Não desanimar perante a crise, mas libertar energias para repensar a economia e o mundo do trabalho. É o desafio do Papa Francisco na mensagem vídeo enviada aos participantes no Festival da Doutrina Social, que iniciou na quinta-feira à noite em Verona, sob “Para além dos lugares dentro do tempo”. O Papa sublinhou que o verdadeiro problema não é o dinheiro, mas as pessoas, e dirigiu um pensamento particular aos muitos jovens que vivem o drama do desemprego.
Responder às necessidades reais superando a tentação de acreditar que não se pode fazer nada para ultrapassar a crise. Dirigindo-se aos participantes no Festival da Doutrina Social, o Papa Francisco tem palavras de encorajamento para aqueles todos os dias na família, no trabalho, nas empresas procuram enfrentar uma situação que, reconhece, “pode assustar-nos” e “desorientar”. “A grande tentação – advertiu – é parar para curar as próprias feridas e encontrar nisto uma desculpa para não ouvir o grito dos pobres e o sofrimento daqueles que perderam a dignidade de levar para casa o pão, porque perderam o emprego”:
“E aqueles que apenas procuram curar as suas próprias feridas, acabam por se alterar. Esta é a armadilha. O risco é que a indiferença nos torne cegos, surdos e mudos, presentes apenas para nós mesmos, diante do espelho, de modo que tudo acontece na nossa estranheza. Homens e mulheres fechados em si mesmos. Houve alguém que foi assim e se chamava Narciso … Essa estrada, não”.
Nós, acrescentou, “somos chamados a ir além e responder às necessidades reais. É urgente abandonar os estereótipos, que são considerados seguros e garantidos” para em contrapartida libertar as energias:
“A ética cristã não é uma alfândega para a pluralidade de expressões com as quais se manifesta o bom e o cuidado ao próximo. Ir além significa alargar e não restringir, criar espaços e não limitar-se a controlá-los”.
“Ir além – advertiu o Papa – significa libertar o bem e gozar os seus frutos”. Mas, esclareceu, “para ir além é preciso tomar a iniciativa”. A este propósito, o Papa Francisco reconheceu que no Festival “é dedicado um grande espaço à economia, aos empresários, às empresas e à cooperação”:
“Hoje, mesmo no sector económico é urgente tomar a iniciativa, porque o sistema tende a homologar tudo e o dinheiro é o rei. O sistema leva-te a esta globalização não boa, que homologa tudo. E o patrão desta homologação é quem? É o dinheiro. Tomar a iniciativa nestes sectores significa ter a coragem de não se deixar prender pelo dinheiro e pelos resultados a curto prazo tornando-se escravo dos mesmos”.
Do Papa também a exortação a ver as coisas de um “modo novo”. Hoje, observou ele com amargura, “diz-se que muitas coisas não se podem fazer porque falta dinheiro. No entanto, há sempre dinheiro para fazer algumas coisas mas para fazer outras não há”. Por exemplo, disse, “o dinheiro para comprar armas encontra-se, para fazer as guerras, para transações financeiras sem escrúpulos, encontra-se “:
“Disto geralmente se fica calado; se ressalta muito o dinheiro que falta para criar empregos, investir em conhecimentos, talentos, para projetar um novo bem-estar, para salvaguardar o meio ambiente. O verdadeiro problema não é o dinheiro, mas as pessoas: não podemos pedir ao dinheiro aquilo que só as pessoas podem fazer ou criar. O dinheiro por si só não cria o desenvolvimento, precisamos de pessoas com a coragem de tomar a iniciativa”.
Tomar a iniciativa, salientou o Papa, “significa desenvolver uma empresa capaz de inovação não apenas tecnológica”:
“Precisamos renovar também as relações de trabalho experimentando novas formas de participação e responsabilidade dos trabalhadores, inventando novas maneiras de ingresso no mundo do trabalho, criando uma relação de solidariedade entre as empresas e o território. Tomar a iniciativa significa superar o assistencialismo”.
Viver intensamente este tempo, acrescentou o Papa, “leva a apostar num futuro diferente e numa forma diferente de resolver os problemas”. O Papa contou, assim, a história do pai de um menino down que para dar dignidade ao seu filho “inventou uma cooperativa formada por rapazes down”, e assim “criou as premissas de trabalho com as quais o seu filho pode construir o seu futuro e a sua autonomia saudável”. Isto, disse o Papa, significa “ir além”, parar “significa, pelo contrário, pedir ainda e mais ao Estado ou a qualquer ente de assistência”. Os novos processos, reiterou, “não são o resultado de intervenções técnicas, são os resultados de um amor que, solicitado pelas situações, não é feliz até que ele invente alguma coisa que se torne resposta”. Por isso, é preciso “considerar o amor como a verdadeira força para a mudança”. E “se nós estamos dentro do tempo com este ‘a mais’, o ‘a mais’ do amor – acrescentou o Papa – daremos certamente andamento a algo novo que vai incentivar o crescimento do bem”. Daí a necessidade de “promover e desenvolver os talentos”, abrindo espaços. “Libertar os talentos é o início da mudança”:
“Evidentemente falando de talento entende-se que o discurso diz respeito, em especial, aos jovens. Se queremos ir mais longe, devemos investir muito neles e dar-lhes muita confiança. Mas eu me pergunto: qual é a percentagem de jovens, hoje, desempregados e sem trabalho? Isto significa ir além, ou voltar atrás? Para mudar é preciso avançar juntos e na mesma direção”.
“O tempo, disse ainda o Papa, é graça e plenitude. Ir para além dos lugares não é o resultado da casualidade individual, mas da partilha de um fim: a história é um caminho rumo à realização”. “Se nos movermos como um povo, se avançarmos juntos – disse – a nossa existência porá em evidência este significado e esta plenitude”. O Papa concluiu a sua mensagem vídeo agradecendo o bispo de Verona Dom Giuseppe Zenti que hospeda o Festival e o seu promotor Dom Adriano Vincenzi, presidente da Fundação Toniolo.
Fonte: Rádio Vaticano