intervenção do Senhor Ressuscitado, “de pé na margem”, enquanto um cansado e desiludido grupo de pescadores depunha suas redes depois de uma noite inteira sem nada pescar. A simples sugestão de se lançar a rede mais à direita da barca e o milagre imediato provoca o reconhecimento do mestre. “É o Senhor!” Então Pedro se veste rapidamente e se joga ao mar em direção ao mestre. Aqui a pesca se torna impetuosa, seguindo as ações do velho Simão. Senão, vejamos…
Para Cristo, a naturalidade do milagre – já previsto por Ele ao se aproximar daquele grupo de pescadores frustrados – estava não no fato de fazer surgir tão grande número de peixes em frágeis redes que não se romperam (153 é o número exato), mas nas ações que se seguiram. “Logo que pisaram na terra viram brasas acesas…” (Jo 21,9). Não era uma simples casualidade, mas uma referência bem clara ao desejo de Cristo em seu ministério: “Vim trazer fogo e como gostaria que este já estivesse aceso”. Simbolicamente, Jesus realizava ali o rito da consagração ministerial, fazendo brotar no coração daqueles discípulos o fogo do amor à tarefa que estendia a eles. Não mais simples pescadores de peixes, mas de almas!
Então Pedro, o impetuoso de sempre, vai ao barco e arrasta a rede para a praia, trazendo os peixes para mais próximo das brasas. É hora de se alimentar, se banquetear com Jesus. Este se aproximou, tomou o pão, partiu-o e serviu a todos. O mesmo fez com o peixe, símbolo de si próprio através dos séculos e símbolo do próprio cristianismo em seu início, que salvou muitos dos cristãos perseguidos. Para se identificarem entre si, usavam de um risco em meia lua numa superfície qualquer. Se alguém o completasse em sentido côncavo ter-se-ia a imagem de um peixe e assim se davam a conhecer secretamente. Porém, o episódio mais significativo dessa pesca vem a seguir.
“Depois de comerem”, depois de estarem bem alimentados e saciados da presença miraculosa de Cristo, este surpreende a Pedro com três incisivas perguntas: “Simão, Filho de João, tu me amas?”. Três vezes, por que? Porque, da tríplice negação de Pedro durante o processo de condenação de seu mestre, Jesus agora quer ouvir uma tríplice declaração de amor. A resposta foi sempre a mesma: “Apascenta as minhas ovelhas”. O primado de Pedro nasce aqui, aos pés do ressuscitado, purificado pelo arrependimento de um líder humano e frágil, mas que recebia agora o oficio do pastoreio, o ministério da continuidade de uma missão renovada à luz da ressurreição. “Ainda que todos te abandonem, eu nunca te abandonarei”, havia dito o velho Pedro pouco antes da condenação de seu mestre. Agora, purificado de suas fraquezas, confessa: “Senhor tu sabes tudo, tu sabes que eu te amo”. Mesmo ciente de suas fraquezas, Pedro conhecia a força do Amor que tinha dentro de si. A ponte entre a fraqueza humana e o amor incondicional revestido pela misericórdia divina, é a força do pontificado da Igreja, aqui representado pela liderança de Pedro, o pescador impetuoso, o pescador dos sete mares.
O milagre dessa pesca não é seu resultado assombroso, numérico apenas. Quem ainda mede o sucesso da vida eclesial pelo número de seguidores na Igreja, nada entendeu até aqui. Jesus continua a nos dizer: “Vinde comer”. Vinde se alimentar aos pés daquele que não só oferece os peixes, mas também indica as águas mais profundas, sugere novas tentativas, dá funções, coordena ações, para que sua Igreja, sob o primado dos sucessores daquele pescador turrão, impetuoso, continue glorificando a Deus. “Segue-me” foi a última ordem de Cristo a Pedro. E a seus sucessores também!